José Abrão
Goiânia – O nanismo refere-se a um grupo de condições médicas que afetam o crescimento e o desenvolvimento ósseo, resultando em uma estatura muito baixa. Existem cerca de 250 mil pessoas com nanismo no mundo. Por ano, uma em cada 25 mil crianças no mundo nasce com acondroplasia, o tipo mais comum de nanismo. Além disso, 80% das crianças que nascem com acondroplasia possuem pais de estatura mediana.
Mães com nanismo podem enfrentar dificuldades e complicações durante a gestação e no parto, além de outras barreiras para além da saúde, como o preconceito e a falta de informação, seja por parte da comunidade médica ou pela sociedade como um todo.
Durante a gravidez, a mulher com nanismo pode, por exemplo, enfrentar dificuldade para respirar ou para se mover, além de dores ou problemas circulatórios e respiratórios. Isso justamente em razão da estatura. Pelo tamanho menor da pelve, a maioria dos partos é feita por meio de cesariana. "As complicações que podem surgir na gravidez vão depender de qual é a origem desse nanismo”, explica Rayana Maia, médica geneticista e docente do curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
O que muita gente não sabe é que os casos de nanismo podem ser muito diversificados: existem mais de quinhentos tipos dessa condição e a herança genética pode não ser tão determinante quanto as pessoas pensam. São probabilidades variadas e, tanto pais quanto profissionais da saúde, precisam estar informados.
Em razão dessa variedade, é complicado até mesmo prever a incidência da mutação sem fazer um estudo genético. “A probabilidade de ter filhos com nanismo vai depender da origem do nanismo na família”, explica a médica. Ela orienta que as mulheres com nanismo façam uma avaliação clínica antes de engravidar para ajudar a entender quais pontos específicos podem apresentar complicações. Além disso, consultar um geneticista é fundamental. “Para aconselhamento genético antes de engravidar e acompanhamento conjunto na gestação”, orienta a especialista.
Casos e casos
A industriária Maria Thereza Coelho, de Catalão, tem nanismo. O marido dela não tem. O casal teve três filhos: a mais velha não herdou a mutação, mas os dois mais novos, sim.
Maria Thereza e a família (Foto: acervo pessoal)
Segundo Maria Thereza, na primeira gravidez, o médico sequer tocou no assunto. “Ele nem mencionou a questão do nanismo, nem foi cogitado, e quando ela nasceu também não falaram nada”, relata. Com o segundo filho, a situação foi diferente. “Por volta de 28 semanas de gestação, o médico que fez o ultrassom disse que o bebê ia ter má formação cerebral, problemas de estômago, um rim maior do que o outro... Ele quase chegou a sugerir que o bebê seria incompatível com a vida”, lembra.
Com medo, o casal procurou outro médico. As características visualizadas pelo primeiro profissional nada mais eram que sinais da herança genética: membros menores. “Eu fiz ultrassom com um médico que simplesmente não tinha o preparo para fazer o diagnóstico de nanismo”, diz Maria Thereza. A criança nasceu saudável após 39 semanas de gestação.
A bancária Fabíola Dreher Guimarães e o marido dela têm nanismo, mas a filha deles, não. Quando engravidou, a bancária decidiu fazer o estudo genético para saber se sua filha herdaria a mutação. “O preconceito é tão grande que o médico geneticista quando viu que ela tinha chance maior de nanismo sugeriu que interrompêssemos a gravidez. Foi muito pesado isso”, conta. Na ultrassom de 28 semanas, conforme relata a bancária, foi identificado que a bebê não tinha nanismo porque o tamanho dos ossos dos membros não estava menor. Não houve nenhum problema na gestação e a menina nasceu após 39 semanas de espera.
O parto, porém, foi complicado. “Não havia espaço entre as vértebras, tomei 10 raquianestesias e ainda assim não pegou. Aí eu tomei a geral. A minha filha nasceu dormindo porque pegou a anestesia nela”, completa Fabíola. A bebê estave em risco, mas tudo terminou bem. Parte disso só foi possível devido à relação próxima dela com sua ginecologista, que foi devidamente orientada sobre as complicações que poderiam acontecer. “Como eu já fazia parte do grupo Nanismo Brasil, eu já tinha alguma bagagem. A ginecologista buscava as informações comigo, tirava todas as dúvidas comigo, ela procurou o conhecimento sobre nanismo para me atender, e isso é difícil hoje”, pontua Fabíola.
Fabíola e família (Foto: acervo pessoal)
As mães como Fabíola e Maria Thereza relatam histórias parecidas: o ônus de se informar e se inteirar de todos os fatos, dados e questões envolvendo o nanismo recaiu sobre elas, que criticam o desinteresse dos médicos. As mães frequentemente recorrem a redes de apoio como o Instituto Nacional de Nanismo, o grupo Somos Todos Gigantes e o projeto Nanismo Brasil, que contribuem para que outras mães não enfrentem as mesmas experiências negativas.
“A gente se depara com médicos que não têm o preparo [para lidar com o tema]. Hoje nós somos multiplicadores de informação para as famílias que estão chegando. Sempre que levo meus filhos ao médico, a gente faz um breve relato das comorbidades e agravos que eles podem ter e os médicos falam ‘você é bem informada'. A gente tem que se agarrar às informações para poder levar para as outras pessoas”, relata Maria Thereza. “A falta de interesse dos médicos é muito grande, muitas colegas têm dificuldades no parto porque o obstetra acha que é só abrir e tirar e não procura se informar sobre as peculiaridades do nanismo”, adiciona Fabíola.
“Nanismo é uma condição rara e, por isso, temos muita dificuldade de encontrar médicos que dominem o assunto. E também é difícil encontrar informações na literatura médica que compartilhem a experiência de determinados casos justamente por serem raros. Então, não faz parte da rotina de muitos especialistas que não trabalham com condições raras”, explica a Dra. Rayana. Ela orienta as mães a procurarem especialistas ou médicos com experiência, mas chama atenção da comunidade médica para que, ao se deparar com um caso de nanismo, deve ir além para realizar suas atribuições de forma eficiente. “É importante que o médico pesquise na literatura, procure se informar para entender quais as possíveis complicações para cada caso”, finaliza.