, aquilo que não pode ser evitado, inexorável. E
Nosso assassino, nosso criminoso quer portanto fazer crer que não foi responsável por seus atos, já que teria sido algo inevitável. Era impossível evitar assassinar a jovem, é o que ele quer dizer. E infelizmente nosso radialista caiu nessa sua conversa.
Atribuições
O bom jornalista deve ouvir, ouvir muito. Depois de ouvir, deve comprovar e confirmar tudo que ouviu. Subjacente a tudo isso, nosso bom jornalista deve conhecer sua língua, dominar as palavras, seus significados e seu uso.
Nesse processo é importante filtrar as informações, mas também a forma de tudo aquilo que ouviu. Se um assassino diz que “é impossível evitar matar”, é dever do jornalista atribuir isso à personalidade doentia e irresponsável do assassino. Eximir um assassino de culpa não é atribuição jornalística
Frases feitas
No processo de filtrar o que ouve e narrar fatos, o bom jornalista deve ter cuidado com pedras e buracos pelo caminho. Deve tomar cuidado com frases feitas e jargões, entre outros.
Frases construídas com “acabar” e gerúndio indicam algo inesperado, denotam uma mudança de ideia no meio do caminho: fui mudar os móveis da sala e acabei desistindo, talvez porque tenha ficado cansado. Fui sair para jantar e acabei desistindo, talvez porque estivesse sem dinheiro.
Assassino bêbado
Pois, quando anuncia que “a vítima acabou resistindo” à tentativa de estupro, nosso jornalista desacata a memória de nossa jovem motorista. Ela sugere de duas uma: que no início a vítima topou as investidas de seu atacante e só passou a resistir depois, ou que o ato de resistir ao estupro sobreveio de maneira inesperada.
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A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar, como ouro falso; a palavra foi feita para dizer.
Graciliano Ramos
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Em nome da memória de nossa jovem trabalhadora, precisamos usar as palavras com seus significados próprios: um homem estava bêbado, quis fazer sexo com a garota e, diante da recusa, a assassinou. Tão simples quanto trágico.