Mauricinho Hippie e Iuri Godinho (Foto: Arquivo pessoal)
Um tempo atrás houve uma festa na casa da artista plástica Alessandra Teles, no Setor Sul. Um luau em volta da fogueira, coisa linda. Alguém mencionou que o Mauricinho Hippie não saía mais de casa, estava em depressão, triste desde que foi atropelado por um ônibus e teve de amputar o pé.
Mauricinho foi um dos maiores nomes de nossa cultura. Transgressor, corajoso, agora lendário com sua partida hoje. Nos anos 1970 montava em sua bicicleta rosa enfeitado de fitinhas coloridas, pegava sua cachorrinha que também pintava de rosa e saía pelas ruas do Centro assobiando alto. Sempre magro e forte, usava o cabelo grande e encaracolado com várias cores, vestia roupas de cores básicas e fortes, uma explosão visual. Parecia um pop star de Londres materializado em Goiânia.
Pioneiro da Feira Hippie quando ela era de artesanato na Praça Cívica, ele se deu ao luxo de ser diferente em uma cidade provinciana, grávida de preconceitos. Se fosse hoje o chamaríamos de disrruptivo. Gentil, trazia rosas para Adriana Godinho todas as manhãs na Contato Comunica, no Setor Aeroporto. Não se conhece dele nenhuma briga, não se ouviu falar que fez mal a qualquer pessoa.
Naquela noite na casa da Alessandra resolvemos ligar para o Mauricinho. Com uma voz fraquinha ele disse que não queria sair, já estava dormindo. Peguei o carro e toquei a campainha de sua casa em uma pracinha do Setor Aeroporto. Ele estava pronto, vestido da maneira sóbria que trajava nos últimos anos de sua vida, bem diferente do colorido garoto de antigamente. Levei-o para o luau, ele conversou pouco mas bailava em seus olhos uma centelha de luz quando relembrávamos casos de sua vida.
Vi pela última vez seus olhos se acenderem na homenagem que o Antônio da Mata fez a ele no ano passado em uma exposição no Museu de Arte Contemporânea. Mauricinho chegou de bengala, sentamos na cozinha para conversar e alguém apareceu com um acordeon. Sem dizer nada, Mauricinho abriu os braços para o instrumento e começou a tocar sem parar. Senti que ele ria por dentro.
E aquela canção do Mauricinho, aquele Mauricinho, jamais vai parar de tocar.
*Iuri Godinho é jornalista e escritor