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Othaniel Alcântara
Othaniel Alcântara

Othaniel Alcântara é professor de Música da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisador integrado ao CESEM (Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical), vinculado à Universidade Nova de Lisboa. othaniel.alcantara@gmail.com / othaniel.alcantara@gmail.com

Othaniel Alcântara

30 anos de “Amadeus”

Filme fala sobre a vida de Mozart | 14.11.14 - 18:42 Othaniel Alcântara

Em 1984, o filme Amadeus estreava nos cinemas de vários países do mundo. O título desse drama ficcional é a versão latina do sobrenome “Theophilus” do famoso compositor nascido em Salzburgo, Johannes Chrysostomus Wolfgangus Theophilus Mozart (1756-1791).

O longa- metragem é uma adaptação da peça homônima escrita em 1979, pelo dramaturgo inglês Peter Shaffer, sucesso na Broadway em 1980, que por sua vez, foi baseada na obra Mozart e Salieri escrita em 1830, pelo romancista e poeta russo Alexandre Puskin (1799-1837).

 
Mozart e Salieri  (1830) - Alexander Pushkin.
Mais detalhes: Revista Intertelas

 
Curioso observar que em 1830, já se falava da suposta rivalidade entre Mozart e o Antonio Salieri (1750-1825), então compositor oficial da Corte do Imperador José II (1741-1790), irmão de Maria Antonieta, aquela mesma, Rainha da França, decapitada em 1793 durante a Revolução Francesa (1789 a 1799). Mas, será que tal hostilidade existiu? E mais, o compositor italiano realmente matou ou teria tentado matar Mozart? Estas são algumas das várias perguntas que ouço sobre Amadeus nas minhas aulas de “História da Música” e “Apreciação Musical” do Curso de Música da UFG.

Na vida real, é possível que tenha existido algum tipo de rivalidade entre os dois no campo musical. Entretanto, não há evidências que corrobore essa teoria. Nas duas biografias de Mozart que li até hoje, Mozart, Sociologia de um Gênio de Norbert Elias, 1991 e Mozart: vida, temas e obras de Nicholas Kenyon, 2005, lembro-me de apenas uma passagem que faz menção sobre este assunto. Trata-se de uma carta do pai de Mozart à filha Nannerl, datada de 1786, ano da estreia da ópera cômica Bodas de Fígaro: “Será de admirar se for um sucesso, pois sei que há poderosas cabalas contra teu irmão. Salieri e todos os seus apoiantes tentarão, de novo, mover céus e terra para rebaixar esta ópera.”.

 

Filme Amadeus (1984)



Trecho do filme Amadeus (1984)

 
O relato acima deve ser analisado de forma contextualizada. Qual teria sido a motivação de Salieri para esta suposta “perseguição”? Então vamos lá! Apesar do filme Amadeus, à primeira vista ser visto como um filme sobre a inveja percebe-se, implicitamente, que Peter Shaffer utiliza-se desta cinebiografia para retratar um caso de contestação quanto às estruturas rígidas existentes na sociedade vienense do século XVIII.
 
Naquela época, especialmente na Áustria e na Alemanha, o músico ainda era muito dependente do patronado. Na verdade, não havia muitas opções. Para ser reconhecido e conseguir seu sustento e de sua família, tinha que conseguir um posto na corte e, consequentemente, submeter-se ao gosto, inclusive musical, da nobreza e dos círculos aristocráticos. Mozart tinha um temperamento irreverente e não se encaixava nesses padrões. Não se adequou de forma passiva a essas regras socialmente estruturadas em Salzburg e em Viena.
 
Sabemos que após a sua chegada à capital austríaca, em 1781, aos 26 anos, viveu dois ou três anos de sucesso. Mas, na sequência, a popularidade começou a entrar em declínio. Provavelmente, o ponto fulcral que desencadeou sua derrocada, tenha sido a controversa escolha do tema “Fígaro”, baseada na peça teatral de Beaumarchais, estreada em abril de 1784, em Paris.
 
