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Carla Sahium Traboulsi

Erguem-se muros, constroem-se pontes: a mediação como resposta às tarifas

| 01.08.25 - 14:28
O anúncio oficial da tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, feito pelo presidente Donald Trump em julho de 2025, não surpreendeu. Mas preocupa. Não apenas pelo impacto financeiro imediato sobre setores como o aço, o café, a carne e os insumos químicos – cuja retração já se estima na casa dos bilhões de dólares – mas, sobretudo, pelo recado geopolítico: o multilateralismo econômico está em xeque, e a diplomacia comercial, esvaziada. Nesse contexto, não há espaço para passividade. Tampouco para retaliações improvisadas. É tempo de respostas inteligentes.
 
O Brasil, cuja matriz produtiva é fortemente integrada às cadeias globais, tem pouco a ganhar com escaladas bilaterais e muito a perder com a desarticulação de contratos. Por isso, é na mediação – e não na confrontação – que reside uma saída estruturante.
 
A mediação, ainda tratada com desconfiança por setores mais afeitos ao litígio, é, em essência, um método jurídico de reconfiguração de equilíbrio. Não se trata de abdicar de direitos, mas de revisitar obrigações à luz de contextos extraordinários, como o súbito aumento de custos de exportação. Em vez de prolongar impasses nos tribunais – que raramente dialogam com a urgência econômica – a mediação promove o reencontro das partes num campo de escuta, reconstrução e renegociação.
 
Não se trata de uma ferramenta alternativa: trata-se de uma política pública de governança jurídica. Afinal, se as tarifas de Trump reconfiguram a lógica do comércio internacional à força de caneta, é preciso que os países afetados reajam com instrumentos compatíveis à sua realidade e às suas instituições. A mediação é uma dessas ferramentas. E precisa deixar de ser periférica para ocupar o centro das respostas econômicas.
 
A indústria química brasileira, por exemplo, já sente os efeitos do tarifaço com cancelamentos de contratos e perda de mercados estratégicos nos Estados Unidos. O setor de carnes projeta prejuízos superiores a um bilhão de dólares. O aço – já pressionado por disputas antigas com os americanos – vê-se novamente ameaçado por sobretaxas, mesmo quando voltado à exportação de produtos semiacabados, como os slabs. Tudo isso em meio à instabilidade cambial, à desaceleração global e à retração dos investimentos.
 
Nesse cenário, defender a mediação não é um gesto de idealismo, mas de pragmatismo. As empresas precisam de soluções rápidas. Os contratos precisam de revisões técnicas. E o Estado precisa de mecanismos eficazes para proteger sua economia sem recorrer ao populismo jurídico. A mediação é justamente o ponto de encontro entre essas três urgências.
 
Mais do que mitigar conflitos, ela revela maturidade institucional. É o caminho da razoabilidade, onde a lógica do ganha-ganha substitui o revanchismo e a paralisia. Países que compreendem isso se fortalecem não apenas na economia, mas na imagem que projetam ao mundo: a de que sabem dialogar, adaptar-se e preservar sua estabilidade interna mesmo diante das adversidades externas.
 
Enquanto Trump levanta tarifas, o Brasil precisa levantar pontes. Não apenas diplomáticas, mas jurídicas. Pontes que conectem produtores e compradores, empresas e Estado, contratos e realidades. E isso começa com a valorização pública e privada da mediação como política de desenvolvimento, não como opção acessória.
 
É hora de abandonar a ideia de que a mediação é sinônimo de concessão. Mediação é inteligência jurídica. É proteção econômica. É soberania dialógica. E, em tempos de muros, ela é o mais urgente dos alicerces.

*Carla Sahium Traboulsi, especialista em Direito Imobiliário, Conciliação e Arbitragem. Ela também é diretora do Secovi-GO, diretora do Conselho Nacional de Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima) e conselheira seccional da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO).


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