Entre os mais influentes da web em Goiás pelo 12º ano seguido. Confira nossos prêmios.

Envie sua sugestão de pauta, foto e vídeo
62 9.9850 - 6351

Sobre o Colunista

Joias do Centro .
Joias do Centro .

/ atendimento@aredacao.com.br

Joias do Centro

Grande Hotel guarda curiosidades e memórias da construção de Goiânia

Prédio foi o terceiro construído na cidade | 17.05.24 - 12:22
Grande Hotel guarda curiosidades e memórias da construção de Goiânia Foto: Rodrigo Obeid/A Redação
Carolina Pessoni
 
Goiânia - Uma construção de três pavimentos e cor rosada no cruzamento da Avenida Goiás com a Rua 3 é parte da paisagem do Centro de Goiânia. Mais que isso, é um elemento fundamental na história da cidade e de sua construção, visto que o imóvel já tem quase 90 anos.
 
Talvez pela correria do dia a dia muitas pessoas não se atentem para a beleza arquitetônica do edifício, que guarda memórias importantes da Capital. O Grande Hotel que o goianiense já se acostumou a ver foi, em outros tempos, grande não só no nome, mas também em seu significado e função.
 
O historiador Ubirajara Galli afirma que antes mesmo do lançamento da pedra fundamental de Goiânia, ocorrido em 24 de outubro de 1933, Pedro Ludovico Teixeira determinou que entre os prédios de maior urgência a serem construídos estariam o Palácio do Governo, a prefeitura e um hotel. Junto a oito edifícios e as 20 casas para funcionários, se encontrava o Grande Hotel com 60 quartos, conforme o Decreto nº 3.547, de 6 de julho de 1933.
 

Grande Hotel foi previsto entre os primeiros prédios de Goiânia, segundo pedido do próprio Pedro Ludovico (Foto: Reprodução/Foto Berto)
 
O objetivo do prédio era hospedar políticos, empresários, engenheiros e outros visitantes que chegavam à nova capital. A obra era, portanto, estratégica para o desenvolvimento da cidade, facilitando o ingresso de elementos para o estado com a disponibilização de boas instalações para quem tinha negócios a tratar com o governo.
 
Não à toa, o Grande Hotel foi localizado em uma posição planejada e com fácil acesso à Praça Cívica, aos outros edifícios e à saída da cidade, já que, no final da avenida, estava localizada a Estação Ferroviária. Havia também a projeção de crescimento do comércio e serviços na região, com os principais eixos nas imediações - avenidas Tocantins, Araguaia e Anhanguera.
 
O projeto original do hotel foi concebido pelo arquiteto Attilio Correa Lima, responsável por projetar o traçado e os principais prédios da nova capital. A inspiração veio do art déco, em oposição ao estilo colonial da antiga capital, a cidade de Goiás.
 
A conselheira do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás Renata Barros afirma que a escolha de Attilio foi para que Goiânia tivesse o ideal de modernidade, desejo de Pedro Ludovico. "O art déco estava em voga, transmitia modernidade e ruptura com o estilo colonial, que não era muito pensado. Tem os traços de simetria, racionalidade, linhas retas e, principalmente, pelos materiais construtivos, como uso de tijolo, concreto e vidro, materiais novos para a época. Muitas vezes a gente acredita que a grande importância desse estilo é só pelo desenho, mas os materiais também devem ser considerados", explica.
 

Grande Hotel foi concebido no estilo arquitetônico art déco, que estava em voga na época (Foto: Reprodução)
 
O edifício do Grande Hotel, concebido em art déco, destaca-se pela presença de elementos arquitetônicos típicos do estilo, como platibanda emoldurada, simetria e a composição de cheios e vazios.  "Sua monumentalidade e imponência são expressas pela horizontalidade e volumetria. As janelas são de madeira, com quatro panos de vidro retangulares. A ênfase está na fachada principal voltada para a Avenida Goiás, com acesso centralizado, marcado por um volume puro cilíndrico em destaque", destaca a arquiteta.
 