Eram momentos delicados que antecederam a Revolução Francesa. A peça que incitava o ódio entre classes sociais havia desagradado profundamente o Imperador José II. O fato é que, nesta época, mesmo já sendo um “artista autônomo”, vivia num círculo bastante fechado. É natural que ao contrariar o Imperador, os músicos da corte, a maior parte satisfeita com seus empregos e boa parte da sociedade, também o tenha abandonado. Os finais todos já sabem: entrou numa profunda depressão, morreu na miséria e foi enterrado numa vala comum.
 
Gostaria de comentar neste texto, as demais perguntas dos meus alunos, afinal, o filme é bem intrigante e a vida do nosso personagem também. Por falta de espaço, vou apenas deixar algumas delas aqui: Mozart possuía uma personalidade excêntrica? Realmente tinha aquela risada bizarra? Quem encomendou o Réquiem e quem realmente terminou essa obra? Qual a verdadeira causa da morte do compositor? Etc. Talvez assuntos para futuros textos.
 
Voltando ao filme, gostaria de destacar que em 2002, o cineasta tcheco, naturalizado americano, Miloš Forman apresentou ao público a “versão do diretor” de “Amadeus”, filme que, além de quatro Globos de Ouro, venceu oito das onze indicações que recebeu ao prêmio Oscar de 1985, incluindo melhor filme, melhor ator (F. Murray Abraham, o Salieri que concorreu com Tom Hulce, no papel de Mozart), melhor direção de arte, melhor roteiro adaptado e melhor diretor; os dois últimos recebidos por Forman. Esta versão, remasterizada e restaurada digitalmente, inclui cerca de vinte minutos adicionais e algumas pequenas alterações na trilha sonora, toda ela composta de obras de Mozart.

 
Miloš Forman na cerimônia do Oscar (1985)

 
Ah! Um making of integra o box desta versão. Nele existem depoimentos sobre a concepção do filme, a conturbada relação de Miloš Forman e Peter Shaffer, que reescreveu sua peça para o cinema, ou ainda sobre a locação do Teatro da Ópera de Praga, onde Mozart estreou Dom Giovanni, em 1781. Cabe dizer que a Tchecoslováquia na década de 1980, fazia parte da parte oriental da “Cortina de Ferro”. Dá pra imaginar quantas histórias curiosas e divertidas, estão presentes neste documentário.

Leia a próxima coluna: Mozart e Salieri (postada em 11/12/2014).


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Filme Amadeus (completo)
Áudio: espanhol

 
Requiem de Mozart dirigido por Sir Colin Davis, em 2004.
 
 
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Obs.: Vale a pena dar uma olhada nesse ARTIGO CIENTÍFICO:  Mozart, as suas doenças e a Medicina do século XVIII, publicado na Revista Medicine History em 2006. 

Leia também: 30 Anos de ‘Amadeus’” (publicado em 14/11/2014).


Comentários

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  • 01.02.2024 15:30 Amanda Silva Cordeiro

    O texto é uma ótima crítica do filme Amadeus, que se tornou um dos meus favoritos depois que tive o prazer de assistir. O autor consegue captar a essência e a beleza do filme, e nos faz apreciar ainda mais essa obra de arte. Ele nos mostra como o filme é rico em detalhes e em emoções, e como ele nos faz pensar sobre o significado da genialidade e da mediocridade, e como elas influenciam o destino das pessoas. Ele também nos faz admirar o talento e a música de Mozart, que é um dos maiores compositores da história. O texto é uma leitura envolvente e inspiradora, que nos faz querer assistir ao filme novamente.

  • 30.01.2024 19:27 Arthur Borges Taveira

    O texto destaca o filme "Amadeus," lançado em 1984, uma adaptação da peça de Peter Shaffer inspirada na obra de Alexandre Pushkin. A trama explora a suposta rivalidade entre Mozart e Salieri na Viena do século XVIII, onde músicos dependiam do patronado. Embora a hostilidade seja questionável, uma carta do pai de Mozart menciona a oposição de Salieri à ópera "Bodas de Fígaro." O contexto histórico destaca a dependência dos músicos da nobreza, e a personalidade irreverente de Mozart é apontada como fator para seu declínio. O texto levanta questões sobre a personalidade de Mozart, a verdadeira causa de sua morte e a autoria do Réquiem. Uma versão do diretor, lançada em 2002, apresenta alterações na trilha sonora, composta apenas por obras de Mozart.

