A Redação
Goiânia – O Sobrado 'Casa de Cultura Dr. Altamiro de Moura Pacheco', onde morou um dos notáveis pioneiros de Goiânia, passará por obras de restauração. Localizada na Avenida Araguaia, esquina com Rua 15, no Centro da capital goiana, a casa passa despercebida aos olhos dos mais desatentos. Mas possui um acervo cultural que ajuda a contar a história de Goiânia, Goiás e também de Brasília.
Construída nos anos 30 e tombada como bem histórico de Goiânia pela prefeitura em 1999, a Casa da Cultura foi doada para a Academia Goiana de Letras (AGL) em 1993, três anos antes da morte de Altamiro de Moura Pacheco. Além do sobrado, foi doado todo o seu acervo pessoal contendo fotos, medalhas, livros da histórica biblioteca, bens móveis e obras de arte que preservam a história de Goiás.
“Quem conseguiu a doação da Casa para a AGL foi José Mendonça Teles, então presidente da Academia. A condição de doação definitiva seria somente após a morte do doador, o que se deu na gestão da professora Maria do Rosário Cassimiro, em 1996”, explicou o atual presidente da AGL, José Ubirajara Galli.
José Ubirajara Galli vê com empolgação a restauração da Casa. Segundo ele, o local poderá voltar a ser um ponto de convívio para a sociedade goiana, além contribuir para manter viva a história de Altamiro. “A restauração da Casa trará a destinação que ela tinha, como um local de reuniões da AGL, espaço de palestras, de lançamentos de livros e também de visitação pública”, disse. “A Casa possui um acervo riquíssimo: mobiliário e uma rica biblioteca. Essa restauração também é importante pela história de Altamiro. Uma casa histórica, com acervo histórico e que ficará à disposição da comunidade de forma geral”, acrescentou.
Restauração
O processo de restauração da casa onde morou Altamiro de Moura Pacheco começou em 2017. Na época, a empresa Engenho & Arte Produções inscreveu um projeto para restaurar e sanar alguns problemas do local em um edital do Fundo de Arte e Cultura do Estado de Goiás (FAC). O projeto foi aprovado, mas, segundo Giulyane Nogueira, diretora da Engenho & Arte, o recurso para a restauração foi liberado apenas no começo deste ano.
Giulyane explicou que é preciso cumprir alguns protocolos antes de, de fato, iniciar o restauro na prática. “Todas as etapas da restauração são acompanhadas pelo FAC”, disse. “Além disso, a obra de restauro é diferente de outros projetos. É preciso uma documentação detalhada junto à prefeitura. Com a pandemia, foi preciso suspender algumas ações, mas estamos aproveitando esse período para providenciar a autorização para conseguir o alvará e iniciar os trabalhos”, relatou.
“A obra de restauro é uma obra em que precisamos ver os elementos utilizados no bem original. Se for preciso trocar alguma coisa, procuramos repor de igual forma. Essa análise não é possível com uma equipe da construção civil que não tenha capacitação específica pra isso. É uma obra com pessoas mais afuniladas para esse setor”, acrescentou Giulyane.
(Foto: arquivo/ Engenho e Arte)
Segundo o engenheiro responsável pela restauração, Vicente Marcelo Suanno, a Casa foi construída em parâmetros modernos para a época. “Uma casa muito bem feita. O cuidado na execução do imóvel foi primoroso. Ele [Altamiro] pensou em cada detalhe e o resultado disso observamos na conservação do sobrado mesmo depois de tantos anos”, avaliou.
Vicente também ressaltou que obras de restauração como a que será feita na casa que pertenceu a Altamiro precisam de ações específicas. “Não podemos tirar uma fachada e colocar outra. Temos que seguir um modelo para não modificar os detalhes e manter a arquitetura original ao máximo”, explicou ao complementar o que havia sido mencionado por Giulyane. “O objetivo é abrir a porta e imaginar que ele [Altamiro] ainda está vivendo ali”, acrescentou.
Altamiro de Moura Pacheco
Nascido em Bela Vista em 1896, Altamiro Pacheco se formou em Farmácia na cidade de Goiás e depois se formou em Medicina na antiga Faculdade de Medicina Fluminense, em Niterói. Se mudou para Goiânia no final dos anos 30. Em 1941, criou a atual Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura (SGPA) e foi o responsável por realizar a primeira Exposição Agropecuária de Goiânia.
Coordenador do projeto de restauração e historiador, Wolney Unes ressaltou que Altamiro teve uma ligação muito forte com o setor agropecuário. “Ele doou as terras para a construção do Parque de Exposições Agropecuárias, na capital, foi o primeiro presidente da SGPA e trabalhou muito para montar um sistema de melhoramento genético”, relatou. “Depois disso, ele fundou o Banco Agropecuário de Goiás, que foi vendido nos anos 80”, acrescentou.
Altamiro de Moura Pacheco também doou a área para construção do Setor Santa Genoveva e do Aeroporto de Goiânia. A única contrapartida pela doação é que tanto o setor quanto outras obras erguidas no local fossem, de alguma forma, uma homenagem à sua mãe. “A mãe do Altamiro se chamava Genoveva e ele tinha uma relação de muita admiração por ela. Na doação, ele pedia que o que fosse instalado naquela área recebesse o nome de Santa Genoveva”, explicou Wolney Unes.
O historiador relatou uma injustiça cometida com a memória de Altamiro. Segundo Wolney, a Universidade Federal de Goiás (UFG) foi criada a partir de outras instituições que já existiam: Conservatório Goiano de Música, Faculdade de Direito, Faculdade de Farmácia e Faculdade de Medicina, sendo que essa última teve papel fundamental de Altamiro em sua fundação.
“Elas já existiam como faculdades isoladas e se juntaram para formar a UFG. A história oficial sempre conta que a Faculdade de Medicina foi fundada pelo médico Francisco Ludovico e Colemar Natal e Silva, mas o nome de Altamiro não é registrado como um dos fundadores. Altamiro foi eleito presidente da Sociedade da Faculdade de Medicina, que tinha a atribuição de montar a instituição. Ele foi o responsável por conversar com Juscelino Kubitschek e conseguir a assinatura para funcionar a Faculdade de Medicina. No entanto, a história não o registra como deveria”, lembrou.
Construção de Brasília
Por conta do envolvimento que teve com política, Altamiro teve papel fundamental na criação do Distrito Federal (DF). Nos anos 50, o então governador de Goiás, Juca Ludovico, convidou Altamiro para presidir a Comissão de Cooperação para Mudança da Capital Federal. Na época, a escolha da nova capital estava entre terras no Triângulo Mineiro e Goiás. Altamiro foi o responsável pela desapropriação de terras na área que deu espaço ao DF. “Ele comprou cerca de 100 fazendas para o Estado de Goiás. Ele foi o cara que arregaçou as mangas quando o assunto é a criação do DF”, concluiu o prof. Wolney Unes ao destacar, mais uma vez, a importância de Altamiro na história.