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Eliane de Carvalho
Eliane de Carvalho

Jornalista formada pela UFG, mestre em Relações Internacionais pela Universidade Autônoma de Barcelona (UAB), onde mora há 5 anos / eliane@aredacao.com.br

Internacional

Pequim, poder sem limites

De Pequim, emana o poder | 21.09.11 - 12:12 Pequim, poder sem limites Foto: Eliane de Carvalho


De Pequim, emana o poder para toda a China! É de onde saem as decisões baseadas em um modelo que funde o comunismo com o capitalismo.

 
Um governo que exerce um controle político tão feroz sobre o Congresso, que não deixa margem à lentidão legislativa. Uma centralização tamanha de poder, que dispensa a necessidade de aprovação de leis, através de um autêntico parlamento. O monopólio do poder é a base da estabilidade atual. 
 
Os chineses definem seu sistema de governo como democracia popular de um só partido, o Partido Comunista Chinês (PCCh). Uma noção distorcida de democracia, que pressupõe  pluralismo de idéias e representação, defendida por uma ditadura absolutista. 
 
Um governo que intervem na economia, canaliza os recursos públicos para setores estratégicos, controla o crédito bancário e mantém laços apertados entre dirigentes políticos e empresariais. 
 
Um dos aspectos mais marcantes da estratégia de modernização do país é a abertura à economia global. Este processo vem de longe! Começou logo após o período comandado por Mao Tsé-Tung, com a segunda geração de dirigentes comunistas chineses, encabeçada por Deng Xiaoping, em 1976. A partir daí, o foco deixou de ser a luta de classes e se centrou no desenvolvimento econômico, com o desafio de incorporar a economia de mercado ao marco socialista. 
 
Em mais de 30 anos de abertura, empresários europeus e americanos investiram mais de 130 bilhões de dólares e dinamizaram a economia chinesa, a um ritmo sem precedentes. Entre as 500 empresas mais importantes do mundo, a maioria está representada na China, segundo a classificação da revista Fortune.
 
Mas os entusiastas da Ásia conferem aos regimes autoritários da região e às suas estratégias econômicas intervencionistas um crédito exagerado em matéria de crescimento e estabilidade. É preciso lembrar o caso da Birmânia, onde o regime foi capaz de destruir uma das economias mais promissoras da Ásia. 
 
O atual presidente da República Popular da China e secretário geral do PCCh é Hu Jintao, que tem como prioridade o desenvolvimento científico. Hintao compõe a quarta geração de líderes comunistas, considerada mais populista que as anteriores e que converteu a China na segunda economia do mundo, depois de superar o Japão. 
 
Em 2012, mudará o governo. No segundo semestre, o PCCh nomeará um novo presidente, primeiro ministro e outros altos dirigentes. Nos três órgãos de direção mais importantes da China, cerca de 70% dos componentes serão substituidos, principalmente devido à idade avançada, e esta próxima transição será, provavelmente, a maior das três últimas décadas.
 
Quem dá as cartas
O PCCh é e manda no governo. O partido controla, através de comissões especiais, funções fundamentais do Estado, como defesa, segurança pública, liberdade ideológica e diplomacia. Setores que nem sequer o Conselho de Estado, encabeçado pelo presidente, tem acesso, apesar de que alguns ministros integram as comissões. 
 
O nacionalismo é uma das marcas do governo chinês. Nas escolas, alguns livros oferecem textos bastante críticos  ao ocidente e Japão e um dos resultados foi apontado na pesquisa de opinião Pew, que revelou que 80% dos chineses têm uma imagem muito negativa sobre o Japão. 
 
Seguindo a vertente nacionalista, poucos países asiáticos acolhem imigrantes. Na China, é quase impossível que um estrangeiro se converta em um cidadão nacional. 
 
Se o país se mantiver como uma das principais economias do mundo, é possível que o centralismo político siga triunfando. Mesmo que a economia siga com um crescimento de cerca de 10% ao ano, não se pode esquecer dos desequilíbrios ecológicos e sociais. Estudos independentes do Credit Suisse revelam que os mais ricos recebem 65 vezes mais que os mais pobres e o governo reconhece que 150 milhões de chineses vivem com menos de um dólar por dia. 
 
É fato que a Ásia é o motor da economia mundial e caso se mantenham as trajetórias atuais de crescimento, em 2025, a China superará os Estados Unidos como a maior economia do mundo, seguida pela Índia. 
 
