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(Foto: Freepik)Levantamento divulgado pela CBIE Advisory - consultoria especializada em inteligência estratégica e regulatória para os setores de energia e saneamento básico - mostra que o Estado pode produzir 2,7 bilhões de metros cúbicos de biogás e biometano por ano, quantidade suficiente para abastecer toda a demanda atual goiana e ainda gerar excedente para novos projetos industriais.
O Governo de Goiás, com o propósito de estimular esse setor e diversificar a matriz energética estadual, chegou a anunciar, em 2024, a introdução de 500 ônibus movidos a biometano na Região Metropolitana de Goiânia, por meio do Consórcio BRT, a partir de 2026. O incremento na frota significaria a garantia de demanda de 4,8 milhões de metros cúbicos por mês, ao longo de 20 anos, além de possibilitar novos investimentos superiores a R$ 300 milhões em infraestrutura para a produção do biometano a longo prazo em Goiás, fortalecendo parcerias estratégicas com governos estrangeiros e setor privado.

Meta é colocar 500 ônibus movidos a biometano na frota da Região Metropolitana de Goiânia
(Foto/Edinan Ferreira/Comset/SGG)
Para o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Goiás (Fieg), André Rocha, o biometano é o ‘novo ouro verde’ do estado. “É uma das principais apostas para integrar inovação, sustentabilidade e desenvolvimento regional. Goiás tem grande volume de resíduos agroindustriais que podem ser transformados em energia limpa, com geração de emprego e renda no interior. É por isso que chamo de ‘novo ouro verde’: ele pode mudar nossa matriz energética e posicionar o estado como referência nacional em bioenergia”, afirma. Segundo André, essa nova fonte de energia representa uma oportunidade única de descarbonizar a economia, sobretudo no transporte, reduzindo o uso de diesel, que ainda é majoritariamente importado, e promovendo ganhos ambientais significativos.
“O biometano transforma um subproduto que até então não trazia renda em uma nova fonte de receita. Ele pode ser utilizado para produção de energia em usinas, nas frotas de transporte e até em propriedades rurais, garantindo sustentabilidade econômica e ambiental”, detalha. Ele explica que o combustível também oferece benefícios para a agropecuária, ao gerar biofertilizantes e reduzir custos com insumos importados, e contribui para a sustentabilidade de aterros sanitários e políticas de saneamento, com potencial de substituir lixões e gerar receita adicional para municípios.
Segundo André, a consolidação do biometano exige políticas públicas claras e âncoras de demanda que incentivem investimentos. Um exemplo concreto é a já citada iniciativa do governo estadual de colocar 500 ônibus movidos a biometano em circulação na Região Metropolitana de Goiânia. “Quando você sinaliza demanda, ajuda o setor a decidir pelo investimento, mesmo em plantas que chegam a R$ 200 milhões, cujos custos financeiros são altos. Esse tipo de iniciativa é crucial para destravar o mercado e estimular empresas a adotarem o biometano, inclusive para melhorar seus indicadores ESG [Environmental, Social and Governance, que em português significa Ambiental, Social e Governança]”, explica.
O presidente da Fieg também destaca os desafios regulatórios, logísticos e de financiamento. “Os principais entraves estão no marco regulatório, no financiamento de projetos inovadores e na formação de mão de obra técnica. A Fieg atua junto a governos e empresas para estruturar soluções. Temos projetos com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) voltados à capacitação, articulação institucional para melhorar o ambiente regulatório e participação ativa em fóruns como a Conferência Brasileira de Transição Energética, que reuniu os principais atores do setor”, afirma.