O projeto de Attilio previa também o uso de técnicas construtivas inovadoras, como laje plana impermeabilizada e estrutura mista de concreto armado e alvenaria. As escadas foram de concreto armado. Já telhado, de estrutura de madeira e telhas tipo marselha. 
O arquiteto, entretanto, acompanhou a obra apenas de setembro de 1933 a abril de 1935, quando rescindiu o contrato com o Estado. A empresa Coimbra Bueno assumiu a direção das obras de construção da nova capital, o que incluía o Grande Hotel, e alterações no projeto original foram executadas.
 

Projeto original do Grande Hotel, concebido por Attilio Correa Lima (Foto: Reprodução/Anamaria Diniz)
 
Luxuoso, o hotel era dividido em três pavimentos com 60 apartamentos, sendo 4 de luxo, com água encanada em todos eles, salão de refeições, cozinha, banheiros, garagens, além de outras dependências administrativas. Não havia suítes com banheiros privativos, o que seria um luxo para a época. A escada possuía um posicionamento centralizado em relação ao hall e existia um local para elevador.
 
Inauguração, ascensão e queda
No primeiro semestre de 1936 foram publicados dois editais de concorrência pública para que o hotel fosse arrendado. Apesar de ser a melhor hospedagem da nova capital e, por isso, um ótimo negócio, os valores a serem investidos eram muito altos e não houve interessados.
 
Ubirajara Galli explica que para solucionar o impasse e fazer funcionar o estabelecimento, o governo de Goiás decidiu administrar o hotel. "Foi publicado um decreto no dia 20 de julho de 1936, designando os funcionários públicos estaduais João da Veiga Jardim, Escolástica A. de Camargo e Raul Couto para os cargos de administrador, caixa e guarda-livros do local."
 

Anúncio do Grande Hotel, veiculado em jornais da época (Foto: Reprodução)
 
No dia 15 de agosto do mesmo ano, o Grande Hotel recebe seus primeiros hóspedes, uma comissão de deputados que vieram inspecionar o andamento das obras de Goiânia antes que fosse feita a transferência definitiva da Capital. A comissão era constituída pelos deputados Agenor Alves de Castro, João d'Abreu, João Jacintho de Almeida, Manuel Balbino de Carvalho e Victor Coelho de Almeida.
 
No dia seguinte, um coquetel de inauguração durante a tarde inaugurou o bar do hotel. O evento foi oferecido pelo engenheiro Abelardo Coimbra Bueno, superintendente das obras de Goiânia, com o objetivo de impressionar os hóspedes.
 
Com a aquisição em São Paulo de tudo o que o Grande Hotel precisava para funcionar foram publicados outros editais para o arrendamento. Maria Nazaré Jubé Jardim, esposa do então gerente, João da Veiga Jardim, apresentou uma proposta que foi aceita pelo governo. Já "dona" do Grande Hotel, Maria Nazaré passou a residir no local, preparando-o para iniciar oficialmente a hospedagem.
 
 

Coquetel de inauguração do bar do Grande Hotel, oferecido por Abelardo Coimbra Bueno (Foto: Reprodução)
 
O contrato de arrendamento foi assinado em 17 de fevereiro de 1937. Duas curiosidades chamam a atenção: essa data é posterior à realização do primeiro réveillon do Grande Hotel, em 1936, e a inauguração oficial se deu no dia 23 de janeiro de 1937. "Isso nos leva a crer na existência de um documento intermediário entre a proposta e o contrato ou também na possibilidade de que um acordo verbal era lei naquele tempo", explica Galli.
 
A inauguração oficial foi um grande acontecimento social e político. Num breve discurso, Pedro Ludovico declarou que estava inaugurado o Grande Hotel. Entre os convidados, deputados, secretários de governo, intelectuais, autoridades judiciárias e religiosas, além de vários prefeitos, entre eles o primeiro prefeito de Goiânia, Venerando de Freitas Borges.
 
