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Afrescos de Confaloni eternizam passado e futuro na Estação Ferroviária

Imagens de foram pintadas há mais de 70 anos | 06.06.25 - 14:48
Afrescos de Confaloni eternizam passado e futuro na Estação Ferroviária Foto: Rodrigo Obeid/A Redação
Carolina Pessoni
 
Goiânia - No coração de Goiânia, um lugar de passagem tornou-se também de permanência. A antiga Estação Ferroviária, hoje Museu Frei Confaloni, abriga duas das mais impactantes obras do artista ítalo-goiano: os painéis Os Bandeirantes: Antigos e Modernos, pintados entre 1953 e 1954. Executadas com maestria na técnica do afresco, essas obras não apenas decoram o saguão central da antiga estação, elas contam histórias, sugerem futuros e eternizam visões.
 
Frei Nazareno Confaloni foi um dos nomes mais importantes da arte mural em Goiás. Nascido Giuseppe Confaloni, na província de Viterbo, Itália, ele chegou ao Brasil em 1950, a convite do bispo Dom Cândido Penso. Veio para pintar os Mistérios do Rosário na igreja que hoje é o Santuário do Rosário, em Goiás, e acabou se tornando um dos principais formadores da arte moderna no estado. Seu legado é visível até hoje em igrejas, escolas e espaços públicos da capital.
 
Os dois afrescos da estação ferroviária são um marco em sua carreira — não apenas por sua grandiosidade, mas por seu conteúdo. “É a primeira obra de Confaloni cuja temática não é sacra”, destaca PX Silveira, biógrafo do artista. “Até então, ele pintava santos, especialmente Madonas. Na estação, ele se liberta do tema sacro para tratar da temática social.” Antes disso, apenas uma obra profana havia sido feita: um mural em uma loja da Avenida Goiás, que infelizmente não foi preservado.

A divisão entre “antigos” e “modernos” dá o tom da narrativa visual. O primeiro painel retrata os bandeirantes colonizadores em meio à conquista do interior do Brasil. Há conflito, movimento e imposição — inclusive o ataque aos povos indígenas, que é representado de forma documental. “Não há crítica social ali”, diz PX. “É uma documentação do que realmente aconteceu, a sobreposição do bandeirante sobre o indígena.”
 

Paineis estão instalados dentro da antiga Estação Ferroviária (Foto: Rodrigo Obeid/A Redação)
 
O segundo painel, por sua vez, propõe um olhar para o futuro. É ali que Confaloni retrata os “bandeirantes modernos”: trabalhadores, colunas arquitetônicas, moldes de aço e, ao fundo, um trem de linhas arrojadas que antecipa os trens de alta velocidade europeus. “O formato lembra mais um bólido do que uma locomotiva”, observa PX. “É o presente e o futuro conforme antevisto por ele.”
 
A técnica usada por Confaloni valoriza ainda mais essas obras. O afresco, trazido da tradição italiana, exige que a pintura seja feita diretamente sobre a massa ainda fresca da parede. Isso faz com que os pigmentos sejam absorvidos pela argamassa, garantindo durabilidade e uma textura única. “É diferente da pintura comum na parede”, explica PX. “A tinta se funde à parede e permanece ali por muito mais tempo.”

Com cerca de 8 a 10 metros de largura por 4,5 de altura, os painéis impressionam por suas dimensões. “É quase como um outdoor dos dias de hoje”, compara PX. Ainda assim, eles mantêm a delicadeza nos traços e o uso de tons pastéis, marca registrada do artista. As cores foram restauradas ao longo dos anos, com o objetivo de preservar a obra tal como foi concebida originalmente.
 
O contexto da obra também merece destaque. A estação ferroviária, inaugurada em 1952, era símbolo da modernização de Goiás e da integração do Centro-Oeste ao restante do país. O espaço foi pensado como um polo de progresso dentro do projeto da Marcha para o Oeste, promovido por Getúlio Vargas. Em meio a esse cenário de expectativas, Confaloni criou imagens que dialogam com o passado e projetam o futuro.

Painéis impressionam por suas dimensões (Foto: Rodrigo Obeid/A Redação)
 
O dinheiro recebido por esse trabalho teve destino significativo. Segundo PX, Confaloni comprou com ele um Fusca — que usaria até sua morte, em 1977 — e lançou as bases da Igreja São Judas Tadeu, no Setor Coimbra. “Ele foi arquiteto, mestre de obras e ainda financiador, trocando quadros por materiais e fazendo quermesses para arrecadar fundos”, conta.
 
A importância dos afrescos transcende a estética. Eles fazem parte de um momento de transição artística e urbana. Confaloni foi um dos fundadores da Escola Goiana de Belas Artes, formou gerações e participou de eventos que colocaram Goiás no mapa da arte brasileira, como o I Congresso Nacional de Intelectuais, em 1954. Sua linguagem, ao mesmo tempo figurativa e moderna, rompeu com padrões acadêmicos e incorporou o cotidiano goiano às grandes narrativas.
 
Hoje, os afrescos estão entre as obras mais emblemáticas da arte mural no Brasil Central. Estão ali, no silêncio da antiga estação, como testemunhos de uma Goiânia que se construiu entre trilhos, pincéis e utopias. Que bom que sobreviveram. Melhor ainda é saber que, ao contar suas histórias, seguimos redescobrindo o centro da cidade — e de nós mesmos.


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