Catherine Moraes
Rio de Janeiro - Onde estão os adultos com autismo no Brasil? O resultado de uma pesquisa realizada pela neuropsicóloga e coordenadora do ambulatório de autismo do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, Joana Portolese revelou que 80% dos adultos com autismo do país ainda moram com os pais, 78% não trabalham e a maioria, 67%, são homens. Além disso, a maior parte faz uso de medicamentos. Os dados foram apresentados neste sábado (25/3), durante o Seminário Rio TEAMA, realizado no Othon Palace Capacabana, no Rio de Janeiro.
A neuropsicóloga foi responsável pela palestra "Autismo ao longo da vida" e falou sobre o adulto que não recebeu na infância o acompanhamento multidisciplinar necessário. Ela também ressaltou o aumento de busca de diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) por adultos desde o início da pandemia. "O adulto que não recebeu acompanhamento na infância, ele perde o tempo da neuroplasticidade cerebral e as janelas de oportunidade para aprendizagem vão se fechando, tornando o aprendizado mais difícil. É como aprender uma língua, a alfabetização, a fala. Existe o aprendizado, mas com lacunas de conhecimento. Isso vai impactar aprendizagem, escola, autonomia e interação social", pontuou.
Joana explica que o trabalho em home office e as atividades on-line de forma geral despertaram sintomas antes camuflados. "No trabalho on-line, por mais que tenha diminuído a demanda social, outros sinais ficaram visíveis. No ambiente de trabalho, você pega um pouco das pistas, mas quando você está sozinho, a leitura é mais difícil. Muitos dizem que uma coisa é a entrega, em relação ao trabalho, projeto. Outra coisa é o como. Às vezes não entendo o que meu chefe fala, como ele pede, se está dando bronca. No trabalho presencial, muita vezes tem um amigo que ajuda no como", pontua.
Sem diagnóstico correto, muitos adultos, portanto, vão sendo tratados para ansiedade, depressão, Transtorno Obsessivo, Compulsivo (TOC) e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). "São outros diagnósticos que não o autismo e aquilo nunca faz muito sentido. Quando ele recebe um diagnóstico acaba sendo libertador e possibilita uma compreensão sobre o funcionamento de si próprio", acrescenta.
A palestra falou sobre os reflexos, a longo prazo, da ausência de acompanhamento e tratamento necessário que começa, muitas vezes, pelo bullying, mas que reflete na exclusão nas escolas, na desistência dos estudos e em seguida, em altos índices de desemprego. Se por um lado, muitas mães deixam os trabalhos para se dedicar integralmente aos filhos, por outro lado ampliam números de stress crônico e risco de consequências graves envolvendo a saúde mental. As irmãs de homens com autismo foram pontuadas como grandes responsáveis pelos cuidados com eles à medida em que envelhecem e as avós com papel relevante no diagnóstico precoce. De forma geral, o encontro fala de como um diagnóstico envolve uma família inteira.
O evento
O Seminário Rio TEAMA começou na última sexta-feira (24/3) e segue até domingo (26/3), no Rio de Janeiro. O encontro, realizado há 5 anos, reúne palestrantes de todo o Brasil e também convidados internacionais. Neste ano, dividiu as temáticas em: Autismo na clínica; Autismo, pesquisas e intervenções e também políticas públicas.
Organizadora do seminário, Andréa Bussadi afirma que o evento se tornou referência nacional e atribui esse resultado ao cuidado e emprenho com o qual realiza o Rio TEAMA. "Começamos esse encontro em 2018 e sempre batemos recorde de público. É um seminário baseado na ciência e que reúne os principais nomes do país. Sou mãe de autista com mais de duas decadas e fico muito feliz em ver aqui hoje pessoas do país todo. Temos gente do Acre, Mato Grosso e até um grupo grande do Nordeste. Este é o maior evento do Brasil devido à credibilidade que ele tem", finaliza.