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Entrevista Marina Sant'Anna

Goiás é 9º Estado mais violento contra mulheres, diz pesquisa do MJ

CPMI investiga violência contra a mulher | 23.01.13 - 09:51
Michelle Rabelo

Goiânia
- Um relatório contendo o balanço de visitas e diligências feitas em 17 Estados, incluindo Goiás e Distrito Federal, pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Congresso Nacional que investiga a violência contra a mulher, será entregue em março de 2013. A data foi escolhida pela comemoração ao Dia Internacional da Mulher. Mesmo com esforços crescentes, integrantes da Comissão garantem que ainda precisa-se melhorar muito o que diz respeito aos direitos da mulher.

A Comissão já esteve no Distrito Federal, Pernambuco, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Alagoas, Paraná, São Paulo, Bahia, Paraíba, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Pará, Roraima, Ceará e Goiás.


 
O documento de março deve trazer o diagnóstico da realidade de violência contra a mulher no Brasil, sugerindo a adoção de determinadas políticas públicas para a reversão dos pontos negativos. Falta de pessoal especializado, Estado carente de delegacias de atendimento à mulher e inexistência de casas-abrigo públicas em Goiás foram alguns pontos problemáticos destacados por integrantes da CPMI que investiga a violência contra a mulher no Brasil.

Violência
A Comissão listou as 15 cidades onde mais se registra violência contra mulheres em Goiás. Dentre elas, três estão situadas na Região Metropolitana de Goiânia. Senador Canedo, que ocupa a 7ª posição, registra o maior número de assassinatos contra a população feminina: são 7,1 mortes para um grupo de 100 mil habitantes. Goiânia aparece em 9º lugar, com taxa de 6,3 mortes e Aparecida de Goiânia em 13º, com taxa 3,9 por 10 mil habitantes.



Segundo a deputada federal Marina Sant’Anna (PT-GO), integrante da Comissão, o relatorio é muito importante no enfrentamento real de todos os tipos de violência contra a mulher. Confira entrevista de Marina concedida ao jornal A Redação.


 
A Redação - O relatório das visitas feitas pela CPMI das mulheres será entregue em março de 2013. Qual a expectativa sobre Goiás nos resultados?
Marina Sant'Anna
- O Estado de Goiás ocupa a 9ª posição entre os estados brasileiros em assassinatos de mulheres, com taxa de 5,7 para grupo de 100 mil mulheres. O primeiro colocado é o Estado do Espírito Santo (9,8 mortes), o segundo Alagoas (8,3) e o Paraná aparece na terceira colocação (6,4). Em Goiânia, a taxa cresce e sinaliza 6,8 assassinatos para grupo de 100 mil mulheres. A cidade é a 9ª entre as capitais do País em homicídios de mulheres. Esses dados são do Mapa da Violência 2012, elaborado pelo Instituto Sangari/Ministério da Justiça. Os municípios com maiores números de assassinatos no Estado são: Formosa, Jataí, Valparaíso de Goiás, Rio Verde e Águas Lindas de Goiás. Esse cenário requer medidas urgentes e concretas. Nossa expectativa, portanto, é de que o relatório da CPMI – com o diagnóstico do quadro de violência contra a mulher em todo o País, e também em Goiás – aponte rumos para políticas públicas concretas que possam dar um basta na violência contra a mulher.

AR - Qual a importância prática deste relatório na prática?
Marina Sant'Anna - A CPMI já esteve em 18 Estados: Distrito Federal, Pernambuco, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Alagoas, Paraná, São Paulo, Bahia, Paraíba, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Pará, Roraima, Ceará e Goiás. O relatório é importante porque trará um diagnóstico da realidade de violência contra a mulher no Brasil – o que foi constatado de ruim e de boas práticas nos equipamentos e rede de atendimento à mulher – bem como apontamentos do que é ideal diante do quadro encontrado e sugestões de políticas públicas para a reversão dessa realidade. Recomendações aos órgãos competentes sobre a aplicabilidade da legislação, de forma especial, da Lei Maria da Penha, também constarão do relatório. Na prática, também ofereceremos alterações, se e quando necessárias, à legislação que diz respeito à violência contra a mulher (Grupo de Trabalho que coordeno na CPMI) e estamos elaborando orientação, via outro grupo de trabalho, para as destinações orçamentárias em todos os níveis.
 
AR - Na ocasião serão sugeridas políticas públicas. O que falta em Goiás no que diz respeito ao combate da violência sexual, assim como em toda a violência contra a mulher?
Marina Sant'Anna - Em diligências e audiência públicas que fizemos no final do ano passado em Goiás, foi possível verificar que a rede de assistência às vítimas de violência doméstica e familiar está longe do ideal. É preciso que o Poder Judiciário imprima em todo o território as Varas Especializadas, que as prefeituras cumpram o que é de sua responsabilidade e o Estado proporcione atendimento em rede para a prevenção e para a adoção de medidas relativas à segurança pública, dotando as delegacias das mínimas condições necessárias para o atendimento e oferecendo os equipamentos para os/as profissionais que atuam na área. Ademais, a Defensoria Pública precisa estar disponibilizada.

