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Wolney Unes
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Outra do português - Uma coluna que analisa linguagem e ideias / outradoportugues@gmail.com

OUTRA DO PORTUGUÊS

Falar escrevendo

| 27.02.19 - 14:38 Falar escrevendo (Foto: Alan Santos)
“Você não falou comigo nenhuma vez no dia de ontem”
Jair Bolsonaro – Brasília
 
“Usei o whattsap para falar três vezes com o senhor” 
Gustavo Bebianno – Brasília
 
 
Semana passada o país parou para discutir se houve ou não diálogo entre o presidente e um ministro. Grande parte da confusão deu-se em torno do significado desse verbinho, falar. 
 
O campo minado
Palavras constantemente mudam de significado, acrescentam acepções, eliminam outras. Por isso, fica mais fácil falarmos de campo semântico das palavras, um espaço amplo mas delimitado dentro de nosso pensamento. 
 
Pois podemos imaginar o conjunto dos significados das coisas e das ideias como um enorme espaço, retalhado entre campos semânticos. Entre esses campos, pode haver vácuos, como também pode um campo ocupar parte do volume de seu vizinho. 
 
Organismos
Além disso, cada um desses campos são como organismos vivos: mexe, remexe, contrai e se expande. Nessa movimentação, um campo pode invadir outros campos semânticos contíguos, deixar vácuos que logo serão ocupados por outros campos e por aí afora. 
 
Falando
Pois nosso verbinho falar surgiu decorrente de uma antiga ideia: emitir sons com o aparelho fonador de modo a transmitir um significado a alguém presente. 
 
Até algum tempo atrás, ainda na época das cartas e dos bilhetes, o campo semântico do verbo falar era bem definido em relação a escrever, por exemplo. Com o surgimento do telefone, o campo de falar dá uma ajeitada para contemplar o ato de falar à distância, não presencialmente. Surgem verbos como telefonar ou chamar, para suprir esse significado.
 
Com o surgimento de mensagens, sms, torpedos, e agora telegram e whatsapp, o campo semântico de nosso verbinho dá mais uma remexida. Por isso, hoje, dizer “falei com ele ontem” não dá nenhuma pista sobre como se deu essa comunicação, se presencialmente, se verbalmente pelo telefone, skype ou facetime. Ou se por meio de mensagens em tempo real, pelo celular.
 
Filhos
Tenho um filho que estuda em outro continente. Falo com ele algumas vezes por semana, mas falo escrevendo no celular... Outro filho adolescente, diante da bronca por ter passado a noite fora, contemporiza no dia seguinte dizendo que “falou comigo”, dizendo que ia dormir fora – claro que a fala se deu por mensagem no celular!
 
Com nossos campos semânticos se ajeitando constantemente para incorporar novas tecnologias e modismos, caso sintamos a necessidade de precisão, então será preciso usar de algum advérbio para complementar a informação: Falei por zap, falei por mensagem de voz, e por aí afora.  
 
E, no caso de eu decidir argumentar com meu menino adolescente, discutindo o campo semântica de falar e seus múltiplos veículos e ferramentas, é claro que perderei a discussão. Eles têm a tecnologia muito mais incorporada. 

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A escrita é sinônimo de autonomia semântica do texto 
PAUL RICOEUR, linguista francês
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