Na história das ideias religiosas, o ano de 1857 representa um marco importante estabelecido por um neologismo criado pelo pesquisador de fenômenos mediúnicos Hippolyte Léon Denizard Rivail, que ficaria mundialmente conhecido sob o pseudônimo de Allan Kardec. À já existente palavra espiritualismo Kardec reuniu o termo “espiritismo”, por ele criado, que dali em diante ganharia a cidadania no corpo da linguagem universal para designar de maneira específica a sua doutrina de filosofia da religião.
Sob o novo termo, Allan Kardec constituiu todo um corpo de doutrina com base no pensamento cientificista de seu tempo que, segundo suas palavras, dialogariam com as mais variadas vertentes do pensamento humano. Em termos fenomênicos existe grande semelhança entre a vasta gama de fenômenos anímicos observados tanto no espiritualismo quanto no espiritismo, conforme se depreende de obras de autores insuspeitos de comprometimentos doutrinários, como é o caso de “As formas elementares da vida religiosa”, de Emily Dukheim.
Neste contexto de ideias, a Revista Caminhos, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, trouxe em seu número 2, volume 22 de 2024, o dossiê intitulado “Os Espiritualismos em Perspectiva”; num conjunto de artigos que abrange a temática sob a edição textual e epistêmica assinada pelo professor Dr. Luiz Antônio Signates Freitas, pela professora Dra. Ângela Teixeira de Moraes e por nós, cuja edição pode ser conferida no conjunto de seus excelentes artigos no
link.
Esse dossiê temático da importante publicação da PUC-GO reflete a versatilidade intelectual de seu principal proponente, o professor Signates de Freitas, que no último dia 05 do presente mês e ano defendeu uma tese junto à Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Goiás para progredir à condição de professor titular daquela instituição. À opção de expor um memorial acadêmico, o professor optou por apresentar uma tese à banca examinadora, formada por decanos da área, de expressão nacional e internacional, no contexto da epistemologia da comunicação.
No importante trabalho apresentado à banca, intitulado “Por uma metateoria das tensões comunicacionais: fundamentos para um objeto metateórico na ciência da comunicação”, o professor e pesquisador Signates Freitas analisa o campo da teoria epistemológica em torno da área de comunicação e sua performance cultural no Brasil. Luiz Signates asseverou em sua apresentação que o campo da comunicação funciona em nível epistemológico como um arquipélago teórico pontilhado em sua constituição por diferentes teorias que não dialogam entre si de forma ostensiva.
Neste contexto, o acadêmico goiano articula os postulados teóricos de sua pesquisa em função do trabalho do pesquisador da Universidade de São Paulo falecido de câncer, no contexto da covid-19, Ciro Marcondes Filho, que elaborou uma teoria própria sobre o seu campo de atuação como pesquisador. Argumentou o professor Signates Freitas, em sua defesa junto à banca, que o trabalho do Marcondes Filho ainda não teve o devido reconhecimento de seus pares, sugerindo uma maior interlocução com o pensamento do pesquisador da USP.
De maneira bastante curiosa ocorre fenômeno semelhante no campo da teoria do conhecimento, ou epistemologia, da literatura. Nos estudos literários a definição do que é literatura apresenta também uma formação que se poderia compreender conforme a metáfora de Signates; ou seja, em uma estrutura como a de um arquipélago, conforme pode ser inferido e conferido na obra do pesquisador brasileiro Roberto Acízelo de Souza, justamente intitulada de “Teoria da Literatura”. Neste importante trabalho de Roberto de Souza se observa uma instigante analogia com o trabalho do pesquisador goiano, embora as diferenças de campo.
Em uma metaforização semelhante, os pensadores franceses Gilles Deleuze e Félix Guattari conceberam a metáfora epistêmica do rizoma para articular as várias possibilidades discursivas neste ou naquele campo teórico. Cada ilha, no contexto rizomático, representaria um rizoma específico que se comunicaria com os demais por hastes rizomáticas que ambos os autores descrevem em sua obra teórica acerca do tema, que recebeu o título de “Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia”. Na França, o material foi publicado em volume único, enquanto no Brasil os editores o dividiram em cinco volumes.
Ou seja, em sua brilhante trajetória intelectual e espiritual, o doutor Signates Freitas domina com segurança dois campos epistêmicos distintos como pesquisador; pois, além de professor titular em comunicação, atua também no campo das ciências da religião na Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Na perspectiva do rizoma como metáfora epistemológica se constata, como inferência óbvia, que o domínio amplo em mais de um campo do conhecimento, sobretudo na excepcional fragmentariedade das disciplinas acadêmicas no mundo contemporâneo, configura uma proeza digna de nota.
Os componentes da banca que conferiram a progressão ao Dr. Signates Freitas deram a ele nota máxima, ressaltando que a sua tese tem todos os elementos para tornar-se um referencial teórico nos estudos da comunicação no Brasil. Neste sentido, o trabalho do professor Signates representa não só a maturidade intelectual de um notável pesquisador, conforme ficou evidente nas palavras dos eméritos professores e pesquisadores que o sabatinaram, mas também configura um motivo de orgulho para a cena cultural e acadêmica de Goiás.
*Gismair Martins Teixeira é Doutor em Letras pela UFG com Pós-Doutorado em Ciências da Religião pela PUC-GO.