De fato, eu conheci o violinista Edilberto da Veiga Jardim no finalzinho da década de 1970. Eu era apenas uma criança começando meus estudos musicais no primeiro dos Cursos de Pré-Graduação (Preliminar, Fundamental e Técnico) oferecidos pela UFG. No entanto, lembro-me que, à época, além de suas atividades na área de saúde, por incontáveis ocasiões, o odontólogo Edilberto colocou suas habilidades musicais à disposição do antigo Instituto de Artes da UFG.
Na sequência desse texto - retirado da citada entrevista - optei por registrar algumas das histórias contadas por “Seu Betinho”, como é carinhosamente chamado o Dr. Edilberto da Veiga Jardim Filho, mais especificamente aquelas ocorridas nas décadas de 1930, 1940 e 1950.
Dr. Edilberto da Veiga Jardim Filho e Othaniel Alcântara Jr.
(Foto: 01/06/2016)
Othaniel Alcântara: O senhor nasceu na Cidade de Goiás (Vila Boa), não foi?
Edilberto da Veiga Jardim Filho: Nasci na Cidade de Goiás, no dia 12 de novembro de 1932, na casa nº 01 da Rua Dr. Corumbá. A minha mãe, Maria Edila Curado Jardim, nasceu em Corumbá de Goiás, em 1902 [faleceu em 1966]. O meu pai, Edilberto da Veiga Jardim, neto do artista Veiga Valle [escultor e dourador], nasceu em Goiás, em 1887 [faleceu em 1970]. Meu pai era médico e também foi Prefeito da antiga capital.
José Joaquim da Veiga Valle
(Arraial da Meia Ponte, atual Pirenópolis, 1806 - Goiás, 1874)
Fonte: guiadasartes.com.br
Othaniel: Quantos irmãos?
Edilberto: Bom, meus pais tiveram oito filhos, sendo quatro homens e quatro mulheres. Se bem que nasceu mais uma filha depois que eu nasci, ela se chamava Maria José. Mas ela morreu novinha, com uns oito meses, vitimada por meningite. Papai ficou muito chateado, pois, como médico, não pôde fazer nada. Antigamente, não havia muitas condições (...).
Dos nove filhos, a mais velha nasceu em Corumbá de Goiás. O nome de batismo dela é Guiomar da Veiga Jardim. Ela tornou-se religiosa, da Ordem Dominicana. Fez o noviciado na França e trocou o nome dela para Edilberta, Madre Edilberta. Os demais filhos nasceram em Goiás, sete deles naquela casa da Rua Dr. Corumbá. São eles:
• Francisca da Veiga Jardim (“Titinha”), que é viúva do Dr. Celso Fleury (Desembargador);
• Alpheu da Veiga Jardim2, que foi dentista. O nome da sua esposa: Solomny Lobo Jardim;
• Ana de Lourdes da Veiga Jardim, que se casou com Antônio Gilberto Rodarte;
• Lauro da Veiga Jardim, que é médico. Ele se casou com uma prima em 2º grau, a Eurivane Veiga Jardim;
• Edilberto da Veiga Jardim Filho (odontólogo);
• Maria José da Veiga Jardim. Como já disse, ela faleceu com menos de um ano de idade;
• Dr. José Maria da Veiga Jardim, casado com Solange de Almeida, filha do Dr. Solon de Almeida.
Por fim, veio a Maria Elizete da Veiga Jardim Craveiro, que nasceu no Palácio Conde dos Arcos, em Goiás. Naquela ocasião, como meu pai era o Prefeito e a nossa casa estava passando por uma reforma, nós moramos no Palácio durante alguns meses. O marido da Elizete -Wilson Passos Craveiro - era primo do
Dr. Fernando Passos Cupertino de Barros.
Foto recente da região central da Cidade de Goiás (Vila Boa)
Em destaque: Residência do casal Dr. Edilberto (pai) e Dona Edila
(Arquivo do casal Edilberto e Heloísa)
Othaniel: Quando o Dr. Edilberto “Pai” foi Prefeito de Goiás?