 
Além de hospedar engenheiros, arquitetos e políticos na construção da cidade, o Grande Hotel recebeu ilustres personalidades como o antropólogo francês Claude Levi-Strauss, o poeta chileno Pablo Neruda e o escritor Monteiro Lobato. O presidente da República na época da fundação de Goiânia, Getúlio Vargas, também visitou a cidade e se hospedou no Grande Hotel.
 
Mais que um local de hospedagem de famosos, o hotel era ponto de encontro da elite goianiense em formação. A própria arrendatária do local, Maria de Nazaré, tocava piano - o primeiro que chegou a Goiânia - todas as noites para animar as reuniões da sociedade que eram realizadas nos salões do edifício.
 

Maria de Nazaré tocava piano todas as noites; o instrumento, que foi o primeiro do tipo em Goiânia, permanece no edifício até hoje (Foto: Rodrigo Obeid/A Redação)
 
O “Palácio Monumental”, como também era conhecido o Grande Hotel, foi palco dos primeiros bailes de carnaval da capital, onde se apresentavam a banda da 1ª Cia. da Polícia Militar, o Jazz Band Imperial e outros grupos. O seu restaurante era um dos lugares preferidos da alta sociedade.
 
Mesmo durante o seu auge, o Grande Hotel começou a sofrer com problemas. Apenas um ano e meio após a inauguração oficial, o governo publicou um despacho intimando a arrendatária, Maria Nazaré, a efetuar os pagamentos atrasados com o Estado e a Previdência num prazo de 30 dias para não perder a concessão. Como não houve pagamento, a concessão foi cassada.
 
Em 1949 a dívida era ainda maior e o próprio governo já não tinha interesse em quitá-la. "Para solucionar o problema, a administração pública optou pela saída mais óbvia, e entregou o prédio para a Previdência", conta o historiador Ubirajara Galli. 
 

Calçada do Grande Hotel era ponto de encontro e local de realização de grandes negócios (Foto: Reprodução)
 
Começava, então, o processo de decadência do Grande Hotel, um dos símbolos da nova Capital. A proprietária federal passou, então, a celebrar contratos com particulares que ainda mantinham o imóvel funcionando como hotel até a metade da década de 1970, e posteriormente foi alugado para lojistas.
 
No início dos anos 1980, a Previdência venceu, na Justiça Federal, uma ação de despejo com o último locador, requerendo o imóvel para seu uso. O edifício passou a ser ocupado, então, pelo Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (Iapas), atual Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que, desprezando o valor histórico, artístico e cultural, tentou por duas vezes demolir o edifício.
 
Com a defesa de intelectuais e outras personalidades, o prédio foi finalmente tombado, em 1991, como um dos 20 bens que formam o patrimônio do estilo arquitetônico art déco em Goiânia. E em 2003, veio o reconhecimento também do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que declarou o tombamento do conjunto urbano de Goiânia, um total de 22 edifícios e monumentos públicos, concentrados, em sua maioria, no Centro da cidade, entre eles, o edifício do Grande Hotel.
 
Reformas e novos usos
Com o passar dos anos, o Grande Hotel foi sendo descaracterizado por meio de reformas, sendo talvez a mais significativa promovida pelo ex-ministro da Previdência Jader Barbalho, em 1986. Do prédio original, restam poucos elementos, como a fachada e os pisos de tacos de madeira e ladrilhados.
 
Em 2004, o Grande Hotel sediou a 8ª edição da CasaCor Goiás, num convênio de gestão compartilhada entre a Prefeitura de Goiânia, através da Secretaria Municipal de Cultura (Secult Goiânia), e o INSS. Em contrapartida à utilização do espaço, a organização promotora do evento se comprometeu a restaurar e reformar o prédio para que ele sediasse o Centro de Memória e Referência de Goiânia, uma Diretoria da Secult municipal.
 
Mesmo com a inauguração do Centro de Memória e Referência, em julho de 2004, uma parte do edifício, nessa época, continuou sendo ocupada pelo INSS. Também funcionaram no local uma biblioteca infanto-juvenil, um café e um espaço de exposições. 

