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Nádia  Junqueira
Nádia Junqueira

Nádia Junqueira é jornalista e mestre em Filosofia Política (UFG). / njunqueiraribeiro@gmail.com

Ora, pois!

Eu tenho vergonha das desigualdades sociais

Pela defesa das cotas sociais | 18.08.12 - 10:51

Sou da turma que estudou em escola particular a vida toda para passar em vestibular em universidade pública. Que não faltava às aulas de monitorias, entrava noite enfiada em livros. Sempre estive entre os melhores da sala e se mérito é isso, passei na UnB e na UFG pelo dito merecimento (como Filosofia era um curso pouco concorrido, tive que ouvir que era um desperdício meu desempenho). Sou da turma que pai e mãe ralaram muito (são professores) para pagar escola particular e curso de inglês para três filhos. Sou daquelas que nunca soube o que é um Nike Shox e as roupas eram compradas na feira ou no máximo na C&A. A prioridade em casa, afinal, era educação. E, não contraditoriamente, sou declaradamente a favor das cotas nas universidades para estudantes de escola pública.

Depois de 500 anos, arrastando injustiças e caminhando (muito) lentamente rumo a justiças e igualdades, o Brasil começa a enfrentar as históricas desigualdades sociais. E a cada enfrentamento, um pulo alto dos recalcados que não aceitam mudanças goela abaixo. E, por serem históricas, se naturalizaram. É natural, em pleno 2012, andar nos parques da cidade pelas manhãs e ver crianças loiras de olhos claros e todas as babás morenas ou negras vestindo branco. É normal ver ônibus lotados de pobres, carregando gente como quem carrega gado.

É natural que não se veja médicos, advogados e engenheiros negros. É normal pedreiros, marceneiros, empregadas domésticas e pintores terem uma remuneração baixa. Normal é ter na universidade uma maioria esmagadora de alunos que vieram de escolas particulares. Mais natural ainda que em cursos como Medicina e Direito eles representem 90% ou mais. Negros médicos, meninos pobres de escola pública formados em direito ou que conseguiram se tornar empresários são os chamados vencedores. Exemplos de merecimento. Aqueles que fogem à lógica, saem do normal. Casos de televisão! Globo Repórter ou Fantástico, diria.

Mas não, isso não é normal. Essas naturalidades devem, mesmo, ser questionadas e modificadas. O Brasil jamais vai conseguir crescer sem se livrar desse ranço aristocrático de que certas coisas são para uns e outras, para outros. Não vai ter justiça enquanto mérito e merecimento forem parâmetros para decisão numa sociedade em que as desigualdades são gritantes.

Sempre fui esforçada e dedicada e pode ser que tivesse conseguido entrar numa universidade pública se tivesse estudado em escola pública por toda vida. Pode ser que sim. Mas acho no mínimo ridículo eu disputar uma vaga com alguém que não teve a mesma formação educacional e cultural que eu. É óbvio que o caminho esteve mais aberto para mim por toda a vida. Eu tinha iogurte na geladeira, pais me incentivando e apoiando, que trabalhavam 8, 10, 12 horas por dia e o salário estava na conta no fim do mês. Suficiente para dar conta da minha formação e lazer.

Meus pais não trabalharam mais ou menos que os daqueles que estudaram em escola pública por toda a vida e não conseguiram entrar na universidade. Não é mérito que deve pautar as decisões em relação à educação. Porque educação é direito, simplesmente. Não é para quem merece. E direito não tem vírgulas, não é para um ou para outro. Mas as universidades públicas brasileiras são, sim, da classe média e alta. E não por mérito, mas por oportunidade. Sendo o acesso à educação um direito de todos, que ajam de acordo com aquela máxima que está na moda: tratando desigualdades com desigualdade.