Edilberto: O papai foi prefeito lá em Goiás, de 1938 a 1940, mais ou menos. Ele foi prefeito mais por insistência do Dr. Pedro Ludovico [Teixeira]. O papai estudou [Medicina] no Rio de Janeiro. O Dr. Pedro e seu irmão João Teixeira estudaram por lá também. Aliás, “todo” o pessoal de Goiás ia estudar no Rio de Janeiro, que era a Capital Federal (...). Enfim, logo após o término do mandato do meu pai como prefeito, ele já estava pensado em mudar para Goiânia. Havia até comprado um lote aqui, na Rua 4 [Centro].
Othaniel: Então, o pai do senhor apoiou a ideia da transferência da Capital.
Edilberto: Ah, sem dúvida! Ele não tinha nenhuma restrição. Claro, o pessoal que ficou em Goiás sentiu demais.
Dona Maria Edila Curado Jardim (1902-1966)
Dr. Edilberto da Veiga Jardim (1887-1970)
Fonte: Perfil do facebook do historiador Bento Fleury
Othaniel: É, de imediato, instituições como, por exemplo, o Lyceu - já em 1937 -, vieram para Goiânia.
Edilberto: Foi tudo! Tirou tudo de Goiás. Então, eles ficaram grilados (...). Mas, já que você mencionou o
Lyceu, o maior orgulho que o papai tinha - e que ele sempre falava - foi de ter conseguido autorização do Dr. Pedro [Ludovico] para criar uma sucursal do [rebatizado] Liceu de Goiânia, para a Cidade de Goiás. Quer dizer: voltou pra lá, pelo menos uma parte. Acho que isso se deu em 1939 ou 1940. Tanto que alguns professores, dentre aqueles que vieram de lá, acabaram voltando pra Goiás, como no caso do Alcides Jubé. O Alcides Jubé era casado com uma prima do papai, a Dona Zefinha [Josefina da Veiga Jardim].
Othaniel: Em que ano, exatamente, a família se mudou para Goiânia?
Edilberto: Nós viemos pra cá logo no começo de 1941. Eu sou de 1932; então, estava com uns oito anos de idade. Meu pai tinha um “fordinho” e não sei como é que cabia tanta gente naquele carro, vindo de Goiás pra cá, naquela estrada de terra. Você imagina, era meu pai, minha mãe, oito filhos [risos], e mais uma irmã de criação que ajudou a nos criar. E, ainda, malas, cachorro no “estribo” do carro [risos]. Não dá pra entender. Até hoje, eu fico pensando: num fordinho daquele... estrada de terra, Nossa Senhora! [Risos].
Como a nossa casa não estava prontinha ainda, nós ficamos algum tempo na casa da minha avó, mãe da minha mãe, que era lá em Campinas [Cidade que se tornou Bairro de Goiânia], na Avenida Rio Grande do Sul, perto do Colégio Santa Clara. Não sei como é que coube tanta gente naquela casa [risos]. Mas, logo viemos para Goiânia.
Othaniel: À época, o Dr. Edilberto tinha algum cargo público?
Edilberto: Quando viemos para Goiânia, o papai não tinha emprego fixo. Então, devagarinho ele foi se ajeitando. Foi médico do Batalhão da Polícia, trabalhou no IAPI [um instituto de aposentados e pensionistas daquele tempo]. Ele também atendia na Santa Casa de Misericórdia e tinha um consultório em casa. Minha mãe nunca teve uma profissão. Porém, como era muito habilidosa, fazia flores para casamentos e outros eventos. A turma se virava.
Othaniel: O senhor começou a estudar violino em Goiás ou em Goiânia?
Edilberto: Foi em Goiânia. Olha, lá em casa, desde quando morávamos em Goiás, sempre teve música. Lá, tínhamos um piano e um violino. Esse violino tinha sido do meu irmão Alpheu. Ele havia começado a estudar um pouquinho lá em Goiás, com a Dona Adelaide. Mas logo ele parou. E eu, naqueles anos de Goiás, não ligava muito pra música.