Presidente da Fieg, André Rocha defende que o biometano representa uma oportunidade
única de descarbonizar a economia (Foto/Naira Batista)
Cofundador e diretor da CBIE Advisory, Bruno Pascon complementa a visão do presidente da Fieg, destacando o potencial de Goiás. “O estado concentra enorme potencial de produção de biogás e biometano a partir de resíduos agroindustriais. Estimamos um potencial produtivo de 2,7 bilhões de metros cúbicos por ano, sem considerar pastagens degradadas, equivalente a cerca de 7,5 milhões de metros cúbicos de biogás ou 4 milhões de metros cúbicos de biometano por dia, cerca de 11% da demanda atual de gás natural no Brasil”.
Bruno explica que esse avanço não é isolado. “O que diferencia Goiás é a capacidade de integrar o agronegócio, o setor sucroenergético e a agenda de descarbonização. O estado soube aliar sua vocação natural à política de transição energética e criar um ecossistema que atrai investimentos e gera empregos verdes”. Ele destaca também o papel da Secretaria-Geral de Governo (SGG) na coordenação de políticas públicas e no incentivo a parcerias que conectam produtores, distribuidoras e indústrias consumidoras de energia limpa.
Além do impacto econômico, o biometano representa ganhos ambientais expressivos. De acordo com Bruno, comparado ao diesel, ele pode reduzir emissões em até 98%, enquanto o gás natural fóssil já possui pegada de carbono 28% a 30% menor que o diesel. “O biometano é uma fonte energética sustentável, limpa e não intermitente. Ele pode gerar receitas adicionais ou reduzir custos produtivos, descarbonizando setores como agronegócio, indústria e transporte, que juntos respondem por 65% das emissões de gases de efeito estufa no Brasil”, explica.
O especialista também reforça o potencial competitivo do biometano, destacando que o combustível já se mostra viável frente ao diesel e ao gás natural fóssil. “Em muitos casos, o biometano pode ser ofertado entre 11 e 20 dólares por MMBTU [Milhão de Unidades Térmicas Britânicas], dependendo da escala, enquanto o diesel oscila entre 29 e 32 dólares. Além disso, o biometano pode se tornar ainda mais competitivo com o Certificado de Garantia de Origem do Biogás (CGOB) e com incentivos fiscais estaduais, como os implementados por Goiás”, observa.
Outro ponto-chave, segundo Bruno, é a importância das âncoras de demanda para viabilizar os investimentos. “Projetos como a frota de ônibus movidos a biometano e a futura rede de gasodutos estaduais são essenciais para criar segurança de longo prazo e atrair capital privado. O mercado de biogás e biometano é descentralizado, mas se apoia em políticas de previsibilidade, e Goiás está conseguindo isso com planejamento e integração institucional”, destaca.
Já André Rocha ressalta ainda a dimensão estratégica do biometano para Goiás e para o país, que além de gerar energia limpa, fortalece cadeias produtivas essenciais, aumenta a competitividade e contribui para a balança comercial, reduzindo a dependência de diesel importado. “Estamos construindo um ciclo virtuoso, que conecta produção rural, indústria e inovação tecnológica, colocando Goiás na vanguarda da transição energética no Brasil”.

Arte/Fernando Salazar

O avanço do biogás e do biometano em Goiás ganha força com a experiência da Jalles, que tem investido em projetos estratégicos para transformar resíduos industriais em energia limpa e renovável. Para o CEO da Jalles, Otávio Lage de Siqueira Filho, a iniciativa surgiu com o foco de “maximizar a criação de valor dos subprodutos da nossa indústria e promover maior circularidade, identificamos a produção de biogás como uma alternativa eficiente para ampliar a energia exportada pela termelétrica operada pela Albioma”. A ideia inicial, explica Otávio, foi aprender a produção de biogás a partir da vinhaça, utilizando uma mistura com bagaço de cana-de-açúcar na caldeira de alta pressão existente.
O projeto evoluiu para um processo mais avançado de purificação, visando a produção de biometano comprimido para distribuição regional. “Essa iniciativa tem como objetivo substituir alguns combustíveis fósseis utilizados localmente como diesel, GLP [Gás Liquefeito de Petróleo] e óleo combustível, por uma alternativa renovável e sustentável, permitindo uma redução significativa de emissão de CO2, alinhando nossas operações à transição energética e à redução de impactos ambientais”, afirma.