Também é uma realidade que o valor da economia dos Estados Unidos é três vezes maior  que o da chinesa. Além do que, Estados Unidos, França e Grã Bretanha juntas possuem o único exército capaz de projetar sua força longe de suas fronteiras. O ocidente ainda domina as novas indústrias, como a biotecnologia e as energias renováveis. As barreiras à imigração nos países asiáticos são obstáculos ao fluxo de novas idéias no mundo empresarial e à formação de universidades de ponta. As escolas americanas e inglesas, lotadas de imigrantes e fundos, dominam os cem primeiros centros de conhecimentos. Harvard, Oxford e Cambrigde estão situados entre os dez primeiros e a Ásia não tem representantes nesta lista. 
 
O mundo ainda confia no ocidente, mais que em qualquer outra potência destacada, apesar de todos os erros da era Bush. Atualmente, são os países ocidentais que apresentam capacidade de trabalhar em favor dos interesses comuns globais, como a segurança internacional, comércio livre e justo e respeito aos direitos humanos,  ainda que com muitas falhas. 
 
Massacre no teto do mundo
Quando me refiro aos direitos humanos, como um interesse comum global, acredito ser de fundamental importância lembrar o massacre diário dos tibetanos pelos chineses. A China invadiu o Tibet em 1959 e em mais de meio século de ocupação promove a extinção da cultura, religião e povo tibetano. A população está proibida de expressar sua fé e quando o faz é punida. Aqueles que se manifestam pela libertação da região são presos, torturados e muitas vezes mortos. Mulheres são violadas sistematicamente. O governo chinês estimula a imigração e hoje o número de chineses no Tibet, já é maior que dos próprios tibetanos.
 
Apesar dos esforços do Dalai Lama, líder religioso do Tibet, o massacre nunca teve grande visibilidade mundial, até que a China foi escolhida como sede dos jogos olímpicos de 2008. Em março daquele ano, milhares de monges budistas e cidadãos tibetanos iniciaram um movimento pela liberação do Tibet, sem precedentes na história do país. Meios de comunicação de prestígio internacional mostraram durante meses, as imagens da dura repressão da polícia chinesa às manifestações, seguidas de prisões, torturas e mortes. 
 
Dalai Lama vive exilado na Índia, desde a ocupação. Durante cinco décadas, deu voz, visibilidade e esperança  aquele povo. Formou um governo tibetano, no exílio, e além de guia religioso, era o líder político do país. Em agosto, Dalai Lama anunciou sua retirada da vida política. Lobsang Sanjay ,de 43 anos, advogado e acadêmico de Harvard, foi eleito primeiro ministro do governo tibetano, com sede em Dharamsala, no norte da Índia, pela comunidade tibetana no exílio. 
 
O governo chinês acusa Dalai Lama de incitar os distúrbios internos e o classifica como terrorista, apesar do líder religioso ter uma história de vida ligada a defesa da não violência e por isso ter conquistado o prêmio Nobel da Paz, em 1989.
 
Em 2009, um ano depois da repressão às manifestações tibetanas, o problema se repetiu na região autônoma de Xingiang, no sul da China, ocupada pelos chineses em 1949 e desde então, em guerra civil . A revolta em Urumqi,  capital de Xingiang e maior cidade de toda a Ásia central, resultou em 300 mortos e mais de 1500 presos.  
 
Há décadas, o governo chinês extrai minerais e petróleo de Xinjiang e Tibet, mas também investe na economia e infra-estrutura destas regiões. Apesar da propaganda chinesa destacar uma integração harmoniosa, a população destas duas regiões regiões autônomas apresenta índices muito inferiores de educação, saúde e mortalidade em relação aos chineses.  Estes dois conflitos e as respostas de Beijing às tensões indicam a fragilidade da coesão interna da China. 
 
Apesar do controle chinês sobre os meios de comunicação, o surgimento das novas tecnologias e a criação do Twitter, Skype e Youtube permitiram a difusão das imagens desses conflitos, na China e em todo o mundo, de maneira estantânea, e chamaram a atenção para problemas humanitários esquecidos. 
 