Acuados, vendo a vida ficar mais difícil, aqueles que nunca se preocuparam com educação pública de base (porque sempre passaram longe e querem fazer vestibular, ter bom emprego para pagar escola particulares para manter os filhos longe) levantam a bandeira de melhorar o ensino público de base. Não, para um dia, matricular seus filhos lá. Mas para poderem arrotar, um dia, que há direito de igualdade na disputa por uma vaga na universidade entre alunos de escolas particulares e públicas. E que se espere esse dia chegar, fechando os olhos para as naturalidades bizarras.

Não consigo não me lembrar da fala do professor Vladimir Safatle, da USP, quando o entrevistei, e reescrevo aqui. “Há um raciocínio tosco que diz que antes de investirmos nas universidades, temos que investir na educação primária. É de um primarismo de fazer vergonha esse pensamento. Deve-se haver a capacidade de jogar em dois tabuleiros.” O professor falou algo simples e óbvio: o Brasil tem desafios na Educação em todos os níveis e tudo deve ser trabalhado ao mesmo tempo para que não haja regressão no que vai bem.

Não dá para parar de investir em pesquisa no ensino superior, por exemplo, para resolver problema de analfabetismo. Mando mais uma boa frase do professor sobre esse pensamento “tosco” (como ele mesmo diz) de resolver os problemas da educação básica primeiro para que, então, todos tenham acesso à universidade. “Não é possível ficar rifando duas ou três gerações enquanto a igualdade não vem”. Educação de base deve receber, naturalmente, um investimento massivo que até hoje nenhum governo se dispôs a pagar. Como disse aqui, semana passada, o país não vai sair da miséria, ainda que com uma boa economia, enquanto a educação não receber o investimento que nunca recebeu. Mais do que 10% do PIB. Seguramente, os 50% do Pré-sal. Até lá, vamos engolir as bizarrices de nossa desigualdade social?   

Enquanto a igualdade não vem, que a universidade continue a ter, em sua maioria esmagadora, alunos de ensino particular? Que continue a receber os pobres e negros que remaram contra a maré, e com certeza, seu mérito é muito maior do que de quem teve outras oportunidades? Que continuemos a não ter médicos e advogados negros? Até a educação básica ser satisfatória vamos continuar a aceitar essas naturalidades anormais?

A política de cotas foi bem sucedida em todos os locais onde foram implantadas. Escorar-se no argumento que o nível desses alunos vai “puxar” o ensino para baixo e que eles não vão conseguir acompanhar é, no mínimo, tapar os olhos para os resultados das pesquisas onde as cotas foram implantadas. Aqui e fora do Brasil. Os Estados Unidos são um dos exemplos. O mesmo país onde, há muito tempo, teve sua reforma agrária.

O que está em discussão não é a educação. Cota não é questão de educação pública, mas de igualdade social. O que está em discussão é que, mais uma vez, alguém tem que perder para haver igualdade. Os aeroportos estão mais cheios, as filas de check-in imensas, as empregadas domésticas estão cada vez mais caras e impagáveis. As ruas cheias de carros com IPI reduzido e, só então, nos damos conta de que é insustentável todos terem um carro.

Mais uma vez, o brasileiro tem que se dar conta de que o país tem que mudar. Tem que se dar conta de que nossa desigualdade é de dar vergonha. E que não dá mais para deixar cada qual no seu canto: os pobres com os empregos mal remunerados, o ensino público superior para quem pode e o de base para quem não tem saída.

Para finalizar, levanto outro problema que, no fundo, é a causa dessa briga toda pelas cotas. O Brasil é um país que, para se ter qualquer remuneração digna, para pagar as contas e ter uma vida com menos limitações, há de se ter um diploma na mão. Todo mundo quer entrar na universidade por quê? Porque adora estudar? Porque pensa em sua carreira acadêmica? Porque quer produzir cientificamente? Claro que não. Quer ganhar dinheiro, ter um emprego com um salário, no mínimo, decente. E a saída é o diploma.

