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Fabrícia  Hamu
Fabrícia Hamu

Jornalista formada pela UFG e mestre em Relações Internacionais pela Université de Liège (Bélgica) / fabriciahamu@hotmail.com

Gente que inspira

Mãe de todos

O amor dos pais de filhos com Síndrome de Down | 27.07.11 - 17:00 Mãe de todos Foto: Mauro Júnior

Coração de mãe não se engana. Naquela noite quente de 19 de setembro de 1995, a ansiedade da empresária Ana Maria Motta era maior do que nos outros dias. Para a família, a razão seria a proximidade do parto, pois ela já estava com 40 semanas de gravidez. Mas ao assistir na TV uma reportagem sobre a inauguração da piscina da Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) em Goiânia, Ana teve certeza que o motivo era outro. “Um dia ainda vou levar minha filha para brincar nesse lugar”, pensou.

Muito antes que Maria Thereza viesse ao mundo, Ana já sabia que seria mãe de uma criança com Síndrome de Down. “Era um pressentimento muito forte, quase uma certeza”, conta. Ao pegar o primeiro filho no colo e ouvir do médico que estava tudo bem, ela soube que não seria com Matheus. Ainda não seria dessa vez. Mas ao engravidar de novo, o tal pressentimento veio mais forte. E na naquela noite de setembro ela teve a confirmação de que as mães sentem e sabem mesmo de coisas que desafiam a lógica.

Ana recorda-se do silêncio na sala de parto quando Maria Thereza nasceu. “Ela não chorou e a equipe médica ficou tensa e calada”, lembra. Já no quarto, ao perguntar ao médico como estava o bebê, ela ouviu que seria mãe de uma criança especial. “Perguntei se minha filha tinha Síndrome de Down. Surpreso, ele quis saber quem havia me contado. Disse que ninguém precisava ter me dito, porque eu sempre soube”, explica. Ao pegar a pequena Maria Thereza nos braços, prometeu à ela que uma vida de lutas e alegrias começaria ali.

Em meio aos livros e explicações médicas, Ana descobriu que a Síndrome de Down é definida por uma alteração genética caracterizada pela presença de um terceiro cromossomo de número 21, o que também é chamado de trissomia do 21. Uma das características da deficiência é o funcionamento intelectual mais lento que a média, que se manifesta antes dos 18 anos. Além do déficit cognitivo e da dificuldade de comunicação, a pessoa com Síndrome de Down costuma apresentar redução do tônus muscular, cientificamente chamada de hipotonia.

Problemas na coluna, na tireoide, nos olhos e no aparelho digestivo também podem ser comuns, assim como as anomalias cardíacas. Mas nada disso impediu Ana de lutar para que Maria Thereza tivesse uma infância plena e feliz. E entre sessões de natação e fonoaudiologia, eis que ela engravida novamente, e o improvável (presente em uma chance de 1% de possibilidade) acontece: Pedro também nasce com Síndrome de Down. “Quando pensei que estava aprendendo a lidar com uma criança assim, me vi com duas”, diz.

Entretanto, a duplicidade que poderia reduzir pela metade o ânimo e a determinação de Ana teve efeito multiplicador. “Com Pedro, reforcei a convicção de que minha missão na vida era, de fato, lidar com a síndrome e fazer dessas crianças pessoas mais felizes”, constatou. O jeito encontrado por Ana para cumprir seu destino foi auxiliar os filhos a desenvolverem ao máximo seus potenciais intelectuais, emocionais, motores e físicos. Muita atenção, dedicação, alegria e, sobretudo, aceitação. “De nada adianta amar um filho, sem aceitá-lo como ele é”, justifica.

Ana percebeu que os pais de crianças e adolescentes com Síndrome de Down tinham amor de sobra, mas não aceitavam plenamente os filhos e tentavam poupá-los de tudo. “Eles não podem namorar, ir ao cinema, passear. É como se, por serem Down, não tivessem capacidade de se defender das pessoas e das situações e, por isso, não pudessem desfrutar da plenitude da vida”, diz. Na criação de Pedro e Maria Thereza, Ana e o marido provaram o contrário. A garota estuda, namora, vai a festas e adora música. O garoto toca piano com talento, estuda e convive com vários amigos.

Disposta a lutar para que outras crianças e jovens tenham esse mesmo direito, há três anos ela preside a Associação Down de Goiás (Asdown). “Não é fácil. Agora, por exemplo, estamos sem vários profissionais importantes na entidade, como fonoaudióloga e terapeuta ocupacional. Além disso, existe a dificuldade em conseguir mobilizar os pais, em fazê-los compreender a importância de participar ativamente da vida da Associação. Mas vale a muito a pena. Tudo o que já conseguimos, compensa o esforço”, reflete.

Para Ana, a luta dos pais de filhos com Síndrome de Down é coletiva e as vitórias mais saborosas, pois são compartilhadas. “Costumo dizer que quando você é mãe de um Down, é mãe de todos”, afirma. Questionada se sentia-se sobrecarregada pelo fato de ter dois filhos portadores da síndrome, a empresária gentilmente corrige a repórter. “Por favor, não os chame de portadores. Portador é quem carrega uma carga pesada, um fardo. Eu não trago nada disso comigo. Meus filhos são extremamente leves e felizes. Eles são Down, apenas isso”.
   
