José Abrão e Adriana Marinelli
Goiânia – Donos de clubes de tiro e outras pessoas ligados ao segmento, que engloba forças de segurança, caçadores, colecionadores e atletas de tiro olímpico, criticaram o novo decreto do governo federal que aumenta a burocracia para a aquisição de armas e para a prática de tiro, assim como limita o número de armas e munições que uma pessoa pode ter de forma legalizada. A declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a ideia de fechar a maior parte dos clubes de tiro também surpreendeu os responsáveis por esse tipo de estabelecimento. "Nós temos que fechar quase todos (clubes de tiro) e só deixar abertos os que são da Polícia Militar, Exército ou Polícia Civil. É a organização policial que tem que ter lugar para treinar tiro. Não a sociedade brasileira", disse Lula, na terça-feira (25/7), durante uma live.
Leia mais:
Lula defende fechamento de clubes de tiro no Brasil
Flávio Bolsonaro apresenta projeto para derrubar decreto de limita acesso a armas
Lula quer fechar clubes de tiro; oposição tenta barrar decreto de armas
Leder Pinheiro, proprietário do Clube Leder Pinheiro, que tem 1,5 mil associados em Goiânia, relata que o movimento nos clubes teve uma redução de 80% nos últimos dias. Em entrevista ao jornal A Redação, o empresário disse que, embora a prática de tiro esportivo vá continuar, os atletas e demais praticantes foram prejudicados, principalmente pelo aumento da burocracia, que encarece todo o processo. “Encarece tudo. Deu uma congelada no segmento. O documento que vencia em 10 anos, agora vence em 3 anos. Por outro lado, nós cobrimos esse serviço, então essa oneração vai gerar uma receita pela renovação do registro”, pondera.
Outra preocupação de Leder está ligada à limitação de armas e munições: apenas duas armas por pessoa e 50 munições em casa. Na visão do empresário, o limite incentiva o contrabando de munição ilegal. “Quando aumentou o limite, as fábricas passaram a fazer condições melhores, os preços caíram e, com isso, não compensava para o bandido, por exemplo, que trazia munição do Paraguai”, diz. "Agora deve mudar", pontua.
Leder também lembra que o Brasil fez um referendo sobre o desarmamento da população em 2003 e, conforme destaca, a maioria dos brasileiros foi a favor de não desarmar o cidadão, levando à toda uma regulamentação específica para as armas. Leder também demonstrou preocupação com as declarações do presidente Lula sobre o possível fechamento de alguns clubes de tiro. “É uma atividade regulamentada. O que não pode é acabar com a atividade, especialmente com o tiro esportivo, por meio de decreto”, enfatiza.
Empresário Leder Pinheiro (Foto: acervo pessoal)
O setor também critica os impactos econômicos relacionados aos decretos e possíveis mudanças divulgadas pelo governo federal. “É uma atividade que arrecada muito imposto, gera muito emprego e que tem uma alíquota elevada. Vão se perder muitos empregos e acarretar em uma redução da arrecadação muito grande”, diz Leder Pinheiro.
Segundo Eduardo Costa Sanches, dono do clube Tiro Certo, localizado em Santo Antônio de Goiás, todo o segmento foi pego de surpresa com as declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Eu acho que o tiro esportivo em si nada mais é do que um esporte. Não tem como fechar todos os clubes de tiro por conta de um pensamento político. Ele [ o presidente Lula] precisa pensar como um todo. Imagina acabar com outras modalidades esportivas. Não faz sentido", diz o empresário. O clube de Eduardo conta com mais de 2 mil inscritos atualmente.
Sobre o impacto da notícia junto aos representantes de clubes de tiro em Goiás, Eduardo garante que a mobilização é grande. "Vejo a mobilização em grupos. A repercussão é grande. Mas sabemos que para não deixar isso acontecer [fechar os clubes de tiros que não têm ligações com forças de segurança], depende de gente grande. Só os políticos têm o poder de inviabilizar essa ideia do presidente", pontua ao destacar a mobilização da oposição no Congresso Nacional.
O presidente da Confederação Brasileira de Tiro Defensivo e Caça, Sérgio Bitencourt, avalia que o novo decreto já cria condições para efetivamente inviabilizar os clubes de tiro, como a proibição da atividade perto de escolas. “Estou aqui há 20 anos, mas se abrir uma escola a 600 metros daqui, eu estava aqui primeiro, mas sou eu que tenho que sair”, ilustra. Bitencourt, dono do clube de tiro Defender, com sede em Nova Lima (MG), avalia que o segmento sofre "perseguição" e apela para que o governo federal não intervenha contra a atividade. “Nós gostaríamos que o governo entendesse que a eleição acabou. Não queremos ser objeto de vingança. Nem todos que praticam tiro votaram em Bolsonaro. É hora de apaziguar. Política não tem que entrar no segmento”, opina ao citar as diferenças políticas entre o ex-presidente da República e o atual governo.
Mobilização
Senadores da oposição apresentaram dois projetos para sustar integralmente os efeitos do novo decreto sobre armas. Uma das propostas, de autoria de Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e outros nove parlamentares, argumenta que a norma avançou na alçada legislativa do Congresso ao criar atribuições e alterar competências estabelecidas.
O autor do outro projeto, senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), afirmou que o decreto "viola a Constituição em vários pontos, excede o poder regulamentar do Executivo e impede o exercício de direitos previstos no próprio Estatuto do Desarmamento". No sábado, 53 deputados apresentaram à Câmara um projeto para sustar os efeitos da norma.