Resultado disso é a universidade cada vez mais empresarial que temos, com alunos cada vez mais desinteressados no conhecimento em si. Aqueles alunos que atrapalham as aulas teóricas. Que assinam a chamada e vão embora. Eles nem deveriam estar ali. Deveriam, simplesmente, ter um salário decente para trabalhar com o que não se exige carreira acadêmica. Cursos técnicos, por exemplo, são uma saída.   

Quando no terceiro ano fiz intercâmbio na Nova Zelândia e a professora perguntou quem iria para universidade no ano seguinte, eu e mais uns gatos pingados levantamos as mãos. Desentendi! Pensei: o que os que não levantaram a mão vão fazer quando saírem daqui? Ao fim da aula, a professora quis saber o que eu queria estudar e como seria meu retorno ao Brasil. Contei que todo mundo queria entrar na universidade. “Como assim? Todo mundo se interessa mesmo por pesquisa? Por continuar estudando?”. Bem, é claro que não.

Expliquei que era a saída para termos um emprego com remuneração decente. “Mas por que não vão fazer um curso técnico ao invés de irem para universidade?”. Bem, à época nem tinha explodido esse crescimento de escolas técnicas. Ademais, respondi porque simplesmente os salários eram insuficientes para uma vida digna. A minha colega de sala queria ser mecânica, trabalhar em oficinas mesmo. A outra, cabeleireira. “Isso no meu país não é opção”, comentei com elas, que se assustaram. Assim como se assustou minha mãe de lá quando contei quanto uma empregada doméstica ganhava aqui. “Vocês deveriam ter vergonha”, ela me disse em tom de bronca.

E eu tenho. Vergonha do ranço escravocrata que temos, de ter cada um no seu devido lugar. Vergonha de tanta desigualdade. Eu tenho vergonha da proporção ridícula de alunos oriundos de escola pública nas universidades. Vergonha quando acho muito caro pagar por um serviço braçal. Vergonha de ter um carro por pessoa na minha garagem. Por isso defendo igualdade. Por isso defendo as cotas nas universidades, até quando for necessário. Do governo, espero que tenha peito para enfrentar uma classe alta que não sofre a taxação de impostos devida. O mesmo peito para aprovar essas cotas. Para que a igualdade atinja toda a pirâmide, de cabo a rabo. E espero que dê ao Ministério da Educação o status do da Fazenda. Que a educação cresça com a economia, em todos os níveis. Até lá, estou disposta a pagar o preço da igualdade.
 

 Sou da turma que estudou em escola particular a vida toda para passar em vestibular em universidade pública. Que não faltava às aulas de monitorias, entrava noite enfiada em livros. Sempre estive entre os melhores da sala e se mérito é isso, passei na UnB e na UFG pelo dito merecimento (como Filosofia era um curso pouco concorrido, tive que ouvir que era um desperdício meu desempenho). Sou da turma que pai e mãe ralaram muito (são professores) para pagar escola particular e curso de inglês para três filhos. Sou daquelas que nunca soube o que é um Nike Shox e as roupas eram compradas na feira ou no máximo na C&A. A prioridade em casa, afinal, era educação. E, não contraditoriamente, sou declaradamente a favor das cotas nas universidades para estudantes de escola pública.

Depois de 500 anos, arrastando injustiças e caminhando (muito) lentamente rumo a justiças e igualdades, o Brasil começa a enfrentar as históricas desigualdades sociais. E a cada enfrentamento, um pulo alto dos recalcados que não aceitam mudanças goela abaixo. E, por serem históricas, se  naturalizaram. É natural, em pleno 2012, andar nos parques da cidade pelas manhãs e ver crianças loiras de olhos claros e todas as babás morenas ou negras vestindo branco. É normal ver ônibus lotados de pobres, carregando gente como quem carrega gado.

