Ontem, dia 30 de novembro, iniciaram-se as filmagens de "O Diabo veste Prada 2", a história fictícia baseada na personalidade da editora-chefe da Vogue americana, Anna Wintour. Conhecida pelo seu temperamento gélido e rigoroso, filha de um britânico com uma norte-americana, Wintour herdou classe e estilo.
Ressaltei uma curiosa cena do filme de 2006, onde a personagem desafia sua assistente a conseguir uma minuta do novo livro de Harry Potter para que suas filhas se antecipem em ler antes de sua chegada às livrarias. A escolha e o motivo em citar o nome deste best-seller está associada ao gosto unanime de uma geração que aderiu ao estilo clássico britânico, cuja ênfase na etiqueta da juventude, nos princípios morais e o 'severo' combate às trevas são características análogas a uma utopia social.
Escrito pela atuante e feminista, J.K. Rowling, que há anos, vem sendo alvo de críticas e polêmicas, por levantar a causa anti-trans na sociedade europeia, dedica boa parte de seus posts nas redes sociais para analisar as legislações sobre o assunto. Tentativas em vão de cancelamento da escritora britânica só fortaleceram seus argumentos e abriram narrativas sobre questionamentos mais que pertinentes. A HBO acaba de fechar o contrato para iniciar as filmagens da série Harry Potter na emissora, dando carta-branca aos pitacos de Rowling.
A 'saga' Harry Potter também está entre as preferências literárias do queridinho da vez, o bilionário Elon Musk, que se manifestou recentemente contra o uso de pronomes de gênero num game de RPG, alegando ser estratégia para propaganda woke.
Aqui no Brasil, a artista carioca, Aleta Valente, conhecida nas redes sociais como @ex_miss_febem vem causando um alvoroço dentro da Academia de Belas Artes, cutucando ferrenhamente a ferida. Ela relata ter sofrido vários tipos de ameaças e perseguições por alegar que:
"A mulher é um ser humano completo. É uma fêmea da espécie humana".
Valente é porta-voz da plataforma "Fêmea Feroz", que publica semanalmente textos, pesquisas acadêmicas e traduções de mulheres do século XIX à contemporaneidade.
Questões como a da polêmica boxer argelina nas Olimpíadas de Paris, este ano, só reproduzem mais argumentos sobre o assunto e como isso é desvantajoso para o gênero feminino.
Controle de poder, abuso psicológico, violência física, ideologia política e movimentos de gênero extremistas, o dito atualmente: movimento woke são alguns dos desdobramentos da causa trans.
Resgatar os espaços, ocupados por lutas feministas, é o grande foco do discurso transvestido desses "homens", que se auto reconhecem 'mulheres'.
A meu ver, a obra cinematográfica que mais se aproxima desta distopia coletiva é "A pele que habito" (2011) do diretor espanhol, Pedro Almodóvar. Há algo no filme que nos clama por compaixão, perdão e empatia, mesmo com o exacerbado melodrama e as cenas tragicômicas. No final, tudo dá certo e, é lindo! Mas isso no filme, né, gente! (Contém spolier): A ideia do roteiro sobre a involuntária cirurgia de gênero no garoto sequestrado, garantiu que ele fosse desejado pela garota que ele gostava, porque, afinal, ela gostava só de garotas.
A história é terrivelmente bizarra, assim como este tema, pois o que não falta aqui é ferida para cutucar.
A pergunta que fica é: estamos civilizada e psicologicamente prontos para cutucar esta ferida?
"Diva", Juliana Notari, 2020, Usina de Arte, PE, registro pela @professoralauramacedo
*Tatiana Potrich é designer de joias e curadora de eventos culturais