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Rimene Amaral

A muçarela no novo cardápio

| 26.06.25 - 17:17
Sempre fui eficiente e interessado em fazer correções nos erros contidos em convites de casamento, atas de condomínio, receitas culinárias e cardápios. Aliás, não há cardápios incólumes aos erros. Enquanto o pedido é preparado, eu tenho a valiosa missão de encontrar erros na carta de produtos da casa. Sempre há. E, me perdoe o trocadilho, cardápio de pizzaria é um prato cheio. A começar pelo ingrediente que mais tem nas pizzas: muçarela.
 
Era uma pizzaria muito boa, no Setor Marista, em Goiânia, no início dos anos 2000. Um ambiente bem intimista: quatro mesinhas na varanda e outras quatro do lado de dentro. Produto muito bom. De verdade. Eu gostava de uma marguerita tradicional, com muito manjericão: “Capricha no verde”, eu dizia ao garçom sempre que pedia. Não sei porquê, mas às sextas-feiras eu pedia calabresa com cebola extra.
 
O tempo para o preparo e a entrega do pedido era o mesmo de três chopes. Eu bebia mais rápido que os mortais ao álcool. Era tempo mais que suficiente para a leitura completa e revirada do cardápio. A princípio, anotava os erros impressos num guardanapo para mostrar, posteriormente, ao gerente. De todos, o mais gritante era muçarela escrita com dois ésses: “Mussarela”. Raros eram os cardápios que continham a grafia correta, com Ç. 
 
 
Cardápio (Foto: divulgação)
 
Virei amigo do gerente. E fazendo o papel de chato acima da média, comecei a reclamar da gramática do cardápio para ele, tentando ajudar com a imagem do estabelecimento. Todas as vezes eu questionava: “Quando vão mudar isso?”. E ele dizia rindo: “Todo mundo escreve assim!”. Eu replicava: “Você não é todo mundo! E não é porque todo mundo escreve errado que você também precisa escrever. Faça a diferença”. Ficou relutante em mudar o cardápio por muito tempo.
 
Um dia cheguei, pedi um chope - “sem colarinho, por favor” - e estendi a mão ao cardápio. Surpresa! Em toda a carta, onde estava impressa a palavra “muSSarela” havia um Ç enorme, em pincel atômico preto, em cima das letras repetidas. Era uma clara alusão de que, a duras penas e depois de muita insistência, o cardápio tinha sido corrigido. E o erro tinha ficado escancarado. Quem não sabia, aprendeu. 
 
Um dos exemplares do que seria o novo menu, enviado ao designer que faria a carta de produtos, com a correção grosseira em preto por cima dos dois ésses (SS), foi feito exatamente como estava a correção e, por pura implicância do proprietário, o cardápio passou a grafar “muçarela”, com cê-cedilha maiúsculo, em vermelho, em cima dos dois ésses (SS). “O senhor pediu para fazer do jeito que estava”, teria justificado o designer quando o gerente reclamou da forma como a correção teria sido feita e impressa no cardápio definitivo. Não mexeu em nada!
 
O triste é que o orégano continuou sem acento. Esse perdurou até o fechamento da pizzaria, com a morte do proprietário, dois anos e quatro meses depois que o novo cardápio começou a circular, e cujos preços nem foram reajustados.
 
*Rimene Amaral é jornalista, radialista e fotógrafo

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