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MEMÓRIAS

Filme ‘Goiânia Rock City’ mergulha na efervescente cena musical da capital

Documentário estreia no próximo dia 24 | 18.01.25 - 14:00 Filme ‘Goiânia Rock City’ mergulha na efervescente cena musical da capital Cena do documentário 'Goiânia Rock City' (Foto: divulgação)José Abrão
 
Goiânia – Estreia na próxima sexta-feira (24/1), no Cine Ritz, no Centro de Goiânia, o documentário Goiânia Rock City. Dirigido por Theo Farah, o filme mergulha na efervescente cena musical independente da capital, desde o início dos anos 2000 até os dias atuais, destacando as bandas e artistas que marcaram a cidade. A entrada da exibição é gratuita e a retirada de ingressos começou on-line no dia 17/1.

A ideia do documentário nasceu a partir de um texto escrito por Farah, em que revisitou suas memórias do primeiro contato com a cena musical, por volta de 2003. “Lembro que entrei naquele ambiente e a atmosfera já me contagiou. Foi a primeira vez que fui ao Martim Cererê. Senti a necessidade de escrever para não esquecer aquele momento”, recorda o diretor. “Isso me marcou muito. Quando saí de lá, pensei: ‘Quero isso para minha vida, quero voltar aqui direto’.”

Nos anos seguintes, Farah se tornou parte ativa da cena independente de Goiânia, acompanhando e testemunhando de perto uma explosão de criatividade. Ele se envolveu de várias formas: participou de bandas, trabalhou como produtor cultural e atuou como roadie. “Nunca levei isso para o lado profissional, mas sempre estive envolvido pela paixão que sentia”, revela.
  
O projeto ficou engavetado por alguns anos, até que recentemente Farah decidiu retomá-lo. “Revisitei o texto, li novamente e pensei: ‘Cara, eu tenho que tirar isso do papel. A memória da cena rock de Goiânia está se perdendo, e algo precisa ser feito sobre isso’”, conta.

A ideia de transformar memórias em um documentário foi ganhando forma gradualmente. Ao lado de Bruno Fiorese, produtor e amigo de longa data, Theo Farah iniciou o projeto com a primeira entrevista, realizada com a banda Hellbenders. O que começou pequeno acabou se expandindo para um total de 27 entrevistas e mais de 50 horas de gravação, que, com muito esforço, resultaram em um corte final de 1h42.

Theo Farah (Foto: divulgação)

O recorte histórico do documentário surgiu da vivência de Farah, com foco no auge da cena, entre 2006 e 2009. No entanto, o diretor optou por uma abordagem mais ampla, explorando as origens do movimento e como ele se transformou, influenciando o cenário independente nos anos seguintes e na atualidade.

“No final dos anos 1990, já havia bandas relevantes. A Mechanics, por exemplo, já existia e abriu as portas para muitas outras. Depois vieram Hang the Superstars, Violins, e o cenário foi se diversificando”, explica Farah. “Essa diversidade de sons é uma das coisas mais importantes do recorte, porque havia bandas de todas as vertentes do rock naquela época”, completa.

Segundo Farah, essa efervescência inicial abriu espaço para gerações posteriores. “Chegamos nos ‘filhos dos filhos’ dessa geração, como o Black Drawing Chalks, que se tornou um dos maiores representantes da cena. Mas não quis parar por aí. Ainda temos uma geração muito forte depois deles, como o Hellbenders, que é praticamente uma cria do Black Drawing Chalks. Então a gente pega esse ciclo e encerra por volta de 2016”, resume.
  
Tudo isso, na visão de Farah, viabilizou ainda uma nova geração de bandas que estouraram e que vivem em turnê fora da capital, como os Boogarins e a Carne Doce, se consolidando, de fato, no cenário musical profissional e nacional independente. “Essas duas bandas representam um capítulo fortíssimo e importante em termos de alcance de público, porque elas transcenderam as fronteiras do Brasil e levaram a música independente de Goiânia para o mundo”, comenta.
 
Vivendo a cena
Hoje mais conhecido por sua arte como tatuador, Victor Rocha foi, nos anos 2000, um dos nomes mais emblemáticos do rock independente de Goiânia. À frente da guitarra e dos vocais da Black Drawing Chalks, uma das bandas mais influentes da cena, Rocha conquistou o Brasil e o mundo. Entre 2007 e 2011, o grupo marcou presença em grandes festivais, como o SWU, o Lollapalooza e o Primavera Sound, em Barcelona, além de realizar turnês que cruzaram o país, literalmente de Norte a Sul: de Rio Branco a Porto Alegre.

A Black Drawing Chalks nasceu como tantas outras bandas da época: no Centro Cultural Martim Cererê, um reduto que inspirou gerações de músicos. “A gente foi muito sortudo, né? Nasceu na geração certa, frequentou o rolê certo, tomou as decisões certas e agradou as pessoas certas. Foi uma união de coisas que nos permitiu viver o auge dessa cena. Outras bandas também viveram isso, mas a gente fez parte dessa história”, reflete Rocha.