Maria Thereza e Pedro são como a água. Ela, por ser transparente, autêntica, expondo sem medo seus sentimentos e desejos. Ele por sua profundidade, com sensibilidade ímpar para as artes. Em ambos, Ana vê refletida sua imagem e as lições que os dois lhe passam diariamente. “Com meus filhos aprendo a viver sem pressa. É um dia de cada vez, comemorando cada vitória, por menor que seja”, conta. A empresária também diz que aprende com os filhos a superar constantemente seus medos. Afinal, como dizia Guimarães Rosa, o que a vida quer da gente é coragem.


Comentários

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  • 07.09.2011 15:23 Marcilene Santos

    Eu tenho o privilégio e a oportunidade de conviver com uma família em que uma das filhas é down. Imaginem uma menina esperta e inteligente? Multipliquem por mil (Rs). Uma figura! A alegria de todos nós. Parabéns Fabrícia e parabéns à todas as mães de crianças especiais, principalmente a Ana.

  • 18.08.2011 20:31 cintia carvalho

    É de pessoas como Ana que nossa sociedade precisa com este trabalho social efetivo e o amor que carrega no coração. Cintia Carvalho Terapeuta Holística

  • 17.08.2011 11:51 ketha

    Aninha que linda entrevista.Tenho certeza que muitas mães estarão se sentindo mais seguras com o teor da sua entrevista.Sua fala demonstrou leveza, sem preconceito e sem medo. Reafirmou a capacidade e habilidades que cada um apresenta. Cada um com seu jeito e sua forma de encarar o mundo.Downs me encantam e me cativam, Fico sempre em euforia perto de um. Eles são puros, sem amarras , destituidos dos ranços que os ditos normais carregam. Agradeço sempre ao nosso PAI MAIOR , a dádiva de ter tido a oportunidade de trabalhar com eles, pois me ensinaram muito!!!! Receba o meu abraço fraterno.

  • 16.08.2011 22:32 Jane D'Alma

    Parabéns pela matéria. Deus deu a nossa familia, esta dádiva em receber a Maria Tereza, o Pedro, e a Beatriz. Tenho também por outro lado, o Kauã, filho de meu afilhado... Abração Jane

  • 15.08.2011 19:04 eliana christina abrahao bruzzi

    Gostei muito do texto,nunca havia parado para pensar sobre o assunto. Parabens..

  • 12.08.2011 09:56 Olga França de Almeida

    "o que a vida quer da gente é coragem '...Ana, o que vc tem de sobra é muita coragem e amor pra dar. È um grande exemplo para todos nós!

  • 10.08.2011 12:57 Arlindo Profeta Dos Santos Neto

    Parabéns Ana Maria!! Agora e Minha vez de fazer minha parte com a Capoeira para Inclusão Social vamos que vamos.. Somos todos Iguais! Diga não ao Preconceito seja lá ele qual for..Parabéns pela coluna. Axé!!

  • 01.08.2011 09:47 Tatiana

    Oi Ana, parabéns pela reportagem maravilha, tenho maior satisfação em fazer parte da Asdwon la aprendi a saber de tudo que meu filho(Luan) precisa e através de você uma mãe guerreira hoje vejo o potencial que eles podem nós proporcionar.Continue assim mostrando para o mundo seu potencial. Abraços !

  • 31.07.2011 10:21 elizabeth

    Quem convive com a Ana sabe como é linda a sua vida e o seu trabalho frente a Asdown. Parabéns a todos. Aninha, siga em frente e conte sempre com o meu apoio.

  • 30.07.2011 12:43 Rubens Vieira

    Parabéns pela matéria Ana. É muito bom ter essa referência guerreira dando a cara e contando sua história prá uqme quiser ouvir. grande abraço RubensVieira www.specialkids.com.br

  • 29.07.2011 22:36 Sara

    ótimo texto!! excelente reportagem!! Sou suspeita de falar algo, pois admiro muito a Ana e adoro seus filhos....

  • 29.07.2011 21:23 lucia frança

    Linda reportagem a Ana como sempre bem espontanea,sou mãe de uma adolescente Down ela é um amor como todos os Down.

  • 29.07.2011 17:25 Maria Inêz Leite da Conceição

    Me disseram ser emocionante a reportagem, e é verdade. Eu como mãe de uma menina com Síndrome de Down, vejo está matéria como um aprendizado para mim. E me faz mergulhar no meu dia a dia com minha filha, desde o nascimento até hoje, e vejo que baseado no descrição que a Ana faz, sinto estar no caminho certo. Digo que sinto feliz de fazer parte da ASDOWN, como associada e ter Ana Maria como presidente da mesma. Parabéns, Ana.

  • 28.07.2011 16:18 Thaís Romão

    Vindo de uma das melhores jornalistas que conheço, eu não podia esperar nada mais sensível e emocionante para uma estreia. Acredito que teremos que preprar o coração para ler esse espaço, a cada postagem. Parabéns, Fabrícia! Texto sempre leve, até nos assuntos mais densos. Como você.

  • 28.07.2011 13:23 Sergio Paiva

    “De nada adianta amar um filho, sem aceitá-lo como ele é” - excelente texto e grande exemplo para todos, pais e filhos.

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Fabrícia Hamu

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