Planta de biogás da Unidade Otávio Lage, em Goianésia:
capacidade de 10 milhões de Nm³ (Foto/Divulgação/Jalles)
A planta de biogás da Unidade Otávio Lage, em Goianésia, já está em operação, com capacidade de 10 milhões de Nm³ (metro cúbico normal) de biometano, equivalente a 22 GWh de energia. A estrutura de purificação do biometano, segundo o CEO, está na fase inicial de projeto, mas promete ampliar o impacto do empreendimento. A matéria-prima utilizada é a vinhaça, resíduo da destilação do etanol, transformado em energia limpa e circulando na cadeia produtiva da usina.
Segundo Otávio, o biometano representa economia e sustentabilidade. “O diesel é um dos maiores tomadores de custo nas operações industriais e nos transportes de cargas, e tendo em vista a existência de soluções consolidadas de motorização baseadas no uso de biometano comprimido, o biometano é uma ótima opção para redução de custo, utilizando um combustível não fóssil”, explica. Os benefícios ambientais também são expressivos, afirma ele, com redução de CO2 de 86,5 gCO2eq/MJ (gramas de dióxido de carbono equivalente por megajoule) do diesel para 5,9 a 11 gCO2eq/MJ do biometano, gerando impacto direto de mais de 25 mil toneladas de CO2 evitadas.
Ele lista que o projeto também traz impactos sociais e econômicos locais. “Permitirá a criação de 14 empregos diretos, e vários empregos indiretos. Além disso, o biometano fortalece a autossuficiência energética do setor sucroenergético e cria um diferencial competitivo para as usinas, permitindo substituir diesel em frotas internas e, futuramente, na logística de produtos”, destaca o CEO.
Otávio acrescenta que a Jalles trabalha em parcerias estratégicas com o Governo de Goiás, a Fieg e instituições internacionais, reforçando visibilidade, regulamentação e consumo do biometano. Contudo, ele enfatiza que desafios regulatórios e logísticos persistem no setor. “O Brasil possui uma rede de gasoduto muito limitada. Isso limita a liquidez do escoamento de biometano. Existem soluções para implementar logística de biometano comprimido, mas nunca serão tão competitivas e práticas quanto a injeção no gasoduto”, alerta. O CEO reforça ainda a necessidade de colaboração entre governos, distribuidoras e órgãos reguladores para monetizar os benefícios ambientais e expandir o setor.
O projeto também incorpora inovação tecnológica. “O biorreator implementado pela Albioma Codora Energia já incorporou várias melhorias tecnológicas, especialmente exigidas pela escala do projeto. Este projeto adicional para purificar o biogás também apresenta vários desafios, especialmente pela aplicação de tecnologia existente numa escala maior. Adicionalmente, a ausência de gasoduto nos obriga a buscar soluções para comprimir e transportar o biometano até os pontos consumidores”, detalha Otávio.

CEO da Jalles, Otávio Lage de Siqueira Filho destaca que o biometano representa economia
e sustentabilidade, além de impactos sociais e econômicos locais (Foto/Divulgação/Jalles)
Quanto ao futuro, a Jalles projeta expandir a produção e o consumo do biometano na região e em outras unidades da empresa. “Pretendemos consolidar a produção e consumo de biometano da Albioma Codora Biometano, com distribuição na região para substituição de GLP e óleo combustível e gradativamente incorporação do biometano para substituição do diesel da frota. Depois que consolidarmos este investimento, pretendemos explorar a produção de biometano na Albioma Codora Biometano com sólidos (torta de filtro e bagaço) e desenvolver, em co-investimento ou não, os projetos de biometano nas outras unidades, especialmente na Usina Jalles Machado”.
Otávio é incisivo ao afirmar que o projeto da Jalles representa um marco histórico para Goiás. “O projeto de biogás, inaugurado em 2023, foi o primeiro projeto de biogás de vinhaça do estado, e o projeto de biometano deve ser a primeira produção do estado. É uma grande responsabilidade e um grande orgulho para Jalles liderar este desenvolvimento tão estruturante para o estado”, ressalta.

Diretor do Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (CEISE Br) e CEO da PS7 Consultoria, Paulo Saraiva afirma que o biogás e o biometano são estratégicos para setores e indústrias que, como a Jalles, consomem grande volume de energia. “No setor sucroenergético, o biogás vem se consolidando como fornecedor de biometano para abastecer as frotas agrícolas das próprias usinas, hoje movidas a diesel. Essa substituição representa economia significativa, já que utiliza subprodutos da produção de açúcar e etanol e reduz a pegada de carbono”, explica.
Saraiva lembra ainda que usinas que utilizam biogás podem alcançar pegada de carbono negativa e gerar créditos de carbono, reforçando o papel do setor como produtor de combustível avançado — classificação já reconhecida pela Agência Ambiental dos Estados Unidos. “É um modelo que une eficiência energética, sustentabilidade e competitividade, gerando empregos e valorizando os resíduos agrícolas e industriais que antes eram subaproveitados”, acrescenta.
O diretor reforça que a expansão desse mercado também depende da integração entre políticas públicas e incentivos à inovação industrial. “Políticas de conteúdo local e linhas de financiamento verde, como as do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e do Fundo Clima, são fundamentais para consolidar a indústria nacional de equipamentos. Isso fortalece a base produtiva e reduz a dependência de importações, criando oportunidades para fabricantes e prestadores de serviço especializados”, explica.