  • 28.01.2024 18:54 Gabriel Costa Paz

    Bem interessante saber sobre a "versão do diretor" de "Amadeus" e os detalhes do making of! Parece que há muito mais a explorar sobre a vida e obra de Mozart para além do que o filme revela. A vida de Mozart, intrigas, rivalidades e os desafios enfrentados pelo compositor. A visão aprofundada sobre os bastidores da Viena do século XVIII e como as estruturas sociais influenciaram a carreira dele. Realmente muito bom entender um pouco mais da história.

  • 28.01.2024 04:49 Amanda Ribeiro de Sousa

    O mozart no filme tem uma personalidade um tanto quanto extrovertida e animada, mas vale lembrar que o mesmo estava com ideias a frente do tempo que viva. Querendo ser livre do emprego de compositor da corte ou qualquer outro cargo. Assim como outros gênios, Mozart tinha o desejo que compor pelo seu próprio desejo de criar músicas e avançar no tempo com suas composições. Dá forma como mostrado no filme, seria muito difícil Salieri não se sentir incomodado com Mozart. Logo de início, ele tem sua peça tocada de uma forma melhor, ao seus olhos ele vê acontecer uma releitura da mesma. É incontestável dizer que Mozart n foi um gênio como compositor ou musicista, o filme trata isso muito bem, caminhamos para o passado para sentirmos espectadores na primeira fila da história de Mozart e Salieri, querendo saber cada desfecho e questões que surgiam ali na corte em que viviam os dois.

  • 27.01.2024 16:48 Filipe Castro Saraiva

    A experiência de assistir "Amadeus" é simplesmente incrível. Apesar de ser um filme ficcional ele consegue fazer uma imersão impressionante na realidade da época, mostrando aspectos culturais e políticos, além de nos possibilitar enxergar de perto como seria a admirável "persona" do gênio que foi o grande músico e compositor Mozart. Todo o aspecto de inveja do Salieri desenvolvido para criar o dilema da narrativa também nos aproxima em relação a tentar entender a música de Mozart, por ser uma grande vitima dessa história. Além disso, o Salieri mesmo invejando todo o talento de Mozart ainda sim é o maior admirador de todo o trabalho que Mozart faz no filme, o que nos apresenta lindos momentos de apreciação dos trabalhos de Mozart na perspectiva de um grande entendedor de música.

  • 27.01.2024 00:48 Kaic Toledo Camilo

    Professor, ao celebrarmos os trinta anos do filme "Amadeus" em 1984, somos conduzidos a uma reflexão profunda sobre as complexidades da vida e da música de Wolfgang Amadeus Mozart. Nessa obra cinematográfica, dirigida por Miloš Forman, somos levados a questionar não apenas a suposta rivalidade com Antonio Salieri, mas também as estruturas sociais da Viena do século XVIII. As nuances da personalidade de Mozart, suas escolhas musicais ousadas e a resistência às normas estabelecidas tornam-se elementos essenciais para compreendermos não apenas a história da música, mas também a ousadia de um gênio diante das convenções de seu tempo.

  • 23.01.2024 20:04 Orlando Torquato da Silva Neto

    O texto fornece uma análise detalhada do filme "Amadeus" e da vida de Mozart, destacando a suposta rivalidade entre Mozart e Salieri. A discussão sobre a adaptação cinematográfica, a vida do compositor e a sociedade vienense do século XVIII é muito informativa. Além disso, os comentários dos leitores enriquecem a compreensão do impacto do filme e da complexidade dos personagens. A conexão entre a narrativa do filme e a realidade dos artistas contemporâneos também é um ponto interessante abordado no texto.

