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Sobre o Colunista
José Abrão
José Abrão é jornalista e mestre em Performances Culturais pela Faculdade de Ciências Sociais da UFG / atendimento@aredacao.com.br
Adrien Brody e Guy Pearce (Foto: divulgação)Entre os filmes indicados ao Oscar de Melhor Filme, O Brutalista certamente tem a melhor cena de abertura. Portanto, me permita um pequeno spoiler. Nosso protagonista acorda no porão de um navio lotado de imigrantes enquanto uma carta em húngaro é lida em off. A trilha sonora épica começa a tocar ao fundo, suave, enquanto ele se aperta e empurra em direção ao convés, atravessando corredores escuros e lotados de gente. Enfim, ele emerge ao sol e sorri. A carta termina, a música atinge seu ápice, a câmera se vira e vemos a Estátua da Liberdade, mas ela está invertida, de cabeça para baixo.
Estrelado por Adrien Brody, Felicity Jones e Guy Pearce, este é, sem dúvida, o maior e mais ambicioso filme da carreira do diretor Brady Corbet até o momento. A trama acompanha László Tóth (Brody, incrível), um arquiteto judeu-húngaro e sobrevivente do Holocausto que emigra para os EUA após a guerra. Lá, ele se envolve em um projeto insano e monumental idealizado pelo magnata Van Buren (Pearce, fenomenal). Ao longo dos anos, descobre que o sonho americano não passa de uma promessa vazia.
Essa é uma sinopse crua, simplória e que não faz jus à magnitude do filme. Dividido em duas partes bem distintas, o longa começa com as aparências de um melodrama clássico sobre imigração: estrangeiros sofridos e oprimidos chegam à América apenas para vivenciar uma inacreditável história de superação e sucesso pessoal, graças às oportunidades únicas da terra dos bravos e dos livres. A segunda metade subverte essa expectativa, revelando que o lado sombrio dessa terra de oportunidades — evidenciado em críticas contemporâneas sobre a crise dos imigrantes e refugiados — sempre esteve lá: forasteiros não são bem-vindos, pessoas não brancas não são bem-vindas. O estrangeiro é o outro, e o outro é indesejado.
Parece um Oscar bait, um dramalhão em que o pobre imigrante sofre para o nosso deleite, mas Corbet não filma sua história assim. László é um homem comum e falho, Muito falho. Ele carrega traumas profundos e feridas abertas à flor da pele. É mulherengo, alcoólatra, meio narcisista e de pavio curto e, ao chegar aos EUA, ainda desenvolve um terrível vício em morfina. Ao mesmo tempo, é um gênio em sua área, um pensador progressista, um fiel devoto e um marido amoroso.
Dessa forma, Corbet evita armadilhas narrativas típicas e desafia a audiência ao apresentar algo que faz cada vez mais falta nos filmes atuais: nuance. Para isso, ele mergulha na escatologia, na escuridão da alma e no ordinário da vida cotidiana. Há sexo, há drogas, há raiva, há ressentimento, mas também há amor, vitória e perseverança.
Esmiuçar o filme ainda mais seria revelar demais sobre essa obra que tem muito a dizer sobre diversos assuntos. Finalizo destacando novamente o elenco brilhante. Pearce, Brody e Jones, que vive Erzsébet, esposa de László, entregam performances viscerais e críveis, adicionando algo profundamente vivido à história. É estranho terminar o filme e não ver um aviso de que esses personagens são reais, porque, em muitos aspectos, eles são.