Segundo ele, a demanda por bandas de rock não era apenas de Goiânia, mas de todo o Brasil, o que beneficiou grupos como o Black Drawing Chalks, que tinham “fome de palco”. “A única banda independente que eu conhecia que tocava mais que a gente no Brasil era o Macaco Bong. A gente tocava muito, topava tudo, queria ser visto. Nosso objetivo era fazer o melhor show possível para, quem sabe, sermos contratados de novo. E isso deu certo: quase todos os lugares em que tocamos nos receberam de volta pelo menos uma vez”, recorda Rocha.

Douglas de Castro e Victor Rocha, da Black Drawing Chalks (Foto: reprodução/'Goiânia Rock City')

Márcio Jr., um dos fundadores da Monstro Discos e frontman da pioneira Mechanics, teve papel central na consolidação da cena rock independente de Goiânia. Ele relembra os desafios e conquistas dos anos 1990, quando a Mechanics ainda dava seus primeiros passos. “Tudo o que eu queria naquela época era tocar, gravar discos e viajar. Mas, para isso acontecer, foi preciso construir, primeiro, movimentos coletivos. A Monstro surgiu exatamente com esse propósito: profissionalizar e trazer maior qualidade técnica e artística para a cena”, recorda. “Ainda hoje me sinto assim: continuo tentando fazer coisas para vê-las acontecerem.”

Márcio destaca o papel singular do público nos primeiros anos do século XXI. “O público daquela época era curioso, interessado e se sentia parte de todo o processo. Organizávamos festivais com 40, 50 bandas independentes num único fim de semana, e o público comparecia em peso. Era uma maratona de 10 a 16 shows por noite, e tinha gente que ficava até o fim”, relembra, com entusiasmo.
 
Essa conexão genuína com os espectadores impulsionava as bandas a se superarem. Para ele, essa gana do público turbinava as bandas “A vontade do público motivava as bandas a melhorar e a apresentar seus melhores trabalhos. Isso fortalecia os intercâmbios entre músicos, as redes econômicas que sustentavam os festivais e as gravadoras. Toda a cena se tornava mais sólida e ficava mais forte”, explica.

Cultura digital
No entanto, Márcio reconhece as mudanças impostas pelo avanço das redes sociais e da cultura digital. “Naquela época, vivíamos um início de conexão digital, mas em uma medida muito diferente da atual. Não dá para comparar como era a vida conectada em 2000 ou 2003 com o que é em 2025”, pondera. “Hoje, a forma como as pessoas vivem, muitas vezes mediada pelas redes, gera um impacto que dificulta o respaldo de público e a interação física, real, nos palcos, nos shows e nos espaços culturais, como acontecia naqueles tempos”, conclui.

Márcio Jr. (Foto: reprodução/'Goiânia Rock City') 

Victor Rocha avalia que parte dessa efervescência foi possível pela internet já ter avançado, mas nem tanto as redes sociais: só havia o Orkut e suas comunidades. O pessoal da cena se conhecia, e bandas, discos e gravações se propagavam diretamente, no boca a boca. Agora, ele descreve o meio independente como uma gota d’água em um oceano. “As pessoas são bombardeadas com informações diversas. Ontem mesmo ouvi o dado de quantas músicas são colocadas no Spotify por dia, e fiquei de cara: mais de 100 mil! Como alguém vai descobrir sua banda em meio a tantas?”, reflete.

Curiosamente, o nome do documentário "Goiânia Rock City" surgiu exatamente da comunidade do Orkut onde a cena se reunia, trocava ideias, compartilhava contatos e divulgava músicas, consolidando a conexão entre artistas e público. 
 
Memória registrada
Agora, essa história está eternizada no documentário, cuja principal missão é despertar o interesse das novas gerações pelo rock, segundo o diretor Farah. “Um dos grandes objetivos do filme é tentar trazer essa molecada, que não viveu isso, se interesse pelo rock. Mostrar como era a cena, como Goiânia vivia um momento incrível, com coisas legais acontecendo o tempo todo”, explica Farah.
 
Márcio Jr. destaca a relevância de preservar essa memória. "É fundamental. E esse movimento do rock alternativo goiano, que ganhou o país, que virou uma referência nacional, em alguns momentos até internacional, ele continua vivo. Continua vivo, mas já é antigo suficiente para merecer um registro dos seus, digamos assim, tempos áureos, tempos de maior popularidade”, acrescenta. “E a cena existe. Eu acho que ela ainda é vibrante. Eu acho que hoje ela está mais viva do que há cinco anos, no período anterior à pandemia, então as coisas possuem um caráter muito dinâmico”, finaliza.

Após a estreia em Goiânia, o documentário deve percorrer festivais pelo Brasil. Em seguida, segundo Farah, serão avaliadas formas de disponibilizar o longa on-line, garantindo que essa memória permaneça acessível e preservada para o grande público.
 
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