Jales Naves
Especial para A Redação
Goiânia – Corajoso e determinado, o engenheiro Jalles Machado de Siqueira gostava de assumir desafios e tinha uma visão empreendedora – foi o autor do projeto para a construção da rodovia Belém-Brasília, para integrar a região central ao País, e lutou pela transferência da capital, por acreditar que o verdadeiro Brasil estava no interior. Defendia com fervor suas convicções, sempre firme em seus posicionamentos, apresentando suas propostas com embasamento nos estudos e na prática de suas atividades, na construção de casas, de pontes e de usinas hidrelétricas, pioneirismo que o projetou. Enxergava os desmandos e lutava contra o autoritarismo. Foi assim que se tornou o maior líder da oposição em Goiás na primeira metade do século passado, ao se mudar para o sul goiano e ali se instalar, trabalhar, começar sua elogiada carreira política e se consolidar na posição de tribuno que não se curvava.
Tão logo se elegeu o único Deputado Federal da oposição em Goiás na eleição de 1945, de uma bancada de nove parlamentares, não perdeu tempo. Depois de ouvir seu principal adversário ir à tribuna da Câmara dos Deputados, que funcionava no Palácio Tiradentes, na antiga capital, no Rio de Janeiro, para enaltecer seu próprio trabalho, revidou e deu sua opinião dos fatos, em discurso que marcou a sua presença no Parlamento brasileiro:
– Assumi há dias em Goiaz um compromisso com meus correligionários da UDN, para fazer uma análise da ditadura que durante 15 anos dominou aquele Estado. O senador Pedro Ludovico, outro dia, fazendo elogio do próprio governo, disse que deixava o Estado em ótima situação econômica e financeira. Sua Excelência, depois de 15 anos deixou o Estado sem estradas, sem escolas, com a magistratura, o magistério e a força pública com ordenado de fome, a lavoura arruinada e a pecuária goiana na maior crise da sua história.
Não foi contestado, como mostra o documentário sobre o político e empresário, ao resgatar a sua história para a abertura, nesta quinta-feira, dia 14, às 19h, na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, da exposição “Trajetórias – 130 anos de Jalles Machado”. O filme, dirigido pelo cineasta Antônio Eustáquio da Silva (Taquinho), com roteiro e produção do jornalista Paulo Henrique Macedo, baseou-se em documentos oficiais e em depoimentos de historiadores de renome, como o promotor de justiça Jales Guedes Coelho Mendonça, presidente do IHGG. Ainda na equipe, Gustavo Spud, edição/finalização; Alex Pereira, narração; Raissa Pagalday, direção de arte; Verônica Brandão, produção executiva; e Jonatas Tavares, elenco, com realização da TaqBrasil Comunicação Total e Gente Comunicação.
Antecedendo a abertura da exposição, às 18h haverá a Cantata de Natal, que pela segunda vez se apresenta na Casa Rosada de Goiânia, com a exibição do Coro e da Orquestra Sinfônica de Goiânia. Foi preparado um repertório especial com músicas e arranjos natalinos para apresentação de músicos profissionais e também a participação dos alunos das aulas de Musicalização que a Orquestra oferece.
Capa do documentário sobre Jalles Machado. (Foto de Taquinho)
Jalles Machado
Nascido no distrito de São Joaquim da Serra Negra, na época pertencente a Alfenas, MG, e hoje Alterosa, filho de José Francisco de Siqueira, plantador de café e empresário, e Anna Cândida Alves, foi, dos 12 aos 17 anos, como disse em discurso na Câmara dos Deputados, “um trabalhador de roça, de enxada, foice e machado”, ajudando o pai. Quando a família se mudou para Muzambinho, MG, é que começou, aos 17 anos, a estudar, no Ginásio Municipal. Em 1913 transferiu-se para São Paulo, para continuar os estudos, optando por fazer Engenharia na Escola Politécnica de São Paulo, que mais tarde possibilitou a criação da Universidade de São Paulo (USP), graduando-se em 1919, aos 24 anos de idade. Foi o único filho que estudou. Em 1920 casou-se com a paulistana Beatriz Lage e o casal teve quatro filhos: Jair, Sylvia, Otávio e Nize.