Diretor do CEISE Br e CEO da PS7 Consultoria, Paulo Saraiva afirma que o biogás e o
biometano são estratégicos para quem consome grande volume de energia (Foto/Arquivo pessoal)
Já o diretor do CEISE Br, Frederico Becker, acrescenta que a expansão do setor no Brasil é impulsionada por empresas em busca de soluções que combinem sustentabilidade e eficiência econômica. “Vemos empresas cada vez mais interessadas em explorar resíduos agrícolas e industriais para produzir energia acessível. A longo prazo, segurança energética e viabilidade econômica vão impulsionar ainda mais o setor. Mas desafios como regulamentações em evolução, infraestrutura limitada e logística complexa exigem políticas que equilibrem incentivos com retorno econômico”, afirma.
Becker destaca ainda que o biogás e o biometano se tornaram pilares da economia verde, especialmente ao lado da cogeração a partir do bagaço de cana. “Esses processos fortalecem o adensamento industrial, geram empregos e ampliam a segurança energética nacional. O setor sucroenergético é exemplo de como a bioenergia pode ser competitiva, eficiente e sustentável, complementando fontes intermitentes como a eólica e a solar”, avalia.
Além disso, Saraiva ressalta o papel estratégico do setor industrial na expansão da bioenergia. “O mercado de equipamentos e tecnologias para biogás e biometano é promissor. Nossos associados desenvolvem mixers, sistemas de automação e toda a infraestrutura elétrica e civil das plantas de biogás, fortalecendo a indústria nacional e reduzindo dependência de importações. Observamos também um crescente interesse de empresas em adaptar e tropicalizar tecnologias, aproveitando a expertise do setor sucroenergético para criar negócios competitivos”.
O biometano também é um motor de diversificação econômica e economia circular. Becker ressalta o chamado ‘pré-sal caipira’, que são subprodutos da cana, como vinhaça e torta de filtro, valorizados na fertirrigação. “Mostra como o biogás aproveita a fração orgânica sem comprometer seu valor agrícola. É um modelo que une ganhos ambientais, eficiência produtiva e diversificação econômica”.
Além de gerar energia, o setor tem promovido capacitação e adensamento industrial. Saraiva explica que o CEISE Br conecta indústrias, engenharias e consultorias para fortalecer a cadeia produtiva. “Projetos como a Cadeia Produtiva Local Bioenergia incentivam inovação, integração de fornecedores e formação técnica, criando um ecossistema que transforma oportunidades em resultados concretos. Nosso mapeamento indicou que, em 2024, o setor movimentou R$ 37,1 bilhões, mostrando o impacto econômico real da bioenergia”, detalha.
O executivo complementa que há um movimento crescente de parcerias entre fabricantes nacionais e empresas estrangeiras para o desenvolvimento de tecnologias adaptadas ao mercado brasileiro. “Estamos vendo a formação de uma nova indústria de base energética, moderna, conectada e sustentável, capaz de planejar, operar e manter plantas de bioenergia com alto grau de eficiência e independência tecnológica”.
Os projetos de Goiás e do Centro-Sul, integrando gasodutos, transporte rodoviário e plantas compactas para geração de energia local, servem de modelo para expansão nacional. “Esses modelos equilibram sustentabilidade e viabilidade econômica, servindo de inspiração para replicação pelo Brasil”, reforça Saraiva.

À medida que Goiás caminha para se consolidar como protagonista na produção de biometano, investir na capacitação de profissionais qualificados torna-se essencial para sustentar o crescimento do setor. Para o coordenador de Serviços de Tecnologia e Inovação (STI) na área de Sustentabilidade e Transição Energética do Instituto Senai de Tecnologia em Automação, Paulo Takao Okigami, o biometano é uma das principais apostas da transição energética brasileira, e o Senai Goiás tem se posicionado estrategicamente para formar técnicos e engenheiros capazes de atender essa demanda.
“O Senai Goiás enxerga a cadeia do biometano como uma grande oportunidade para fortalecer a indústria goiana, estimulando novos investimentos em infraestrutura, inovação e qualificação profissional. Atualizamos cursos técnicos e pós-técnicos para incluir competências em biogás, purificação, automação, manutenção e gestão de processos industriais”, explica Takao. O objetivo, de acordo com ele, é preparar profissionais que vão além da operação de equipamentos, ou seja, que devem otimizar processos, digitalizar sistemas e garantir a sustentabilidade de toda a cadeia energética.