  • 04.01.2024 11:58 Janaina Sacramento Rocha

    Já não é novidade que as músicas naquela época era escrita conforme o gosto do contratante, que no caso era a nobreza, a música devia ser de entretenimento e tinha que ser simples de entender, porém, Mozart não queria fazer música para entretenimento, ele não queria ser um empregado serviçal, ele queria ser um artista! No filme há uma parte em que Mozart queria fazer uma música mais complexa, que saia do esquema padrão previsível das músicas daquela época, porém não agradou o gosto do imperador, o mesmo disse que a música que Mozart havia composto tinha muitas notas. Mas infelizmente, a única forma de viver da música naquela época era sendo um empregado da corte ou da igreja. Esse requisitos para compor e ser um artista naquela época pode ter sido causador da grande frustração de Mozart.

  • 21.12.2023 12:53 Jordanna Coelho Neves

    O filme é uma adaptação da peça homônima de Peter Shaffer, que por sua vez se baseou na obra "Mozart e Salieri" de Alexandre Pushkin. A trama aborda a suposta rivalidade entre Wolfgang Amadeus Mozart e Antonio Salieri. O filme contextualiza a Viena do século XVIII, onde os músicos dependiam do patronato, submetendo-se aos gostos da nobreza. Mozart, com seu temperamento irreverente, não se conformava com essas estruturas sociais e teve altos e baixos em sua carreira.

  • 10.11.2021 23:50 Wanderlei Soares da silva júnior

    Amadeus é um filme muito bom por vários aspectos e me chamou muito a atenção sobre a ótima recriação de época, figurinos exemplares, ótima execução das músicas e essa rivalidade de Mozart e Salieri me motivou a continuar atento ao filme. Não é necessariamente biográfico pois se baseia em uma peça inspirada em uma fictícia, mas foi bem interessante para o enredo do filme. Não posso esquecer do Requiem, uma das minhas obras favoritas e que me arrepiam desde os primeiros compassos. Maravilhoso!!

  • 10.09.2021 22:38 José Vinícius Maciel Oliveira

    Um grande compositor, um grande filme e um grande artigo. Apesar do distanciamento da relação real entre Mozart e Salieiri, é incrível ter pelo menos uma ideia de como funcionava a mente de um gênio e como era sua personalidade. Realmente uma obra prima.

  • 22.08.2021 18:55 Guilherme Henrique Fagundes Oliveira

    O filme Amadeus conta a história de Mozart, um dos maiores compositores de música clássica. E a possível rivalidade entre Salieri . O filme me pareceu muito hollywoodiano, sempre apelando para saídas cômicas e exageradas quando falamos sobre as personagens e as situações vividas por elas. Achei o filme muito longo e hiperbólico, mas consegue atrair a atenção do espectador. Fica o questionamento sobre a ficção adicionada a história sendo que nem todos os fatos são confirmados pelos historiadores que estudam Mozart e sua vida.

  • 20.08.2021 10:37 Guilherme Assunção de Resende

    Que filme fantástico! São grandes as chances que Mozart tenha tido personalidade excêntrica. Diante dos fatos relatados somos levados e enxergar uma pessoa com uma presença forte e isso dá asas a imaginação do roteirista do filme. Quanto a quem encomendou a obra Requiem, torna a trama incrível ser sido alguém que desejava ver Mozart sofrer diante das angústias do falecimento de seu pai.

  • 12.08.2021 09:56 gabriel guerra ferreira

    Ótimo filme! A forma como retrata a suposta rivalidade entre Mozart e Salieri é bastante interessante. Quem não conhece a história dos dois fica instigado. Muito bom também o reconhecimento de Salieri a Mozart quando este fica doente e eles compoem juntos.

  • 12.08.2021 09:27 Thaís Basilino

    Gostei muito do filme, não é à toa que foi super premiado. Cada detalhe do filme compõe uma história muito curiosa que é esse resgate da História da música clássica misturado com a ficção que dão ainda mais interesse para se aprender sobre o tema. A riqueza de detalhes do filme por si só já é satisfatória, mas, além disso, as contextualizações históricas abordadas na análise do artigo tornam-se de suma importância.

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Othaniel Alcântara é professor de Música da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisador integrado ao CESEM (Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical), vinculado à Universidade Nova de Lisboa. othaniel.alcantara@gmail.com / othaniel.alcantara@gmail.com

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