É natural que não se veja médicos, advogados e engenheiros negros. É normal pedreiros, marceneiros, empregadas domésticas e pintores terem uma remuneração baixa. Normal é ter na universidade uma maioria esmagadora de alunos que vieram de escolas particulares. Mais natural ainda que em cursos como Medicina e Direito eles representem 90% ou mais. Negros médicos, meninos pobres de escola pública formados em direito ou que conseguiram se tornar empresários são os chamados vencedores. Exemplos de merecimento. Aqueles que fogem à lógica, saem do normal. Casos de televisão! Globo Repórter ou Fantástico, diria.

Mas não, isso não é normal. Essas naturalidades devem, mesmo, ser questionadas e modificadas. O Brasil jamais vai conseguir crescer sem se livrar desse ranço aristocrático de que certas coisas são para uns e outras, para outros. Não vai haver justiça enquanto mérito e merecimento forem parâmetros para delibeações envolvendo educação pública numa sociedade em que as desigualdades são gritantes.

Sempre fui esforçada e dedicada e pode ser que tivesse conseguido entrar numa universidade pública se tivesse estudado em escola pública por toda vida. Pode ser que sim. Mas acho no mínimo ridículo eu disputar uma vaga com alguém que não teve a mesma formação educacional e cultural que eu. É óbvio que o caminho esteve mais aberto para mim por toda a vida. Eu tinha iogurte na geladeira, pais me incentivando e apoiando, que tra balhavam 8, 10, 12 horas por dia e o salário estava na conta no fim do mês. Suficiente para dar conta da minha formação e lazer.

Meus pais não trabalharam mais ou menos que os daqueles que estudaram em escola pública por toda a vida e não conseguiram entrar na universidade. Não é mérito que deve pautar as decisões em relação à educação. Porque educação é direito, simplesmente. Não é para quem merece. E direito não tem vírgulas, não é para um ou para outro. Mas as universidades públicas brasileiras são, sim, da classe média e alta. E não por mérito, mas por oportunidade. Sendo o acesso à educação um direito de todos, que ajam de acordo com aquela máxima que está na moda: tratando desigualdades com desigualdade.

Acuados, vendo a vida ficar mais difícil, aqueles que nunca se preocuparam com educação pública de base (porque sempre passaram longe e querem fazer vestibular, ter bom emprego para pagar escola particulares para manter os filhos longe) levantam a bandeira de melhorar o ensino público de base. Não, para um dia, matricular seus filhos lá. Mas para poderem arrotar, um dia, que há direito de igualdade na disputa por uma vaga na universidade entre alunos de escolas particulares e públicas. E que se espere esse dia chegar, fechando os olhos para as naturalidades bizarras.
 
Não consigo não me lembrar da fala do professor Vladimir Safatle, da USP, quando o entrevistei, e reescrevo aqui. “Há um raciocínio tosco que diz que antes de investirmos nas universidades, temos que investir na educação primária. É de um primarismo de fazer vergonha esse pensamento. Deve-se haver a capacidade de jogar em dois tabuleiros.” O professor falou algo simples e óbvio: o Brasil tem desafios na Educação em todos os níveis e tudo deve ser trabalhado ao mesmo tempo para que não haja regressão no que vai bem.

Não dá para parar de investir em pesquisa no ensino superior, por exemplo, para resolver problema de analfabetismo. Mando mais uma boa frase do professor sobre esse pensamento “tosco” (como ele mesmo diz) de resolver os problemas da educação básica primeiro para que, então, todos tenham acesso à universidade. “Não é possível ficar rifando duas ou três gerações enquanto a igualdade não vem”. Educação de base deve receber, naturalmente, um investimento massivo que até hoje nenhum governo se dispôs a pagar. Como disse aqui, semana passada, o país não vai sair da miséria, ainda que com uma boa economia, enquanto a educação não receber o investimento que nunca recebeu. Mais do que 10% do PIB. Seguramente, os 50% do Pré-sal. Até lá, vamos engolir as bizarrices de nossa desigualdade social?

