Um caso recente em Goiânia chamou a atenção das autoridades e da população para um tema que ainda é cercado por desinformação: a doação de óvulos, também chamada de ovodoação. Duas mulheres estão sendo investigadas pela Polícia Civil de Goiás por tentativa de subtração de incapaz em parques da capital.
Segundo o delegado responsável pelo caso, as suspeitas alegavam que seus óvulos teriam sido retirados por autoridades anos atrás e que teriam cerca de 200 filhos espalhados pela cidade. A investigação indicou a possibilidade de transtornos psiquiátricos envolvidos na narrativa.
Apesar do caráter isolado e extremo da situação, o episódio serve como alerta para o quanto a falta de informação sobre reprodução assistida ainda alimenta mitos, receios e interpretações equivocadas.
O que é a doação de óvulos?
A doação de óvulos é um procedimento médico autorizado, regulamentado e seguro, parte das técnicas de reprodução assistida oferecidas em clínicas especializadas no Brasil. Ela permite que mulheres que não conseguem produzir óvulos saudáveis possam realizar o sonho da maternidade por meio da fertilização in vitro (FIV).
A ovodoação é regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) por meio da Resolução nº 2.320/2022. A norma estabelece que a doação pode ocorrer de duas formas:
- Direta, entre parentes de até quarto grau (pais, filhos, avós, irmãos, tios e primos);
- Anônima, quando a doadora não sabe para quem serão destinados os óvulos e não tem contato com a mulher que receberá o material.
A idade mínima para ser doadora é de 18 anos e a máxima é de 37 anos. Esse limite existe porque, a partir dessa faixa etária, as taxas de fertilidade diminuem e a qualidade dos óvulos também é afetada, aumentando o risco de mutações genéticas.
Após a coleta, os óvulos passam a ser responsabilidade da clínica responsável pelo procedimento e as doadoras não têm mais controle sobre eles.
Critérios e acompanhamento
A doação é voluntária e só pode ser realizada em clínicas credenciadas e fiscalizadas pelo CFM. Tanto doadoras quanto receptoras passam por avaliações médicas e psicológicas rigorosas, que garantem o bem-estar e a compreensão total de cada etapa do processo.
Além dos aspectos biológicos, há também um cuidado emocional. A avaliação psicológica é parte essencial do protocolo, assegurando que todas as partes envolvidas estejam confortáveis e conscientes sobre o significado e as implicações da ovodoação.
Desmistificando crenças
Entre os equívocos mais comuns sobre o tema está a ideia de que a doadora teria algum direito sobre a criança gerada ou que poderia “encontrar” filhos no futuro. Isso é um mito. O processo é sigiloso e protegido por lei: a doadora não tem acesso às informações da receptora, nem o contrário.
Outro ponto importante é que não há risco de clonagem, retirada forçada de material genético ou rastreamento genético indevido. Essas ideias, embora infundadas, ainda circulam nas redes sociais e contribuem para o medo e a desconfiança em relação aos avanços da medicina reprodutiva.
Informação é prevenção
Casos como o registrado em Goiânia reforçam a importância de divulgar informação confiável sobre a doação de óvulos e demais técnicas de reprodução assistida. A desinformação pode gerar medo, preconceito e até situações de risco.
Compreender como esses processos funcionam, dentro da legalidade e com acompanhamento médico especializado, é essencial para quebrar mitos e fortalecer a confiança na medicina reprodutiva, que oferece caminhos seguros e éticos para a realização do sonho de ser mãe.
Diego Rezende é médico obstetra e fertileuta. Especialista em reprodução humana e saúde feminina.