Coordenador do Instituto Senai de Tecnologia em Automação, Paulo Takao enfatiza que
o Senai Goiás busca preparar profissionais para atuar no segmento (Foto/Arquivo pessoal)
Embora ainda não existam cursos específicos de biometano, capacitações correlatas, como Fontes Alternativas de Energia, Gestão de Resíduos Sólidos e Educação Ambiental, já oferecem base sólida para o setor. “Esses cursos sensibilizam os participantes sobre preservação ambiental, uso de energias renováveis — solar, eólica, biomassa e biogás — e desenvolvimento de planos de gestão de resíduos, estimulando práticas sustentáveis e economia circular”, detalha Takao. Além disso, ele acrescenta que formações em Engenharia Mecânica e Automação Industrial complementam a preparação, permitindo que profissionais atuem na operação e manutenção de sistemas de produção de energia limpa e no reaproveitamento de coprodutos, como biofertilizantes e CO2 biogênico.
O Senai Goiás atua ainda na modernização de laboratórios, metodologias e currículos, alinhando a formação à Indústria 4.0 e à agenda verde. Takao explica que a instituição mantém parcerias estratégicas com empresas, governo e instituições de ciência e tecnologia, garantindo que a educação técnica esteja conectada às demandas reais da indústria e às metas de descarbonização. “Estamos estruturando trilhas de conhecimento que abrangem toda a cadeia produtiva, desde a captação e purificação do biogás até sua aplicação na indústria e no transporte, formando profissionais que unem técnica, inovação e visão ambiental sistêmica”, afirma.
O coordenador informa que a demanda por qualificação em energia limpa e sustentabilidade tem crescido de forma expressiva, especialmente em setores produtivos como bioenergia, alimentos e bebidas, cerâmica, química e mineração. “Usinas de bioenergia, por exemplo, têm capacitado equipes para operar sistemas de cogeração e produção de biogás e biometano, enquanto indústrias de alimentos e bebidas investem no reaproveitamento de resíduos e na eficiência energética”.
Com iniciativas como o Centro de Excelência em Energias Sustentáveis, o Senai Goiás conecta a formação técnica à inovação, ao desenvolvimento de tecnologias adaptadas e à sustentabilidade industrial, preparando profissionais para atuar em todas as etapas da cadeia do biometano. “Esse movimento garante que Goiás não apenas produza energia limpa, mas também desenvolva mão de obra qualificada capaz de impulsionar a economia de baixo carbono, consolidando o estado como referência nacional em transição energética”, destaca Takao.

Além do setor agroindustrial e toda a cadeia movimentada por essa área, os aterros sanitários representam também uma importante fonte de biogás e biometano no Brasil. De acordo com levantamento da Abiogás, o Brasil tem um potencial teórico de produção de 120 milhões de Nm³ por dia — energia suficiente para mudar a matriz energética e reduzir fortemente o uso de combustíveis fósseis. Da participação dos diferentes, o saneamento tem 6% nessa equação.