Enquanto a igualdade não vem, que a universidade continue a ter, em sua maioria esmagadora, alunos de ensino particular? Que continue a receber os pobres e negros que remaram contra a maré, e com certeza, seu mérito é muito maior do que de quem teve outras oportunidades? Que continuemos a não ter médicos e advogados negros? Até a educação básica ser satisfatória vamos continuar a aceitar essas naturalidades anormais?

A política de cotas foi bem sucedida em todos os locais onde foram implantadas. Escorar-se no argumento que o nível desses alunos vai “puxar” o ensino para baixo e que eles não vão conseguir acompanhar é, no mínimo, tapar os olhos para os resultados das pesquisas onde as cotas foram implantadas. Aqui e fora do Brasil. Os Estados Unidos são um dos exemplos. O mesmo país onde, há muito tempo, teve sua reforma
agrária.

O que está em discussão não é a educação. Cota não é questão de educação pública, mas de igualdade social. O que está em discussão é que, mais uma vez, alguém tem que perder para haver igualdade. Os aeroportos estão mais cheios, as filas de check-in imensas, as empregadas domésticas estão cada vez mais caras e impagáveis. As ruas cheias de Carros com IPI reduzido e, só então, nos damos conta de que é insustentável todos terem um carro.

Mais uma vez, o brasileiro tem que se dar conta de que o país tem que mudar. Tem que se dar conta de que nossa desigualdade é de dar vergonha. E que não dá mais para deixar cada qual no seu canto: os pobres com os empregos mal remunerados, o ensino público superior para quem pode e o de base para quem não tem saída.

Para finalizar, levanto outro problema que, no fundo, é a causa dessa briga toda pelas cotas. O Brasil é um país que, para se ter qualquer remuneração digna, para pagar as contas e ter uma vida com menos limitações, há de se ter um diploma na mão. Todo mundo quer entrar na universidade por quê? Porque adora estudar? Porque pensa em sua carreira acadêmica? Porque quer produzir cientificamente? Claro que não. Quer ganhar dinheiro, ter um emprego com um salário, no mínimo, decente. E a saída é o diploma.

Resultado disso é a universidade cada vez mais empresarial que temos, com alunos cada vez mais desinteressados no conhecimento em si. Aqueles alunos que atrapalham as aulas teóricas. Que assinam a chamada e vão embora. Eles nem deveriam estar ali. Deveriam, simplesmente, ter um salário decente para trabalhar com o que não se exige carreira acadêmica. Cursos técnicos, por exemplo, são uma saída.

Quando no terceiro ano fiz intercâmbio na Nova Zelândia e a professora perguntou quem iria para universidade no ano seguinte, eu e mais uns gatos pingados levantamos as mãos. Desentendi! Pensei: o que os que não levantaram a mão vão fazer quando saírem daqui? Ao fim da aula, a professora quis saber o que eu queria estudar e como seria meu retorno ao Brasil. Contei que todo mundo queria entrar na universidade. “Como assim? Todo mundo se interessa mesmo por pesquisa? Por continuar estudando?”. Bem, é claro que não.

Expliquei que era a saída para termos um emprego com remuneração decente. “Mas por que não vão fazer um curso técnico ao invés de irem para universidade?”. Bem, à época nem tinha explodido esse crescimento de escolas técnicas. Ademais, respondi porque simplesmente os salários eram insuficientes para uma vida digna. A minha colega de sala queria ser mecânica, trabalhar em oficinas mesmo. A outra, cabeleireira.
“Isso no meu país não é opção”, comentei com elas, que se assustaram. Assim como se assustou minha mãe de lá quando contei quanto uma empregada doméstica ganhava aqui. “Vocês deveriam ter vergonha”, ela me disse em tom de bronca.

E eu tenho. Vergonha do ranço escravocrata que temos, de ter cada um no seu devido lugar. Vergonha de tanta desigualdade. Eu tenho vergonha da proporção ridícula de alunos oriundos de escola pública nas universidades. Vergonha quando acho muito caro pagar por um serviço braçal. Vergonha de ter um carro por pessoa na minha garagem.