Formado, Jalles Machado decidiu se instalar na região do Triângulo Mineiro, com maiores oportunidades – como registrou o livro “Otávio Lage – Empreendedor, Político, Inovador”, de Jales Naves. Fixou-se primeiro em Monte Carmelo, trabalhando como engenheiro na construção de casas e numa cerealista, para beneficiamento de arroz. Em 1922 mudou-se com a família para o sul de Goiás, estabelecendo-se em Buriti Alegre, onde desenvolveu toda sua vida profissional, projetando e construindo usinas hidrelétricas, estradas e pontes, e montando indústrias de transformação; dividiu e demarcou terras, e plantou café, atividade que na época gerava uma das maiores receitas para a economia brasileira.
Em 1926 montou uma usina hidrelétrica em Tupaciguara, MG, por iniciativa própria, em sociedade com investidores locais. Em 1928 começou sua carreira política, ao ser eleito, pelo Partido Libertador, o primeiro intendente de Buriti Alegre, cuja emancipação política se deu com a Lei Estadual nº 821, de 30.05.1927. Exerceu o mandato até 1929, deixando a Prefeitura para assumir o cargo de Secretário de Estado de Obras Públicas, no governo de Alfredo Lopes de Moraes, ficando na função até agosto de 1930. Com a vitória do então situacionista Júlio Prestes na eleição presidencial daquele ano, atuou em Minas Gerais, comandando o Batalhão Revolucionário de Tupaciguara, em apoio à Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder nacional.
Foi diretor da Estrada de Ferro Goiás, 1930-1931; fundou e dirigiu a Empresa de Força e Luz Minerva, de Buriti Alegre, GO, 1931-1933, que construiu a pequena usina hidrelétrica que abasteceu a cidade e, depois, outra, no rio Santa Maria, afluente do rio Paranaíba, para fornecer energia para Buriti Alegre e Santa Rita do Paranaíba, atual Itumbiara – em 1933, a convite do líder político Diógenes de Castro Ribeiro, para construir uma usina hidrelétrica em Jaraguá, no Vale do São Patrício, visitou a região e adquiriu a fazenda Itajá, onde mais tarde seria criado o município de Goianésia; diretor da Fazenda Itajá S/A, Goianésia, GO, 1954-1963; e membro do Instituto de Engenharia de São Paulo e da Sociedade dos Engenheiros de Goiânia.
Na oposição
Em 1933, na eleição à Constituinte de 1934, ficou como suplente para a Câmara Federal, sem assumir o mandato. Com o deputado federal Domingos Netto Velasco militou na Coligação Libertadora, “agremiação de oposição ao interventor Pedro Ludovico”. Em 1937 deixou o grupo para apoiar a candidatura do governador paulista Armando Sales de Oliveira, do Partido Constitucionalista, à Presidência da República, nas eleições que seriam realizadas em janeiro de 1938; esse pleito não ocorreu devido ao golpe de Estado dado por Getúlio Vargas, implantando o Estado Novo em 10 de novembro de 1937.
Após a fragmentação do Estado Novo, foi um dos fundadores da União Democrática Nacional (UDN), elegendo-se Deputado Federal Constituinte por Goiás. Depois da promulgação da Constituição, em 1946, atuou em seu mandato ordinário. Foi reeleito no pleito de 1950, deixando o cargo no fim de seu mandato, em 1955. Posteriormente, se elegeu novamente deputado federal, em 1962, e foi reeleito em 1967. Durante o mandato de João Goulart, manifestou-se contrário ao projeto de reforma agrária do então presidente; e foi o autor do projeto para construção da rodovia Belém-Brasília (Rodovia BR-153).
Jalles Machado nasceu em Alfenas, MG, no dia 14 de abril de 1894, e faleceu no dia 25 de julho de 1975 em Rialma, GO. Seu filho Otávio Lage foi Governador de Goiás entre 1966 e 1971, realizando o desejo que o pai não alcançou. O neto Jalles Fontoura seguiu seus passos, sendo Prefeito (de Goianésia), Secretário de Estado em Goiás e Deputado Federal que ajudou a elaborar a Constituição de 1988.
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