Michelle Rabelo
Goiânia - A Unimed Goiânia lançou, nesta quarta-feira (26/3), a Rede de Cuidados Continuados, um projeto voltado à estruturação do cuidado integral e paliativo. Para além de abordar um tema ainda cercado de preconceitos, a iniciativa chama atenção por outro motivo: no país, até o ano passado, havia somente 177 equipes atuando na área — o que coloca o sistema de cooperativas de saúde na dianteira quando o assunto é o acesso a terapias do tipo, que, no contexto de doenças graves e progressivas, surgem como uma abordagem essencial para garantir suporte físico e emocional em momentos em que a cura não é mais possível.
O cenário se intensifica diante de outro dado da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP): mais da metade dessas 177 equipes está no Sudeste. Talvez por isso, a iniciativa da Unimed Goiânia, cujo público-alvo é formado por pacientes com doenças crônicas, graves e progressivas, tenha despertado grande interesse junto aos médicos. Nesta quarta-feira (26/3), na apresentação do projeto, oncologistas, neurologistas e geriatras lotaram o salão da apresentação.
"Nós somos uma rede muito grande, cuidamos de mais de 400 mil vidas", disse Francisco
Albino Rebouças Júnior ao jornal A Redação. (Foto: Kállita Guedes)
Batizada de Rede de Cuidados Continuados, a iniciativa visa oferecer uma abordagem integrada abrangendo atendimento ambulatorial, hospitalar e domiciliar, sem restrição por categoria de plano. Na prática, porém, a ação vai além. "Esse projeto envolve muito mais do que um sistema de atendimento. É uma decisão da Unimed de Goiânia de intensificar os protocolos dos momentos mais difíceis do acompanhamento com humanidade e conforto. Queremos oferecer mais dignidade para o paciente. Colocá-lo, juntamente com seus familiares, no centro de tudo", explica um dos diretores do sistema de cooperativas, Francisco Albino Rebouças Júnior.
A fala de Rebouças vai ao encontro de uma mudança de âmbito global. É que o conceito de cuidados paliativos está se modernizando. Antes, o tratamento era entendido como um acompanhamento quando o paciente está sem alternativa de cura. Agora, a Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que o monitoramento das necessidades do paciente e o acolhimento à sua família devem ser feitos a partir do diagnóstico. "Sabendo desse movimento, nós buscamos os melhores parceiros. Fizemos uma pesquisa nas Unimed do Brasil e chegamos até a Associação Sênior de Apoio à Saúde em São Paulo (Asas), que implementa um modelo de atendimento inovador e sustentável dentro dos cuidados paliativos."
Funcionamento
Com implementação imediata, a Rede de Cuidados Continuados da Unimed Goiânia vai abranger toda a estrutura assistencial da cooperativa, como o Serviço de Atendimento Unimed Adulto (SAU), o Centro de Especialidades Unimed (CEU) e o serviço de atendimento domiciliar. "A ideia é que o projeto envolva toda a nossa rede própria e os prestadores que se disponibilizarem a participar. Para isso, estamos estruturando equipes capacitadas e estabelecendo fluxos que garantam um cuidado mais humanizado e eficiente", explica Francisco, destacando que os profissionais serão convidados a participar de uma capacitação em Medicina Centrada na Complexidade (MCC), com vagas destinadas também a outros membros da equipe assistencial.
"Nós somos uma rede muito grande, cuidamos de mais de 400 mil vidas e, por isso, por conta dessa responsabilidade, a Rede de Cuidados Continuados já nasce cercada por altos parâmetros de qualidade, com orientações, capacitações, consultorias e cursos preparatórios para toda a equipe multidisciplinar", adianta o diretor, ao prometer que o investimento será revertido em um atendimento padrão ouro. "A emergência não tem data nem hora marcada. Então, precisamos treinar não só os especialistas, que trabalham com cuidados continuados no dia a dia, desde a formação, mas também todo o time que está por trás disso — que está no pronto-socorro, no plantão, na unidade domiciliar, na ambulância. Será um trabalho conjunto e de excelência."
Paliativo no dia a dia
Apresentando uma visão mais ampla dos cuidados paliativos, a médica Érika Aguiar Lara Pereira lembrou que também é papel do médico enxergar para além do paciente. "Quem que é aquela pessoa, quais são as questões multidimensionais que interferiram no seu processo do adoecimento? Essa conexão humana é fundamental nos cuidados paliativos. Essa abordagem holística promove uma melhoria na qualidade de vida, nas esferas física, emocional e social e até mesmo na eficácia do tratamento, uma vez que se tem como base uma relação de confiança."
Batizada de Rede de Cuidados Continuados, a iniciativa vai abranger atendimento ambulatorial,
hospitalar e domiciliar, sem restrição por categoria de plano. (Foto: Kállita Guedes)
A opinião é compartilhada pelo oncologista Uirá Resende. Cooperado da Unimed Goiânia, ele prestigiou o evento desta quarta-feira (26/3) e fez questão de destacar a importância de iniciativas que esclarecem o real significado dos cuidados paliativos. "Para além de somar anos à vida do paciente, o médico precisa acrescentar vida aos anos que restam para ele. Então, não existe mais essa história de fazer o paciente viver a qualquer custo, independentemente do desconforto, da dor ou do que ele tiver que passar. O que ocorre hoje é uma conversa franca e uma decisão em conjunto. É claro que não vamos, de forma alguma, abreviar a vida das pessoas, mas é urgente levar essa personalização do cuidado para dentro da saúde suplementar."
Política inédita no SUS
No âmbito da saúde pública, o tema também vem sendo amplamente debatido. Em 2024, o Ministério da Saúde lançou a Política Nacional de Cuidados Paliativos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Inédita no país, a iniciativa passou a permitir uma assistência mais humanizada, sendo guiada por três eixos: criação de equipes multiprofissionais para disseminar práticas às demais equipes da rede; promoção de informação qualificada e educação em cuidados paliativos; e garantia do acesso a medicamentos e insumos necessários a quem está em cuidados paliativos.
Na ocasião, em coletiva de lançamento da estratégia, a então ministra da Saúde, Nísia Trindade, disse que a política deverá trabalhar governo federal, estados e municípios. "O grande desafio será estruturá-la em benefício de todas as pessoas e valorizando também as equipes dedicadas a essa função. O sofrimento, a dor, os momentos terminais de uma doença desafiam muito a todos nós que estamos no campo da saúde. Por isso, essa política é tão importante”, assegurou Nísia.
No Brasil, o cenário dos cuidados paliativos tem ganhado relevância à medida que aumenta o número de pacientes que necessitam dessa assistência. Atualmente, estima-se que quase 600 mil brasileiros adultos e cerca de 34 mil crianças necessitem receber esse tipo de assistência.