Por isso defendo igualdade. Por isso defendo as cotas nas universidades, até quando for necessário. Do governo, espero que tenha peito para enfrentar uma classe alta que não sofre a taxação de impostos devida. O mesmo peito para aprovar essas cotas. Para que a igualdade atinja toda a pirâmide, de cabo a rabo. E espero que dê ao Ministério da Educação o status do da Fazenda. Que a educação cresça com a economia, em todos os níveis. Até lá, estou disposta a pagar o preço da igualdade.

Comentários

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  • 20.06.2013 19:47 Marilene

    Veja

  • 04.09.2012 12:33 Wagner Souza

    Querida Nádia! Sou aluno de um grande professor na disciplina de Sociologia da Educação, no curso de Pedagogia. O professor Alberto é sempre adequado em sua forma peculiar de tratar a relação entre Educação e Sociedade. Nos presenteou com seu texto e incitou uma discussão acalorada sobre as cotas. Defendo enormemente tuas palavras, pois tratam do que sempre pairou sobre meus ideais de revolta e indignação, mas sem nenhuma alternativa para canalizar essa insatisfação sufocada pela farsa sistêmica política que estamos submetidos. Abriu os meus olhos ainda mais e aliviou o fardo de culpa que me envolvia em crises de auto-incompetência e inutilidade social. Obrigado! Acessa meu blog quando retornar do XINGU: http://vozesdilacerantes.blogspot.com.br/

  • 04.09.2012 09:35 Rafaella Pessoa

    Nádia, admiro a sua coragem de expor sua opinião sobre um tema tão delicado. E ainda mais por ter excelentes argumentações quebrando paradigmas que não saem das bocas de pessoas que preferem não pensar em sociedade e apenas em benefício próprio. E isso fica muito claro quando se lê os comentários das pessoas que são contra sua opinião, declarações rancorosas,descabidas e sem fundamentação. Exatamente porque ninguém quer abrir mão "do seu" (isso inclui interesses próprios ou até mesmo a falta de capacidade de ver as coisas por outro angulo) em prol da igualdade social ou ao menos, um pouco dela.

  • 04.09.2012 01:11 Laysson Mesquita

    Eu gosto muito daquele principio de que na ética o bem comum está acima do bem individual. A maioria esmagadora dos argumentos que já vi defendem principalmente o bem individual, a propriedade sobre o direito de ter o caminho mais fácil por ter mais dinheiro. Não acredito que cotas nivelem o ensino por baixo, pois vivenciar o ensino superior público não gera muito interesse mesmo por quem já o frequenta. Pouco se debate na academia sobre seu retorno social e seu papel na formação de produção acadêmica. Embora não ache a solução ideal, vejo as cotas como o paliativo mais eficiente, principalmente considerando que o papel atual da academia é de formar mão de obra pro mercado de trabalho.

  • 27.08.2012 09:21 Paulo Murillo dos Santos

    ?? maravilhoso ter participado, por menor que seja, na sua forma????o. Sinto um orgulho ??nico de ti e, consequentemente, de suas ideias l??mpidas e justas! Paulo Murillo dos Santos.

  • 26.08.2012 07:40 cybele garcia ferreira de morais

    Fico feliz em saber que ainda h?? jovens dispostos a sacrificarem suas vidas de mordomia em fun????o de equalizar a sociedade no que diz respeito ?? socializa????o dos direitos e das benesses do desenvolvimento. Espero que mais jovens como esta estejam dispostos a cumprir sua frase final: "At??, l??, estou disposta a pagar o pre??o da igualdade."