Em Goiânia, sei que meu irmão Lauro teve aulas de piano com o professor Érico Pieper, por pouco tempo, lá em casa. Além disso, a minha irmã mais velha, a Francisca (“Titinha”), passou a ter aulas de piano com a Dona Nair de Moraes. Minha irmã também tinha algumas alunas. Assim, eu estava sempre em contato com a música. Mas, pra falar a verdade, eu não sei o que é que gerou o “estalo”. Acho que o Professor Costinha costumava ir até a nossa residência para afinar o piano e, possivelmente, alguém deve ter sugerido que eu fizesse aula de violino com ele. Não me lembro!
Othaniel: Isso foi em que ano?
Edilberto: Tenho anotado! Minha primeira aula aconteceu no dia 12 de janeiro de 1946. Inicialmente, o Professor Costinha ia lá em casa para me dar aulas. Depois é que eu passei a ir até a casa dele.
Othaniel: E o primeiro recital?
Edilberto: O Professor Costinha tinha um conjuntinho de alunos. Minha primeira participação nesse grupo aconteceu na Primeira Igreja Batista. No piano, a Adélia, acho que Adélia Gomes, porque o primeiro violino era o Denizar Gomes, irmão dela. O Professor Costinha, naturalmente, regia a turma. Ele sempre fazia os arranjos musicais de acordo com as possibilidades de cada executante. A gente tocava em pé mesmo (...). Bom, essa foi a primeira apresentação que tive no Conjunto de Cordas do Professor Costinha.
Othaniel: E quando foi o primeiro recital do senhor, como solista?
Edilberto: Embora o programa não traga o registro do ano, acho que foi em outubro de 1946. Foi realizado no Departamento Estadual de Cultura, no Museu Estadual de Goiás [atual
Museu Zoroastro Artiaga], na Praça Cívica. Era um recital de alunos dos professores Crundwald Costa (Costinha) e Érico Pieper. Naquele dia, toquei uma peça chamada
Serenata de Toseli. Lembro-me de que toquei em pé e tremia muito. Minhas calças balançavam do tanto que eu tremia [risos]. De emoção... sei lá!
Edilberto da Veiga Jardim Filho e Dona Maria Edila Curado Jardim
(Goiânia, 28/04/1950)
(Arquivo do casal Edilberto e Heloísa)
Othaniel: O senhor tocou na Orquestra da Sociedade Pró-Arte, regida pelo Érico Pieper?
Edilberto: Sim. O Professor Costinha era o spalla. Tal como disse, o Professor Érico Pieper frequentava a minha casa, na Rua 4 [Centro], pois era professor de piano do meu irmão Lauro. Um certo dia, acho que em 1948, ele perguntou: “Escuta, você não quer tocar na Orquestra da Pró-Arte?” Eu respondi: “Claro! Vou!” [Risos]. Ainda sabia pouca coisa (...).
No dia marcado, cheguei para o meu primeiro ensaio, no Museu Estadual. Lembro-me de que eu estava sentado lá atrás. Meu Deus, eu não conseguia ler quase nada! Em alguns momentos, como estava perdido, eu perguntava mais ou menos assim ao meu colega de estante (não me lembro o nome dele): Fulano, onde é que está, hein? Então, ele dizia: “Está aqui, ó!”. Mas ele passava a ponta do arco na parte inteira [risos]. Ou seja, ele também estava perdido [risos]. Claro, depois levei as partes [musicais] para estudar em casa. E aí, sim (...)!
Érico Pieper
(Final dos anos 1940 ou década de 1950)
Othaniel: A Orquestra do Costinha [década de 1950] se apresentava com qual frequência?
Edilberto: Eram poucos os concertos com a orquestra inteira, umas duas apresentações por ano. Nós cobrávamos uma certa quantia pelos ingressos para pagar as despesas e, ainda, para doações a algumas instituições, como no caso da Santa Casa.