Em 2007 foi criado o evento Chorinho no Grande Hotel, realizado na calçada e imediações do imóvel. A programação reunia diversas tribos urbanas. Atualmente o espaço abriga o Núcleo Centro Cultural Grande Hotel da Secult Goiânia, onde são realizados cursos e qualificações para jovens, adultos e crianças.
 

Chorinho reuniu milhares de pessoas nas imediações do Grande Hotel entre 2007 e 2019 (Foto: Reprodução/Guilherme Narciso)
 
Em abril deste ano, a Prefeitura de Goiânia, por meio da Secult Municipal, concluiu a nova pintura externa do edifício. À época, o prefeito Rogério Cruz afirmou que, apesar de ser gerido pela Prefeitura, o local tem uma questão administrativa e financeira pendente com o INSS, que brevemente será concluída. 
 
O secretário de Cultura de Goiânia, Eduardo de Souza, afirma que há atualmente reuniões constantes com equipes da Secult, artistas e professores para projetos de valorização do Grande Hotel. "Existe, no primeiro momento, a volta do Chorinho, dentro do projeto Centraliza, para atrair público novamente para a região", diz.
 

Atualmente, edifício abriga o Núcleo Centro Cultural Grande Hotel da Secult Goiânia, com cursos para crianças, jovens e adultos (Foto: Rodrigo Obeid/A Redação)
 
Há também um projeto de restauro completo para o imóvel, o que deve ser feito a partir de orientações do Iphan. "Já existe uma equipe em trabalho, olhando cada detalhe, azulejos, teto, mobílias, fazendo esse levantamento para dar início ao restauro, mas é preciso tempo para cada ação", explica o secretário.
 
De acordo com o prefeito Rogério Cruz, o projeto de restauro está em andamento, com orçamento para reparos na estrutura interna. "O prédio é muito antigo e nós temos que seguir as orientações do Iphan, respeitando o estilo art déco, que não pode ser mudado em nada. Temos que ser cuidadosos com isso, afinal é um ponto de referência histórica, que guarda recordações e faz parte da cultura goianiense”, afirma Rogério Cruz.
 

Vista da sacada do Grande Hotel, na fachada da Avenida Goiás (Foto: Rodrigo Obeid/A Redação)
 
Para a conselheira do CAU-GO Renata Barros, o Grande Hotel tem grande importância arquitetônica e histórica. O edifício é um dos símbolos do conjunto tombado e faz parte da história não só de Goiânia, como para todo o estado e país, pois representa a modernidade que era pretendida por Pedro Ludovico e Getúlio Vargas. 
 
"Outro ponto relevante é que ele foi um prédio pensado para ser um hotel, o que não era tão comum na época. Um espaço construído para receber pessoas e eventos importantes na cidade", ressalta.
 
Para o secretário de Cultura, Eduardo de Souza, é importante que todos os grandes centros tenham esse referencial histórico, principalmente quando ele é positivo. "O Grande Hotel tem histórias e momentos memoráveis em cada década, cada visita que recebe. É importante lembrar, restaurar, revitalizar. O hotel é nosso foco e eu, sendo goianiense, ganho um presente em fazer parte desta retomada da história", arremata.
 
 

Comentários

Clique aqui para comentar
Nome: E-mail: Mensagem:
  • 22.08.2024 18:23 Heduardo Ernandes

    istive hospedado ai uma ves e dei um cagao tão monstruoso que entopiu o encanamento do andar inteiro, q vergonha

  • 24.05.2024 16:07 Marcia Reges

    Lamentável que o Poder Público espere a total degradação do local para pensar em restauração. Gasta-se fortuna por ma gestão: esses prédios deveriam ser alvo de constantes intervenções para não se chegar onde chegou o glorioso Grande Hotel!

Sobre o Colunista

Joias do Centro .
Joias do Centro .

/ atendimento@aredacao.com.br

Envie sua sugestão de pauta, foto e vídeo
62 9.9850 - 6351