  • 25.08.2012 03:22 LAURA MARIA

    Excelente texto nádia. Passei pelas mesmas situações de vida que você, tendo sempre estudado em boas escolas e estudado em universidade pública graças à luta diária de meus pais, profissionais liberais. também sou totalmente a favor das cotas, sejam raciais ou sociais. Somente assim, alcançaremos a efetiva igualdade material. Também tenho muita vergonha de nossas desigualdades. faço minhas as suas palavras. parabéns por tão lúcida visão do brasil.

  • 23.08.2012 07:34 Marlon C. França

    Nádia, realmente suas palavras montam toda a arquitetura que vivemos atualmente no brasil. Espero, definitivamente, que este seja o novo tempo, o tempo das oportunidades educacionais e profissionais para as pessoas que foram durante toda a história do nosso país inseridas na margem da sociedade. meus parabéns pelos valores sociais adquiridos com o privilégio da educação permitida pelos seus pais. abraço!.

  • 23.08.2012 17:20 Carmem Sandra

    Puxa vida, Nádia, acho que você que se coloca de forma muito corajosa e autêntica. Apesar de ter sido privilegiada, reconhece o valor do que recebeu e entende a necessidade de se igualarem os direitos. Hoje em dia, as pessoas estão encurraladas e é cada um por si. É bom demais ver uma jovem como você expondo tão dignamente seus valores. Beijo

  • 21.08.2012 09:09 José João Pereira

    Fabio junior, só um comentario. Nada contra. Eu prefiro ser o dono da verdade (o que claramente não é o caso da autora do texto) do que o grande babaca que voce mostrou ser em seu ultimo comentario. .

  • 21.08.2012 08:22 Fernando Matos

    Má vontade e falta de visão crítica definem algumas pessoas que comentam sempre que alguém defende as cotas. Onde na visão de quem defende cotas está contida a ideia de quem brancos/classe alta/média não merecem estudar em universidades públicas? vocês realmente estão fazendo valer o quanto seus pais e suas mães gastam em educação? porque, sinceramente, compreensão de texto é algo imprescindível no repertório educacional atual e pelos comentários vejo que está passando longe. Ã? questão é simples: como concorrer quando não há equidade de oportunidades entre os concorrentes? vocês realmente acreditam que a questão é só investimento do governo? vocês não consideram toda a estrutura que há por trás dos alunos de escolas particulares que vão prestar vestibular? cursinho, transporte, tecnologias, cursos de línguas e mais um tanto de oportunidades e coisas que esses alunos tem acesso que os de escola pública não tem? e, por favor, sejamos sinceros, qual a diferença entre cota social e cota racial quando neste país pobreza tem cor? e quando sabemos que mesmo nas escolas públicas os alunos brancos - entendidos como tais ou auto-declarados - levam vantagens em relação aos alunos negros? vocês que defendem tanto que tem uma educação mais primorosa não enxergam isso ou fingem não enxergar? senso crítico não está sendo ensinado em suas escolas? porque por algumas falas produzidas neste espaço eu percebo o contra senso escancarado que muitos aqui que acham um absurdo as cotas preferem ignorar: se alunos que entram pelas cotas implodem a qualidade de ensino, por que as universidades particulares não são o destino certo de alunos de escolas particulares? porque vocês estão esquecendo que as universidades particulares se mantém por conta do contingente de estudantes das escolas particulares que não passam nas públicas, logo, pela lógica, se eles tem uma "boa formação e uma educação melhor" o local onde eles cursam ensino superior deveria ser melhor também, não? e por que, já que vocês resolveram se preocupar com o ensino público brasileiro não percebem que o ensino superior também precisa de investimentos e que sendo assim as particulares teriam vantagem porque não estão submetidas as burocracias do estado? concorrência, como a própria palavra já sugere, é algo que acontece entre pessoas no mesmo patamar de igualdade. Alunos de escolas públicas e de baixa renda - que volto a repetir são em sua maioria negros - não são seus concorrentes! eles concorrem entre eles. Vocês sempre concorreram entre vocês. A verdade é que até esse aumento de cotas vocês sequer viam os alunos das escolas públicas como pessoas que deviam ser consideradas durante o processo de vestibular. só que agora as coisas estão na mesma proporção. A questão não é como vocês pintam de forma muito rasa "empurrar" quem "não tem capacidade" na universidade" a questão é social! como mudar a base e o status quo quando não há mudança na estrutura? enquanto negros e pobres forem excluídos das universidades, eles continuarão a serem excluídos fora dela! ã? simples. E pra concluir quais cursos vocês vão prestar? porque, ao que parece, quem mais se sente prejudicado são os alunos que vão prestar vestibular pros cursos considerados de elite, os que as pessoas enxergam como os que mais trarão retorno financeiro ao fim da vida acadêmica. Ou seja, os cursos da elite branca e classe alta.