"Falta pessoal especializado, as poucas delegacias de atendimento à mulher estão
sucateadas e inexistem alguns equipamentos como casas abrigos públicas"

Marina Sant'Anna

Chamo a atenção para a situação em cidades do entorno do Distrito Federal. Falta pessoal especializado, as poucas delegacias de atendimento à mulher estão sucateadas e inexistem alguns equipamentos como casas abrigos públicas. Visitamos delegacias especializadas no atendimento à mulher (DEAMs), Vara Especializadas, Instituto Médico Legal (IML) de Formosa. A estrutura de atendimento é precária, principalmente em Luziânia, Valparaíso, Planaltina e Formosa. Em Planaltina de Goiás, a delegacia de mulher só tem uma escrivã e o mesmo delegado que atende à delegacia comum atende a delegacia da mulher. A mulher que sofre violência passa por uma verdadeira via crucis.

Um outro problema é a situação das mulheres encarceradas.  Há apenas um presídio feminino no Estado. Nos demais municípios as detentas estão em alas adaptadas.  De acordo com relatório do Fórum Goiano de Mulheres, entregue à CPMI, o presídio feminino e as cadeias não possuem espaços adequados para mulheres grávidas, ou que tenham filhos em idade de amamentação. É comum dividirem-se em celas que já se encontram acima de sua capacidade máxima. Segundo o documento, as próprias presas denunciaram, em 2007, as condições da ala feminina do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. São problemas relacionados à qualidade da água, alimentação, instalações, superlotação, saúde, segurança, violação de direitos humanos. O quadro atual da ala 3-A, ala feminina da CPP, segundo o Fórum, pouco se alterou.

"Um outro problema é a situação das mulheres encarceradas.  Há apenas um presídio 
feminino no Estado. Nos demais municípios as detentas estão em alas adaptadas"

Marina Sant'Anna
 
Então, falta quase tudo em Goiás nesse campo. Do jeito que está não pode continuar. A tarefa da CPMI ela está cumprindo: denunciar os problemas e apresentar propostas para a superação dessa condição.

AR - Durante os anos de militância, você notou melhora no tratamento dos casos de estupro? É possível prevenir?
Marina Sant'Anna - Tem melhorado o número de denúncias de crimes de abuso e violência sexual à medida em que são ampliadas as redes de apoio e proteção. À medida que as vítimas são ouvidas, respeitadas, protegidas, têm para onde ir, naturalmente procuram o poder público para impedir a continuidade do estado de violência e para exigir punição. As mulheres têm acreditado na Lei Maria da Penha e nas campanhas por denúncia de crimes sexuais, mas em sua grande maioria, ainda não encontram todo o respaldo necessário.

AR - Além de detectar problemas e trazer à tona dados, qual a importância da prevenção. É possível falar sobre violência sexual e não sexual com jovens e crianças?
Marina Sant'Anna -  A violência sexual contra jovens e crianças ocorre em todo o país, como em outras partes do mundo. É violência que às vezes é feita individualmente (vizinhos, parentes, pais...) ou em redes criminosas, que vai do tráfico de pessoas, turismo sexual, via internet, articulado com outros crimes realizados em quadrilha. Desde a aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a educação sexual nas escolas, os direitos das crianças são objetos cada vez mais tratados pela sociedade de modo organizado. A maior parte da violência sexual contra criança ocorre dentro de casa, o que facilita a ameaça constante à crianças e adolescentes, porque o agressor tem autoridade no ambiente familiar e impõe facilmente o temor à vítima.

Quanto mais crianças e adolescentes recebem a atenção de professores e outros profissionais nas escolas, no atendimento à saúde, quanto mais há processamento e punição, mais os ambientes tendem a ser saudáveis, uma vez que, ao perceber a possibilidade de agressão, a vítima poderá estar mais informada, ou uma pessoa adulta responsável, e tomar providências.

AR - Poderia citar um caso emblemático que tenha marcado sua trajetória?
Marina Sant'Anna -  Todos os casos renovam o meu compromisso com essa luta. Mulheres assassinadas no Brasil, em todos os lugares. Os casos de estupro na Índia. As mulheres que buscam o Centro de Valorização da Mulher (Cevam) ou a delegacia mulher, todos esses casos me marcam profundamente. Até porque não há desculpa, não há justificativa para a violência, geralmente premeditada, contra as mulheres. Por exemplo, o caso mais recente, dessa semana, divulgado pela imprensa, em que uma mulher de 31 anos, morreu no Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo), onde estava internada em estado grave depois de ter sido espancada pelo marido. Isso é abominável e precisa ser evitado.