Tem até uma história engraçada daquele tempo. O contrabaixo do conjunto era do Professor Costinha. Teve uma época que eu e um colega, não me lembro quem, por vezes ficávamos responsáveis por buscar o contrabaixo, de bicicleta, na casa dele, na Rua 55 [Centro]. Então, eu pegava o instrumento de um lado [ex.: pela voluta] e meu colega do outro [ex.: espigão] e seguíamos, empurrando a bicicleta até o Teatro Goiânia [risos].
Heloísa: Othaniel, eles [os meninos] subiam em árvores - da espécie Flamboyant - para pegar flores e enfeitar o teatro [risos].
Edilberto: Era tudo no amadorismo (...).
Othaniel: Quando teve início a história de vocês?
Edilberto: Foi nos ensaios da “Orquestra”. Eu tinha uma “quedinha” por ela, mas não tinha coragem de chegar [risos]. Foi indo... foi indo... [Risos]. Demorou! Mas foi a música que nos uniu! (...).
Heloísa: Meu pai era bravo! (...). Naquele tempo, por exemplo, nós não podíamos ir à segunda sessão no cinema.
Edilberto: Mas, apesar disso tudo, eu não saía da casa dela [risos]. Qualquer coisinha eu ia lá: “Ah, e essa música aqui (...)”. Teve uma época em que nós tocamos na Rádio Brasil Central. O programa se chamava: “Serenata”, organizado por Geraldo Amaral e Professor Costinha. Era às quartas-feiras, às nove e meia da noite. Eu saía da casa do Professor Costinha, depois da minha aula de violino e, com ele, subíamos - de bicicleta -, é claro, até a casa dela [Heloísa] e ensaiávamos a música que seria tocada no programa daquele dia. Só depois, seguíamos para a Rádio Brasil Central (...).
Três integrantes da Orquestra do Prof. Costinha (1950)
Heloísa Barra (pianista), Rosa Meneses e Geny Jonas (violinistas)
Fonte: Perfil do facebook de Edilberto da Veiga Jardim Filho
Othaniel: O Seu Betinho acabou não me respondendo quando começou o namoro.
Edilberto: Ah, foi mais tarde [pensativo]. Foi uns anos depois, não me lembro! Foi mais uns três ou quatro anos enrolando [risos].
Heloísa: Em 1958, nós nos casamos [cerimônia realizada na Igreja Ateneu Dom Bosco]. Nós ficamos enrolando.
Edilberto: Eu era quem ficava enrolando, né? [Risos]. Sem coragem de chegar [risos].
Heloísa: O Betinho foi meu único namorado.
Edilberto da Veiga Jardim Filho (1953)
Local: Estúdio do HB (Haroutim Berberian), Goiânia.
(Arquivo do casal Edilberto e Heloísa)
Othaniel: E quem organizou a parte musical do casamento de vocês?
Edilberto: Ele compôs a Marcha Nupcial pra nós. Ele tocou lá em cima, lá no coro [galeria]. Foi ele o Dimitry [violinista], o Professor Costinha (...). Aquela turma de instrumentistas da Orquestra, os mais chegados, e a “Norica” [Dona Honorina: cantora, irmã gêmea da Dona Heloísa].
Othaniel: Quantos filhos?
Edilberto: Três filhos. A Ângela, a mais velha, cantora: Ângela Barra Jardim; o Roberto Barra da Veiga Jardim e o Eduardo Barra da Veiga Jardim.
Edilberto da Veiga Jardim Filho e Heloísa Barra Jardim
(Belo Horizonte, 30/07/1958)
(Arquivo do casal Betinho e Heloísa)
Othaniel: Se eu não estiver enganado, certa vez, o senhor me contou que o Professor Costinha e a Dona Leda foram padrinhos de casamento de vocês. É isso mesmo?
Edilberto: No Civil. Na Igreja não. Por outro lado, eu e Heloísa fomos padrinhos [batismo] do Antônio José [Toninho], filho deles. Mas, a gente não era nem namorados ainda, viu? Tanto é que a turma falava assim: vocês foram padrinhos juntos, então não vai dar certo não [risos].
