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Wolney Unes
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Outra do português - Uma coluna que analisa linguagem e ideias / outradoportugues@gmail.com

Cult

A loira e a próstata

Um Brasil de iguais é ainda um desafio | 28.05.12 - 18:37
O Ministério Público Federal da Bahia entrou, no dia 23 passado, com representação contra uma jornalista baiana. O motivo foi uma entrevista feita pela repórter com um jovem acusado de estupro em Salvador, na Bahia, transmitida pela TV. Assista ao vídeo:


Na mesma semana, surgiu no Facebook uma página com título sugestivo: “Bandeirantes, faça um favor aos brasileiros”, com o pedido de demissão da jornalista. Apenas quatro dias depois da representação do MPF, já havia na internet mais de 300 páginas sobre o assunto. A página do Facebook já tinha mais de 2,3 mil curtições.

Caso aparentemente corriqueiro, a repórter entrevistava na TV um acusado de estupro. O acusado era um jovem malvestido, preto, aparentemente pobre, de fala hesitante. A jornalista, loira para padrões brasileiros, tinha o olhar e a voz firmes.

A jornalista fez as perguntas de praxe e o acusado negou. Negou o estupro, mas confirmou o assalto. Num dado momento, o jovem acusado diz que aceita fazer um exame para comprovar sua inocência, um “exame de estropa (sic)”. A jornalista faz troça da pronúncia trôpega, pede para ele repetir e o entrevistado acaba se confundindo ainda mais, “estropa, estropo, num sei, não”. Ela então insiste, sempre firme, “exame de próstata?” Insiste uma, duas, três vezes. O jovem aceita a proposta da loira e confirma, tentando repetir balbuciante a expressão.

É a partir deste momento que a jornalista abandona sua entrevista e passa a brincar com o rapaz detido. Diverte-se, ri bastante da própria piada, como que admirando sua inteligência, deliciando-se com sua superioridade: “Você quer fazer exame de próstata? Você gosta?”

Desiguais
Jornalistas de todo o País chatearam-se com a falta de profissionalismo da colega. A emissora de TV diz que vai demiti-la. Afora o escorregão profissional, interessa também o choque entre duas poderosas forças brasileiras.

De um lado, o Brasil loiro, bem-criado, membro da classe média que mais cresce no Ocidente. De outro lado, um representante da antiga escravidão, ainda hoje pobre e desfavorecido. Ainda hoje essas duas forças se chocam com violência.

O Brasil classe A sente-se à vontade para fazer o que bem entende quando mergulha no fundo do poço social. Permanece viva na memória a livre permissão de dispor de serviçais, de pobres e pretos. Fosse o entrevistado membro da mesma classe social da jornalista, articulado e bem falante, dificilmente a jornalista teria se sentido tão à vontade para tripudiar.

No Brasil de cotas e bolsas sociais, de crescimento econômico e potência emergente, o fato infelizmente evidencia o longo caminho que ainda temos pela frente. Boas notícias econômicas à parte, tornarmo-nos um país de iguais é ainda um desafio.

Comentários

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  • 28.09.2012 23:01 Jose murilo soares de castro

    Parabens meu caro e velho amigo, continua como sempre com seu humor sarcasticamente britanico.

  • 30.07.2012 02:48 Jorgiany

    Essa eu não tinha visto! ótimo texto wolney. lamentável que o dinheiro do papai não compre cultura não é mesmo?! .

  • 14.06.2012 05:24 VaUwSvFcg

    Pouco ou nada me ocorre para acestcenrar. Temos ide9ias bem parecidas a respeito e, enquanto lia seu post, fiquei pensando em como explicar tudo isso para quem ainda este1 sendo apresentado e0 internet, ou pior, para quem acha que je1 entendeu que a internet e9 um folder ou um cate1logo de produtos . Sempre me deparo com essa dificuldade e normalmente opto por causar uma ruptura dizendo que a internet e9 parte de um passo evolutivo e que a forma do nosso ce9rebro funcionar este1 mudando junto com ela, que veremos modificae7f5es nas ligae7f5es sine1pticas como je1 vimos quando surgiu a fala. Outras vezes opto por uma abordagem mais suave mostrando apenas que a internet e9 fruto de uma necessidade de inverter a estrutura de comunicae7e3o humana de poucos para muitos para de muitos para muitos e mostrar como isso tambe9m muda a nossa necessidade de aprender a selecionar informae7f5es e trocar a atene7e3o concentrada para uma atene7e3o mfaltipla que no entanto ne3o e9 dispersa.

  • 31.05.2012 07:59 Cejana

    Parabéns, wolney! ótimo comentário, márcia fabiana!.

  • 31.05.2012 12:24 Thais Fleury

    Pra mim, quem estuprou alguém, nesse caso, foi a jornalista. Se é que podemos chamá-la de tal. Ótimo texto, wolney. Parabéns!.

  • 30.05.2012 10:57 Luisa Daher

    É muito, muito bom poder te ler por aqui, brimo! excelente texto, não poderia concordar mais com você.

  • 29.05.2012 03:23 75%Jesus

    Discordo que esta jornalista loira seja um representante do brasil classe a, bem-criado. Apesar de ter tido estudo, ela pertence a turma dos mal-criados e sem cultura.

  • 29.05.2012 02:19 Bia Tahan

    Essa mulher é um perversa.

  • 28.05.2012 08:23 Marcia Fabiana

    Ainda bem que existem as cotas e bolsas sociais para quem não tem oportunidade. Por que eu, negra e não preta, sei bem o que é ser única na aula de balé clássico, inglês, escolar particular e da turma de uma faculdade federal. A diferença não acaba por aí! mesmo tendo a sorte de ter pais que puderam me oferecer uma boa educação, naturalmente sempre fui apontada como única. fato até engraçado que me diverti muito no período das aulas de pós-graduação. Não sou de família rica, muito menos de pobre, sou classe média como tantos outros. Porém, quando se falava de assunto de dinheiro e de quem tem pouca condições financeiras, muitos colegas sempre se dirigiam a mim, como se eu fosse a "mais pobrezinha da turma"- " ai, márcia , pra quem não tem condição disso ou daquilo deve ser difícil, né?". Ai de mim se não me impusesse. Porque mesmo estudando, tendo educação, diariamente ainda vivencio experiências de preconceitos, hoje mesmo passei por uma. Imagina quem não a tem como o entrevistado? o triste episódio na tvband só nos mostra o brasil que ideologicamente sustentamos que é cômodo para muitos, ouso dizer- para a maioria. Ninguém quer igualdade! existe muita madame que quer pisar nas costas dos negros para não ter que sujar os sapatos de terra. #anajansen.

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