AR - Quais as causas são apontadas pelos altos índices de violência em Goiás? Porque muitas mulheres ainda tratam o tema como tabu?
Marina Sant'Anna -  O Estado de Goiás tem sido palco de seríssimos casos de violação dos direitos humanos. São dezenas de pessoas mortas ou desaparecidas, com denúncias de envolvimento de segmentos da própria polícia, ou seja, o braço do Estado está contaminado. O criminoso ou o agressor, diante dessa situação, sente-se confortável, acreditando que a impunidade é que é a norma, um absurdo e uma inversão de valores em se falando de Estado Democrático de Direito.

Não vejo que as mulheres em situação de violência tratam a questão como um tabu. É impunidade, é não haver ainda as condições necessárias para a mulher e seus filhos no pós-denúncia. Na maioria dos lugares, ela retorna da delegacia à convivência com o agressor, que lhe faz ameaças e utiliza de expedientes de tortura. Hoje as mulheres falam da violência com temor, quando não têm apoio para sair da roda de violência, considerada conceitualmente dentro dos marcos da Lei Maria da Penha, mas a maioria trata do assunto com tranquilidade, desde o assédio moral até ameaças e violência física.
É preciso ter casas abrigo, apoio para a mulher se profissionalizar. É preciso criar redes de atendimento que envolvam os diversos órgãos, não apenas de segurança, mas de assistência à saúde da mulher, a sociedade civil organizada, de tal modo que a mulher sinta-se protegida e tenha a coragem de denunciar, tomar iniciativas, sabendo que no momento seguinte não voltará a ser violentada ou assassinada.

"É preciso criar redes de atendimento que envolvam os diversos órgãos,
não apenas de segurança,  mas de assistência à saúde da mulher" 

Marina Sant'Anna

Acredito que esse cenário está mudando. Hoje as mulheres são as que mais estão estudando, se informando, se profissionalizando e buscando novas perspectivas. E a tendência é avançarmos.

AR - O que pode ser feito para estimular as denúncias?
Marina Sant'Anna -  Seja no ambiente doméstico, nos presídios femininos, no ambiente de trabalho, há um acúmulo de casos de violência ocorrendo todo dia. Pesquisa da Fundação Perseu Abramo revela que 43% das mulheres já foram vítimas de algum tipo de violência doméstica e a cada 25 segundos uma mulher é espancada no Brasil. Então, motivos para denunciar não faltam. É de indignar qualquer um.
Penso que o que falta mesmo é um sistema de segurança confiável e uma rede integrada de apoio à mulher e aos filhos, como já disse, que possibilite à mulher denunciar e saber que terá proteção e apoio. E falo de algo factível. A rede de apoio do Distrito Federal, por exemplo, é modelo. O DF registra 1,7 assassinatos em um universo de 100 de mulheres, o que está abaixo do índice nacional. Têm estados em que 15 mulheres são assassinadas a cada 100 mil. Então, onde não há rede de proteção, onde o município e o Estado não fazem a sua parte, as mulheres ficam expostas e sem ter a quem recorrer.

AR - A luta contra a violência sexual tem conseguido mais visibilidade nos últimos anos?
Marina Sant'Anna -  Ah, sim! Especialmente a partir da vigência da Lei Maria da Penha, durante o governo do Presidente Lula. A lei prevê que os agressores sejam presos em flagrante ou tenham prisão preventiva decretada, aumentou a pena máxima de um para três anos de detenção e acabou com o pagamento de cestas básicas como forma de fiança. Mas é preciso dar celeridade aos julgamentos dos casos e mobilizar a sociedade brasileira para o enfrentamento da violência contra as mulheres.

Outro importante serviço que dá visibilidade a essa luta é a Central de Atendimento às Mulheres (Ligue 180), da Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM), que já recebeu quase três milhões de denúncias desde a sanção da Lei Maria da Penha. Somente em 2012, foram 561.298 atendimentos entre janeiro e setembro. Desse total, 68.396 foram denúncias de violência, majoritariamente física (38.535). É importante salientar que, de acordo com a Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República (SPM), 27.638 mulheres relataram sofrê-la diariamente, e 19.723 se perceberam em risco de morte. Em 25.329 casos, os filhos presenciaram ataques à mãe. As agressões às mulheres, quando denunciadas, têm amparo legal para providências. Essas e outras medidas refletem o novo Brasil que, juntos, estamos construindo.

A criação de secretarias da mulher nas prefeituras e nos Estados também é relevante, pois chama a atenção para a necessidade de elaboração e execução de políticas públicas dirigidas à mulher, claro, sempre compreendendo a necessidade de que sejam políticas integradas.


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