Data da foto: 29/03/1953
Dia do Batizado do Antônio José, filho do Prof. Costinha
Local: em frente ao antigo Templo da Igreja do Sagrado Coração de Maria
Da esquerda para a direita:
Dr. Edilberto, Dona Heloísa (segurando o “Toninho”), Prof. Crundwald Costa e Dona Leda
Crianças: Maria das Graças e Mariângela (filhas do casal Costa)
(Arquivo do casal Edilberto e Heloísa)
Othaniel: O senhor chegou a conhecer o violinista e professor Joaquim Édison de Camargo?
Edilberto: Sim. Conheci aqui em Goiânia. Ele era professor do
Lyceu de Goiás. Quando a Escola foi transferida para Goiânia [1937], ele veio também. Na realidade, o Joaquim Édison era casado com a Elcima Veiga Camargo, filha de um tio meu, o “ti-Quinquim”. O casal morava perto da Catedral, na Rua 19. A gente sempre via e ouvia o Joaquim Édison tocando - com bastante frequência - na antiga Igreja Nossa Senhora Auxiliadora, atrás da Catedral, no terreno onde, posteriormente, foi construído o Edifício Dom Abel.
Uma curiosidade: ele tinha uma respiração muito forte! Não sei... Era provável que ele tivesse um desvio de septo. Então, eu e uns colegas sempre falávamos: Olha, ele tá fungando! [Risos]. Coisa de criança! Ele tocava bem e acho que nunca deixou de lecionar. É importante dizer que o Joaquim Édison teve um papel importante demais na vida da Heloísa e da Honorina. [Esse assunto foi abordado na Coluna passada:
“Heloísa Barra Jardim: Sua trajetória artística nos anos 1940 e 1950 - “Meu amigo era o piano! ”].
Joaquim Edison de Camargo (1900-1996)
Fonte: Livro A Música em Goiás (1981)
Belkiss Spencière Carneiro de Mendonça
Othaniel: Sei que, pelo menos uma filha do Joaquim Édison foi cantora: a Ely Camargo.
Edilberto: Sim, a Ely Camargo. Ela fazia o Curso de Farmácia na época em que eu fazia Odontologia.
Heloísa: Ela tinha uma voz muito bonita
Othaniel: Eu vi umas gravações na internet.
Edilberto: Antes era mais bonita!
Heloísa: Antes, na Igreja, a voz dela era linda! Nós tínhamos um grupo muito bonito dentro da Igreja. Minha irmã Honorina (“Norica”) fez um dueto com ela. Gravaram um disco. Chamava-se Duo “As Goianinhas”. Depois, a Norica foi estudar canto no Rio de Janeiro e parou de mexer com música popular (...).
Duo "As Goianinhas": Ely Camargo e Honorina Barra
Fonte: Perfil do facebook de Edilberto da Veiga Jardim Filho
Edilberto: O Joaquim Édison teve pelo menos mais quatro filhos. 1) Elcy Camargo Romero. A Elcy tocava piano, mas também foi professora de Educação Física no Liceu de Goiânia, ao lado da Dona Liz Esteves Pereira; 2) Elson Camargo - que morreu acidentado no comecinho de Brasília; 3) Elman - que foi casado com a Isis Silva Camargo. Ela tocava piano; 4) Elvane Camargo, que ainda é viva. Ela mora em Brasília.
Othaniel: E, de repente, o senhor foi fazer o Curso de Odontologia. Como foi essa história?