  • 20.08.2012 06:42 Renata Rocha

    Prezada nádia, obrigada por mais uma vez me fazer mudar o ponto de vista sobre questões tão importantes. Através da sua argumentação consistente abro mão de opiniões formadas ao longo dos anos sem o menor pudor. abraços, .

  • 20.08.2012 05:44 Ana Clara

    Que podre você. Tem vergonha do ranço escravocrata, dos carros na garagem e do salário baixo dos trabalhadores braçais. O que adianta ter vergonha, se não tem ação? "ah eu fiz um texto defendendo as cotas, vamos dar esmola pra quem não teve oportunidade" grande coisa, dê vagas para o pessoal das escolas públicas terríveis, e que se dane que a educação básica deles não teve o mínimo de qualidade. quero ver, depois que as cotas forem aprovadas, todos cobrarem pela educação pública de qualidade. Pq é lógico que só o sistema de cotas não vai ajudar em nada. em várias cidades do rs a educação pública tem excelente qualidade, mas isso ninguém divulga, só divulgam a medida populista aprovada pelo senado para garantir os votos da população alienada bem a tempo das eleições. e tudo o que os portugueses exploraram do brasil? porque não temos cotas lá?! ora, é uma enorme dívida histórica! e quem é classe média e estuda em um colégio particular médio, pois não tem condições? bom esse não vai ter nem os benefícios das cotas e nem os benefícios dos cursinhos de 1000 reais. cotas nunca vai trazer igualdade, nem chegar perto disso. Sempre terá alguém que será excluido e não terá garantido o seu direito de educação pública de qualidade. a divisão das universidades federais ficará ainda maior, entre os superpreparados e os superdespreparados. A distância entre os universitários aumentará e irá diminuir a qualidade do ensino sim. Cada reitor deve ter a real noção de quanto deve ser a inclusão, sem afetar a qualidade do ensino. a função das universidades é um ensino de pesquisa e não um melhoramento social. Quem tem que melhorar a igualdade é o governo, que não está preocupado com a qualidade do ensino e sim com números. ã? triste ver como é fácil alienar as pessoas mesmo com algo tão óbvio. Bom, eu tenho vergonha é de pessoas como você, que ao invés de ficarem atentos contra as manipulações do governo aplaudem suas medidas insanas, autoritárias e populistas. De pessoas que ao invés de realmente olharem através do outro ficam acirrando as disputas entre classes. E que não entendem que o brasil só vai mudar quando todos se unirem.

  • 20.08.2012 01:59 lucas galhardo

    Isso ai continuamos com a mesma premissa: entregar diplomas para aqueles que "assinam a chamada e saem fora", e não formar mentes. Melhoraremos as estatísticas? de fato. continuamos a maquiar os problemas do nosso país. O velho jeitinho brasileiro.

  • 20.08.2012 12:42 75%Jesus

    Â??não é mérito que deve pautar as decisões em relação à educação. Porque educação é direito, simplesmente. Â?? falou tudo, cara colunista. Me parece que o grande problema da educação pública está na qualidade dos lares de seus alunos. As cotas de 50% para os alunos de escolas públicas poderá contribuir enormemente, em um futuro próximo, para a melhora destes lares.

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