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Wolney Unes
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Outra do português - Uma coluna que analisa linguagem e ideias / outradoportugues@gmail.com

Pela cidade

Chamem o síndico!

| 23.06.16 - 18:56
Goiânia - Um desembargador em Goiânia decidiu que condomínios fechados não podem exigir carteira nacional de habilitação de visitantes. A decisão foi divulgada depois de uma polêmica envolvendo um morador e funcionários de um condomínio de luxo de Goiânia, mas a situação não é isolada e as polêmicas são constantes. 
 
Há quem diga que por se tratar de propriedade privada, pode-se fazer a exigência que bem entenda. Afinal, estou em minha casa. Faz sentido, e um síndico poderia votar com seus condôminos uma exigência de entrada que inclui a apresentação de carteira de sócio do Jóquei Clube ou do passaporte com visto válido para a Tailândia. O mal-estar ao barrar a sogra na portaria por não estar em dia com a hípica ficaria, é claro, por conta de cada condômino.
 
Muitos condôminos gostam da iniciativa de solicitar carteira de motorista de visitantes, pois alegam que se trata de uma segurança a mais para moradores e suas crianças. Esquecem-se apenas que também há moradores que andam de carro e que não há ninguém a fiscalizar-lhes a validade da carteira de habilitação. Não convém incorrer na ingenuidade de pensar que muros de um condomínio teriam o condão de manter do outro lado todo o mal. Afora isso, estatísticas de acidentes e atropelamentos atribuem mais fatalidades a bêbados ao volante e à desobediência a normas: atropelamento por falta de habilitação é raridade. A fazer valer portanto o raciocínio de mais segurança, porteiros de condomínio precisariam estar munidos de bafômetros e andar atrás da carteira de motorista de todo mundo dentro dos muros.
 
E aqui chegamos a um ponto importante: posso atribuir o poder de fiscalização a um porteiro? Conhecido como poder de polícia, a violência decorrente do controle e da fiscalização é atributo exclusivo de agentes públicos – em democracias, é claro. Essa exclusividade é vista como uma conquista dos Estados modernos, bem diferente do poder que tinham aqueles antigos coronéis de cobrar, punir e até aplicar a pena capital na região sob seu domínio. Um jurista dá um exemplo brilhante: um condomínio pode decidir que só deixa entrar quem oferecer um saco de balinhas azuis. Sem problemas! Ganhar um saco de balinhas azuis é bem diferente de solicitar a apresentação do IPVA pago dos últimos três anos – ou do passaporte com o tal visto: essas, sim, atribuições do agente público com o poder de polícia.
 
Finalmente, não custa lembrar que muita gente morreu no final do século 18 na França para que aceitássemos o mantra de que “somos todos iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.” A frase francesa ganhou o mundo e está até na nossa Constituição, que se ocupa em detalhar ainda um pouco mais, dizendo que nenhum de nós “será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Pois desconhece-se que um síndico tenha poder de promulgar leis.
 
Qualidade urbana
Longe de ser banal, o caso é mais um capítulo no longo processo de divisão da sociedade brasileira: os intramuros e o restante dos brasileiros. Urbanistas nacionais e estrangeiros reconhecem que áreas muradas no interior das cidades criam rupturas no tecido urbano, diminuindo a qualidade do trânsito e dos espaços públicos ao redor de seus muros.
 
Deve ter algum fundo de verdade nessa constatação, já que cidades com boa fama de qualidade de vida nunca têm condomínios fechados. Pelo contrário: ficam todos na rua.
 
Outra do português
Devo dizer “quinhentas milhões e cem mil pessoas“ ou “quinhentos milhões e cem mil pessoas”? Existe uma milhão?
Aparecido Eterno do Carmo – aparecidoeterno@hotmail.com
 
Os milhões
Quando juntamos vários substantivos, então devemos decidir qual prevalecerá: um milhão de pessoas da Bahia de Todos os Santos. Tenho pelo menos quatro substantivos, milhão, Bahia, pessoas e santos. Como nas comitivas, o mais importante é o que vem na frente, o “milhão”, é o que a gramática chama de núcleo do sujeito.
 
Masculinas
Mil e milhão são palavras masculinas. Como milhão é o núcleo do sujeito, é com ela que todo o mais vai concordar, “quinhentos milhões”. Não custa lembrar que, ao passo que “milhão” forma o plural normalmente, “milhões”, “mil” só tem essa forma: um mil, dois mil.

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