Edilberto: Quando terminei o Curso Científico, tinha que fazer o “Tiro de Guerra” (Serviço Militar). À época, eu pretendia dar sequência aos meus estudos no Rio de Janeiro. A Dona Ambrosina, esposa do Coimbra Bueno3, queria até me dar uma bolsa pra eu estudar fora. Acontece que eu tive de fazer o “Tiro de Guerra” primeiro. Como eu tinha que ficar um ano aqui eu resolvi começar a fazer o Curso de Odontologia, porque meu irmão Alpheu já era dentista. Então pensei: “Quem sabe eu não faço Odontologia? Vamos ver o que vai dar.” Enfim, comecei! Fiz em 1951, 52 e 53 na nossa Faculdade, aqui em Goiânia que, depois [em 1960], passou a integrar a Universidade Federal de Goiás. O curso antigamente durava apenas três anos.
Othaniel: E como ficou o violino durante o Curso de Odontologia?
Edilberto: Olha, na verdade, eu nunca larguei o violino. Eu já estava cursando Odontologia e um certo dia, a Dona Belkiss foi até lá em casa falar com a minha mãe ou com o meu pai e disse mais ou menos assim: Escuta, eu estou abrindo uma turma de Teoria [Musical], será que o Betinho que ir [lá]? Eu respondi: “Opa, quero demais! ”
Na turma de Música tinha eu, a Dona Fifia e outras alunas. Eu, muitas vezes, eu saía da Faculdade, passava lá para ter as aulas de teoria. E era dureza, eles faziam sabatina! [Risos]. Deram uma orientação boa pra gente. E, muitas vezes, eu ia estudar com a Fifia, na casa dela. Ela já era casada (...).
Outra coisa que eu me lembro sobre aqueles anos: eu paguei o Curso de Odontologia com as minhas atividades como músico. Tinha as aulas particulares de violino que eu dava, pois, antes do Curso de Odontologia integrar a Universidade Federal de Goiás [1960], a Faculdade era particular. Além disso, eu recebia para tocar em eventos. O Professor Costinha me chamava muito para tocar em casamentos etc.
Edilberto: Foi quando ela chegou do Rio de Janeiro [ao terminar o Curso de Piano na Escola Nacional, em dezembro de 1945] e deu um recital no Cine Teatro Goiânia. O doutor Simão [futuro marido da Dona Belkiss - casamento: 09/12/1946] era médico, colega do meu pai. Ele atendia no Hospital São Lucas e na Santa Casa. Depois, de vez em quando, a gente ia tocar na casa dela. Um contato maior aconteceu já no Conservatório de Música da UFG, local em que a Heloísa estudou piano e, mais tarde, passou a trabalhar [a partir de 1960].
Othaniel: Por fim, a Odontologia foi escolhida como atividade profissional principal, seja em atendimento, no consultório, ou como docente na Universidade Federal de Goiás (UFG). Também sei que o senhor foi professor do meu pai em Anápolis, na década de 1970.
Edilberto: Em Goiânia, no Curso de Odontologia, eu comecei a lecionar no dia 1º de maio de 1960. Ainda tenho a portaria me nomeando como Instrutor de Ensino na Faculdade de Odontologia. Isso foi um pouquinho antes da criação da UFG.
Em Anápolis, lecionei por pouco tempo. O Diretor lá da Faculdade - o Pedro -, conhecia bem a turma de Goiânia, pois tinha feito o curso aqui. Certa vez, ele me disse mais ou menos assim: Olha, estou precisando de gente pra Escola, gente com diploma registrado. Fomos eu, o Lamar, o Antônio Sílvio Rabelo, a Maria Célia (...). Eu ensinei “Materiais Dentários” lá. Eu ia uma vez por semana (...). Aquilo, por pouco tempo: um ou dois anos.
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O violinista Edilberto da Veiga Jardim Filho sempre transitou pelo universo musical goiano. Foi integrante de um longevo Quarteto de Cordas, fundado no início da década de 1950. Aliás, o Maestro Jean Douliez foi violoncelista desse Quarteto por algum tempo, entre c. 1955 e 1965, ano de seu retorno à Bélgica. Mais tarde, já nos anos 1970, surgiu o Trio do Instituto de Artes da UFG, formado por Edilbeto, Heloísa e o violoncelista Jorge Armando Nunes. Por falta de espaço nesta Coluna, esses assuntos ficarão para uma próxima oportunidade.