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Fabrícia Hamu
Fabrícia Hamu

Jornalista formada pela UFG e mestre em Relações Internacionais pela Université de Liège (Bélgica) / fabriciahamu@hotmail.com / jornalistas@aredacao.com.br

Inspiração

Por uma vida mais ordinária

| 31.03.17 - 14:52
 
Querido Lucas,
 
Há um tempo você me pediu para escrever um texto sobre essa música. Eu nunca havia escutado “Wasting my Young years”, do London Grammar. Graças a você, eu ouvi. E gostei. Concordo quando você diz que “daria uma bela reflexão”. É sobre a minha história. A sua. A história da nossa geração. 
 
Estamos desperdiçando nossa juventude perseguindo o primeiro milhão que nos fizeram crer que deveríamos ganhar até os 30 anos. Aquele primeiro milhão que Mark Zuckerberg parece ter ganhado tão fácil, e que nós, que enlouquecidamente estudamos, lemos e nos aperfeiçoamos, “fracassamos” em não alcançar. 
 
E enquanto lamentamos nossa suposta “miséria”, deixamos de valorizar nossas conquistas profissionais e quem nos ajuda a obtê-las – os colegas que trabalham conosco, nos respeitam e estão dispostos a enfrentar novos desafios ao nosso lado; os clientes, patrões ou parceiros que enxergam nosso talento e apostam em nossas ideias; as experiências que acumulamos e que engrandecem não apenas nossos currículos, mas nossas vidas. 
 
Desperdiçamos nossos anos de juventude odiando nossos corpos, que julgamos estar fora do peso ideal, flácidos e com bronzeado de escritório. O espelho nos parece muito cruel. E então deixamos de celebrar não tanto a ausência de rugas e cabelos brancos, mas principalmente a autonomia e a energia que ainda temos de sobra; nossa diversidade que nos torna únicos e interessantes, e que não deveria morrer na pasteurização da ditadura da beleza.
 
Nossa juventude se esvai em toneladas de relatórios, planilhas de Excel, apresentações de tirar o fôlego e reuniões para dominar o mundo. Dez, doze horas por dia fazendo isso. Às vezes, fazendo somente isso. E nossa criatividade escorre pelos dedos e morre lentamente. Ela não sobrevive onde não há pausas. 
 
Perseguimos a ideia ilusória de aproveitar cada segundo do dia. E então desperdiçamos nossos anos de juventude adquirindo a habilidade de nos tornarmos cada vez mais ocupados e menos produtivos. Mais tarde, oprimidos por tantas tarefas, temos de manejar com destreza a capacidade de tomar vários remédios para conseguir sair da cama, e também para nos deitarmos nela.  
 
Nossos anos de juventude se perdem na busca do orgasmo fantástico, da paixão avassaladora. E enquanto procuramos os fogos de artifício que deveríamos ouvir durante o sexo, deixamos de perceber o som reconfortante da voz de quem nos ama sem que tenhamos de fazer nenhum malabarismo. E não o valorizamos, porque nos ensinaram que amor bom é amor difícil, suado para ser conquistado e mantido.
 
Você não nasceu para a acomodação, eu sei. Deve estar se perguntando se estou fazendo uma ode à mediocridade. Te respondo que não. Minha ode é à possibilidade, ao desfrute das oportunidades que o momento presente nos oferece, e que não conseguimos ver porque estamos demasiadamente focados em desejar o que ainda virá e angustiados demais remoendo o que não deu certo. Se essa é a ideia de vida extraordinária que nos venderam, eu rejeito. Prefiro uma vida mais ordinária. 
 
Queria que a gente combinasse de não mais gastar nossa juventude em selinhos insípidos; abraços frouxos; esbarrões em pessoas que não vemos porque estamos mexendo no celular; crises de estafa e ansiedade porque não sabemos a hora de parar; desprezo pela carreira que estamos duramente conquistando; comparações inúteis, que somente nos desgastam e desmerecem nosso potencial.
 
Te proponho que a gente não pare, mas vá com calma. Que tenhamos calma para apreciar a paisagem; sentir o cheiro e o gosto de quem amamos; curtir cada conquista no trabalho; tomar uma cerveja com os amigos e rir até passar mal das bobagens que eles nos falam; aproveitar as viagens que cuidadosamente planejamos; julgar com mais serenidade e amorosidade nossas próprias falhas e os erros alheios; abraçar em plenitude nossos lados de luz e sombra. 
 
Talvez você me diga que apenas a maturidade traz tudo isso e que impossível ser jovem e ter consciência dessas coisas. Acho que não. A gente pode aprender com as experiências dos outros e também com a nossa própria. Basta olhar ao redor, inclusive do próprio umbigo. Está pulando na nossa cara, estampado em pop ups e mensagens de WhatsApp, o que não funciona. Felizmente, ainda há tempo para mudar. 
 
Vamos respirar bem fundo e ter esperança. Porque se você quer saber, é isso o que define a juventude. Essa espera baseada na crença de que um desejo pode se tornar realidade é que difere um espírito jovial de um envelhecido. Não basta lutar pela vida, também é preciso conservar esse sentimento de que a espera pelo que batalhamos vale a pena. Ao final, não é sobre quantos anos temos ou a velocidade com que eles passam, mas sobre o sentido que damos a eles. 
 
Um abraço com saudades,
 
Fabrícia
 
P.S 1 – Leia este texto ouvindo “Wasting my Young years”, do London Grammar;
P.S 2- Texto baseado em carta do leitor, cujo nome foi trocado para preservar sua privacidade. 

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