Alexandre Parrode
Goiânia - Após a divulgação de um relatório
que levou a público a situação de irregularidade das principais casas noturnas, bares e restaurantes da capital
(confira a lista completa aqui),
o jornal A Redação entrou em contato com a Secretaria Municipal de Fiscalização (Sefis) para saber o motivo do pedido de interdição dos estabelecimentos.
A assessoria de imprensa do orgão explica que o documento não significa que as casas citadas serão fechadas de imediato. "Os locais que aparecem com pedido de interdição foram notificiados por estarem com irregularidades, não se pode generalizar, cada caso é um caso", afirma o assessor Amauri Garcia. Os pedidos foram feitos pelos fiscais que visitaram os locais, mas ainda é preciso que os mesmos sejam julgados pelo Contencioso da secretaria (departamento que analisa e dá seguimento aos processos) para que, então, o secretário assine o mandado de interdição.
No entanto, em entrevista ao AR, o secretário municipal de Fiscalização, Allen Viana, adiantou que nove desses estabelecimentos vão ser fechados na capital ainda nesta semana. "Não podemos passar os nomes deles, pois o fiscal precisa chegar ao local em funcionamento para poder interditá-lo", afirmou.
De acordo com a secretaria, o grande problema dos estabelecimentos da lista é que a maioria não possui todos os documentos para a expedição do alvará de localização e funcionamento. "De acordo com o artigo 111 do Código de Postura do Município, nenhum comércio, indústria ou prestador de serviço pode iniciar as atividades sem o devido alvará. Mas, na prática, quase todos só abrem (e quando abrem) o processo bem depois de abrirem as portas", explica o assessor Garcia.
Burocracia
Por telefone, o AR conversou com alguns donos de estabelecimentos citados no relatório - que, com medo de sofrerem retaliações, preferiram não ser identificados - e eles pontuaram que a situação não é tão simples quanto afirma a secretaria. Inclusive, muitos perfis no Facebook denunciaram a morosidade do poder público e sugeriram até a existência de uma suposta "Indústria da Propina" dentro dos órgãos reguladores.
Um dos empresários afirma que a Sefis, depois do incidente na Boate Kiss, em Santa Maria (RS), decidiu "mostrar serviço". "Agora a legislação está mais rígida e eles fazem diversas vistorias, mas e os outros incontáveis órgãos que precisamos peregrinar para conseguir as licenças necessárias, será que o serviço está à altura da fiscalização?", questiona.
O mesmo ainda afirma que está esperando a visita da Vigilância Sanitária desde o dia 31 de janeiro. "Agora, imagine, ter que aguardar seis meses para que eles me digam, pelo menos, o que está errado no meu estabelecimento!", aponta o dono, intrigado.
Incêndio na boate Kiss teria intensificado a fiscalização em estabelecimentos de todo o país
(Foto: mancheteonline.com.br)
Já um segundo proprietário passa por uma situação ainda mais complicada: espera por um alvará da Agência Municipal de Meio Ambiente (AMMA) há quase 2 anos. "Não é brincadeira, cara. Desde 2011 estamos esperando o documento, que ficou mais de 200 dias parado no órgão por pura incompetência. Tenho um informe escrito que comprova a falta de análise no meu processo", explica ele. "Já imaginou se eu estivesse fechado esperando esse alvará? Há dois anos estaria pagando aluguel, água, energia e impostos caríssimos sem nenhum lucro. Como funcionaria isso?", completa.
Segundo os empresários, a situação da maioria da classe é a mesma. "Estamos prontos, com todas as exigências cumpridas, todos os artigos de segurança, tudo que a lei manda. Só estamos à espera de um bendito papel. A matemática é simples: se eles não me entregam o alvará, fico irregular. Se estou irregular, sou interditado. A culpa é minha? Não. Minha empresa está completamente preparada", finaliza um deles.
Quando questionados sobre a suposta propina, nenhum dos empresários quis se manifestar. Afirmaram apenas que não há um pedido formal de dinheiro para "acelerar" o processo, mas que muitos funcionários sugerem o ato ilícito.
Rebate
O secretário Allen Viana reconhece que há sim burocracia no processo, mas deixa claro que não vão ser toleradas desculpas. Segundo ele, os donos de estabelecimentos têm as mais diversas explicações para a falta dos documentos necessários e exigidos em lei. "Os que não correm atrás de suas licenças, inventam os mais turvos motivos e culpam a prefeitura, o sistema. Nós consideramos tudo isso, mas não vamos tolerar descumprimentos", afirma.
Sobre os pedidos de interdição destes estabelecimentos, o secretário esclarece que várias ações de fiscalização vêm sendo desenvolvidas desde fevereiro deste ano. "O que foi divulgado é apenas o resultado de uma série de processos contra os estabelecimentos citados, que se desdobram desde o começo do ano", explica Viana.
Viana destaca ainda que, após o incêndio na Boate Kiss, a pedido do próprio Ministério Público Estadual, foi feito um mapeamento de todos as boates, bares e restaurantes de Goiânia, e uma nova escala de fiscalização foi intensificada. "Acho legítimo o discurso do empresário, mas o regramento foi feito para previnir riscos, para previnir acidentes. E é isso que estamos fazendo", confirma o secretário.
Questionado sobre a chamada "Indústria da Propina", Allen rechaça a possibilidade: "ao invés de fazerem insinuações rasas, vagas e turvas, ao invés de misturarem argumentos, de misturarem 'alhos com bugalhos', seria melhor que esses proprietários denunciassem, com especificidade, com detalhamento, quem foi o servidor público que os cobrou propina. Tenha certeza que as medidas cabíveis vão ser tomadas de imediato".
Para o secretário, ao que parece, as denúncias de propina não são diretamente ligadas à Secretaria de Fiscalização. O suposto problema aconteceria em orgãos que fazem a emissão dos alvarás. No entanto, o secretário garante: "confio, defendo e afirmo que meus fiscais não praticam, e nunca praticaram, atos deste tipo. Se isso acontecer, por favor, me apresentem o nome do mesmo, pois este será afastado imediatamente e eu próprio instaurarei uma investigação".