Arte/Fernando Salazar
O diretor da Clear Energy Br, Tiago Nascimento Silva, diz que hoje todos os panoramas mostram uma tendência de aumento de mais de 20% ao ano de crescimento nos próximos anos. “Os aterros sanitários têm os maiores projetos e geram maiores volumes de biometano, e esta tendência se manterá”.
Segundo ele, os projetos em aterros apresentam duas vantagens principais. “A primeira é que o investimento é mais baixo se comparado aos projetos de agro, pois o ‘biodigestor’ já está pronto, que é o próprio aterro sanitário, que já possui drenagens para chorume e gás desde sua concepção. A segunda é que vários projetos já têm geração de energia elétrica ou queima em flare - processo de segurança industrial que consiste em queimar gases excedentes ou residuais de forma controlada - para crédito de carbono há mais de 10 anos, portanto é questão de fazer um processo de transição e desligamento de algumas máquinas para usar este excedente de biogás para purificação e transformação em crédito de carbono”.
Em Goiás, o potencial de aproveitamento energético dos aterros é expressivo. “Considerando que o estado tem cerca de 7 milhões de habitantes, e que cada habitante gera aproximadamente 1 quilo de resíduo sólido urbano por dia, Goiás deve produzir cerca de 7 mil toneladas/dia de RSU [resíduos sólidos urbanos]. Esse volume poderia gerar aproximadamente 15 mil metros cúbicos por hora de biogás, ou 131 milhões de metros cúbicos por ano, o que equivale a cerca de 65 milhões de metros cúbicos de biometano — suficiente para abastecer entre 860 e 1.300 carros por dia, considerando autonomia média de 100 km/dia por veículo”, explica Tiago.
Apesar do grande potencial, existem desafios técnicos e regulatórios. “O maior desafio é o alto custo de financiamento dos projetos, poucas partes da tecnologia de purificação são nacionais e existem apenas cerca de cinco fornecedores no Brasil. A questão regulatória hoje não é um entrave, pois já temos um arcabouço jurídico que garante a equivalência do biometano com o gás natural e incentiva o setor com a Lei do Combustível do Futuro”, detalha Tiago. Ele destaca ainda a importância da precificação diferenciada para monetizar os atributos ambientais do biometano, citando o Certificado de Garantia de Origem do Biogás (CGOB) como uma solução promissora.
Além do valor energético, os projetos em aterros geram créditos de carbono. “O mercado de crédito de carbono em projetos de aterros sanitários já existe desde 2004, com mais de 50 projetos registrados nas plataformas da ONU/MDL, VERRA e Gold Standard. Hoje o valor de venda pode variar entre 3 e 6 dólares por crédito, constituindo uma receita importante para viabilizar novos projetos”, afirma.
O especialista também ressalta que exemplos nacionais e internacionais servem de referência para Goiás. Entre eles, cita o Aterro Sanitário de Caieiras, localizado em São Paulo, que abriga o maior projeto de energia elétrica do mundo a partir de aterro (20 MW) e um dos maiores projetos de biometano inaugurado recentemente. Entre os aterros públicos, destaca o projeto de Salvador (BA), com usina de 20 MW em concessão privada de 20 anos, e o aterro municipal na zona leste de São Paulo, também com projetos de energia elétrica e biometano bem-sucedidos.
Para ampliar a produção de biometano a partir de resíduos urbanos, Tiago aponta a necessidade de apoio público e incentivos, como isenção de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), linhas de financiamento especiais e leilões específicos para esta fonte. “É necessário criar um ambiente seguro e de longo prazo em termos jurídicos, regulatórios e políticos para que empresas privadas tenham interesse em investir neste tipo de projeto”, afirma.
Para ele, o papel dos aterros sanitários na descarbonização e na neutralidade climática é estratégico. “No Brasil ainda temos mais de 2.000 lixões para serem encerrados, pois são crimes ambientais. Os aterros sanitários têm papel fundamental na transição energética. Quando transformados em aterros, criam condições ideais para geração de biogás, que pode ser captado e levado para centrais para eliminação do metano. Os lixões, além de problema ambiental, são problemas sociais e de saúde pública”, conclui Tiago, reforçando a importância de integrar gestão de resíduos, inovação tecnológica e políticas públicas para consolidar a economia de baixo carbono.

Com uma combinação de incentivos fiscais e parcerias internacionais, além de todos os investimentos já realizados, Goiás busca acelerar o ritmo da transição energética e criar condições concretas para transformar o biometano em um novo motor de desenvolvimento econômico. O governo estadual publicou recentemente o Decreto nº 10.712/2025, que regulamenta benefícios fiscais voltados à produção de biogás e biometano, tornando o setor mais competitivo e atraente para novos investimentos. O crédito outorgado de ICMS pode chegar a 85% para operações internas e 90% para interestaduais — uma medida que reduz significativamente a carga tributária, estimula a inovação tecnológica e fortalece a economia verde. Na prática, a alíquota interna modal de 19% pode cair para 2,51%, e a interestadual de 12% para apenas 1,96%, criando um ambiente favorável para instalação e expansão de plantas de energia limpa em todo o estado.
Além dos incentivos fiscais, Goiás tem se destacado na atração de investimentos estrangeiros. Em fevereiro de 2025, o Estado firmou um memorando de entendimento com a indústria indiana Raj Process Equipments and Systems para a instalação de uma fábrica de biometano em Rio Verde. O projeto, que utilizará a vinhaça e outros resíduos da produção sucroalcooleira como matéria-prima, reforça o potencial do Sudoeste Goiano como polo de inovação e referência nacional em bioenergia.
Para o presidente da Fieg, André Rocha, o resultado de tudo isso é uma cadeia integrada, em que educação, indústria, setor produtivo e governo trabalham juntos para consolidar Goiás como polo nacional de bioenergia. “Entre a diversificação econômica, a geração de empregos e o desenvolvimento tecnológico, o estado se posiciona como protagonista da transição energética brasileira, mostrando que investir em inovação, infraestrutura e capacitação técnica é tão estratégico quanto produzir combustível limpo”, finaliza.

Arte/Fernando Salazar