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Fabrícia Hamu
Fabrícia Hamu

Jornalista formada pela UFG e mestre em Relações Internacionais pela Université de Liège (Bélgica) / fabriciahamu@hotmail.com / jornalistas@aredacao.com.br

Inspiração

A morte e o milagre da multiplicação

| 28.04.17 - 09:06
Querido Pedro,
 
Relutei tanto em escrever este texto. Sua tristeza dói em mim e é impossível ignorá-la. Difícil falar sobre perdas. Principalmente de perdas definitivas. Ainda mais sobre perdas definitivas de mães. Muito mais sobre perdas definitivas de mães, faltando apenas dois domingos para se comemorar... o Dia das Mães.
 
Queria dizer que imagino o tamanho da sua dor, mas é mentira. Porque ela deve ser tão imensa e imperativa, que simplesmente não consigo alcançá-la. O único exercício de imaginação que me é possível neste momento, é pensar em você chorando no seu quarto. Baixinho, sofrido, torcendo para passar logo.
 
Não vai passar, meu querido. Não quero ser cruel, mas essas coisas não se acabam. Aqueles que amamos e que partem antes de nós mudam de mundo, mas não se mudam de dentro de nós. Estarão para sempre em nossos corações, marcados feito tatuagem. Vamos carregá-los pela eternidade.
 
Acredito que a única coisa que, de fato, mude, seja a forma de amar quem vai embora. Em vida, aprendemos a amar a voz, o toque, o imagem, o calor. E quando tudo isso é levado pela morte, parece que não há mais nada. Mas há. E por mais insano que pareça, isso se dá pelo milagre da multiplicação.
 
Não sei se você percebeu quantos abraços e manifestações de afeto você tem recebido desde a morte da sua mãe. São tantos e tão sinceros. Eles não são fruto de uma mera empatia momentânea, mas da nossa profunda necessidade de demonstrarmos o quanto gostamos de você, e como queremos vê-lo bem.
 
Numa outra situação, provavelmente isso não aconteceria. Você estaria tão fechado em seu próprio mundo, tão ocupado com suas várias atividades, que ficaríamos constrangidos de dar uma cutucada para te lembrar como te queremos bem. Acharíamos, inclusive, que você nem precisaria desse lembrete.
 
Mas agora, com essa dor tão dilacerante, vimos o caminho aberto para chegar até seu coração. As tantas barreiras que haviam entre nós caíram por terra, e conseguimos, por fim, acessar sua alma. Tivemos a rara oportunidade de fazer com que você verdadeiramente sentisse nosso toque; nossa voz; nosso calor. 
 
Sabe, a morte tem dessas coisas. Ela nos arranca tudo o que supérfluo e passageiro, e nos obriga a buscar o que é real e imprescindível. As obrigações do dia a dia, as pequenas disputas, as mesquinharias, as raivas que brotam de discussões bobas, a necessidade de mostrar que não precisamos de ninguém: tudo isso perde a importância. 
 
Antes você ouvia a voz dela. Tinha o toque dela. A imagem dela. O cheiro dela. Agora tem o nosso. Não é a mesma coisa. Nem poderia - aliás, nem deveria. Porque se a morte tem mesmo algum sentindo, é nos ensinar a urgência de amar. E a cada vez que um de nós se aproxima de você, te lembramos disso.
 
Sua mãezinha se multiplicou em amigos que te amam como irmãos. Que querem te ver bem. Que se alegram com sua alegria e se angustiam com sua tristeza. A morte faz milagres. O milagre da multiplicação. Somos vários pedacinhos de afeto, que querem curar esse coração partido e ajudá-lo a bater inteiro outra vez.
 
Quando sentir muita saudade dela; a lembrança machucar seu peito; uma foto, uma palavra ou data maltratarem o que ainda resta do seu frágil equilíbrio, estaremos bem ali, prontos para te acolher. E você estará tão vulnerável, que vai se deixar abraçar. E nosso calor vai te acalmar. E a dor vai diminuir. E você vai recomeçar.
 
Quando voltar de uma viagem incrível; se apaixonar por alguém; quiser falar bobagem ou comer bolo: também estaremos bem ali. E porque você permitiu, não se defendeu nem se esquivou, vamos te lembrar, de novo, que somos todos pedaços de afeto. Vários pedaços juntos, para reconstruir o mosaico do seu coração.
 
E depois que tudo isso passar, por favor, não nos afaste de novo. Permita que o milagre da multiplicação permaneça na sua vida. Nessa hora, sua mãezinha vai te olhar feliz, lá do céu, porque terá a certeza de que você aprendeu a lição: amor, quanto mais a gente divide, mais tem. Muda de forma, de nome, mas é sempre amor.
 
Um dia você postou um pedaço da letra da música do Gonzaguinha: “Diga lá, meu coração/Que ela está dentro em peito e bem guardada/ E que é preciso/ Mais que nunca/ Prosseguir...”. Nós prosseguiremos contigo, meu querido. Você terá muitos passos ao seu lado nessa caminhada.  
 
Um abraço,
 
Fabrícia
 
P.S 1 – Leia este texto ouvindo “Diga lá, coração”, com Gonzaguinha;
P.S 2- Texto baseado em carta do leitor, cujo nome foi trocado para preservar sua privacidade.

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Fabrícia Hamu

Jornalista formada pela UFG e mestre em Relações Internacionais pela Université de Liège (Bélgica) / fabriciahamu@hotmail.com / jornalistas@aredacao.com.br

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