Também foram as novas tecnologias de comunicação, que levaram ao conhecimento público, as prisões de intelectuais e artistas chineses, críticos ao governo. Um dos casos de maior visibilidade, foi a detenção do artista Ai Wei Wei, que teve o ateliê destruído e amargou meses na cadeia. Estas detenções se tornaram mais frequentes, depois das revoltas nos países árabes e a preocupação, por parte do governo chinês, de que o problema se alastrasse pelo país. 
 
A China e o mundo
Nas últimas décadas, a política exterior da República Popular da China foi conciliatória em muitos casos. Nos anos 60, assinou tratados de fronteira com a Birmânia, Nepal, Coréia do Norte, Mongólia e Afeganistão, depois de ceder percentuais significativos das zonas em disputa. Nos anos 90, outros tratados foram negociados com Laos e Vietnã, só para citar alguns exemplos, com o mesmo comportamento do governo chinês, que seguia a estratégia do desenvolvimento pacífico, com objetivo de dissuadir a resistência e união dos adversários.
 
Mas a partir de 2008, houve uma mudança radical, talvez como consequência da melhora da posição relativa da China, no mundo, devido à crise econômica ocidental. Os embates territoriais da China com a Índia e Japão, há muito tempo represados, se reativaram e se somaram às disputas marítimas com a Malásia, Filipinas e, principalmente, Vietnã. A diplomacia chinesa se tornou muito mais ativa e o governo aumentou os gastos com defesa em quase duas vezes mais que o crescimento do PIB. Com estas medidas, não demorou para que  crescimento chinês passasse a ser visto com preocupação e até alarme. 
 
Os governos da Índia, Japão, Coréia do Sul, Singapura e Vietnã estão mais vigilantes que antes e mais centrados em segurança, que em comércio. Cada um desses países também melhorou suas relações com os Estados Unidos, advertidos publicamente para que não interferissem em nenhuma disputa sobre o mar da China Meridional, onde Beijing reclama soberania. 
 
Os problemas históricos entre China e Taiwan também repercutem nas relações com os EUA. Apesar dos fortes vínculos econômicos entre China e Taiwan, com importantes investimentos mútuos e assinatura de um acordo de cooperação econômica, o diálogo político segue sem agenda. A China não abandonou a idéia do uso da força contra Taiwan, que mantém regimes político, econômico e social próprios. Os mísseis na costa chinesa continuam apontados para Taiwan, com o objetivo de impedir um apoio americano à ilha “rebelde”, em caso de um conflito, e Taiwan mantém o abastecimento de armas, compradas dos EUA, para assegurar a capacidade de auto-defesa. 
 
Não se pode dizer que a prudência seja uma das características da atual ordem mundial, mas a dissuação nuclear é um obstáculo sólido contra qualquer guerra entre potenciais nucleares. A redução de armas para a manutenção da dissuação nuclear, por parte da China, é improvável. Mas só uma política militar recessiva e uma diplomacia conciliatória poderiam equilibrar os crescimentos econômico e tecnológico sem prescendentes, na China. 
 
Visto de uma outra perspectiva, o país só se modernizará, de verdade, quando puder equilibrar o desenvolvimento econômico com o progresso da sociedade. Fazer da justiça social uma realidade, assegurar as liberdades constitucionais para todos e democratizar a vida política.

Comentários

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  • 23.09.2011 12:01 Rosane

    Obrigada por colocar em evidência a injustiça social e o governo repressor da China, quando a mídia ressalta tanto seu 'desenvolvimento econômico' como se fosse mérito e trunfo de governo 'exemplar'!!! O mundo precisa se rebelar contra esses descalabros da vida política e assegurar os direitos civis de todo ser humano, sem discriminação qualquer! Parabéns mais uma vez pelo excelente texto!!!!

  • 22.09.2011 22:14 João Carlos

    Adorei este texto. Obrigado pela leitura, Eliane.

  • 22.09.2011 20:17 cristiane

    ótimo texto!Incrível a repressão na China nessa época de tanta informação via internet!Só mesmo uma potência tão forte p/ intimidar os protestos do mundo inteiro!

  • 21.09.2011 21:45 Francisco Cabral

    Olá, Eliane! Que bom rever minha colega de sala dos tempos do velho ICHL! E ainda mais com um textaço deste como bônus! Gostei demais, embora discorde em parte do seguinte trecho: "O mundo ainda confia no ocidente, mais que em qualquer outra potência destacada, apesar de todos os erros da era Bush. Atualmente, são os países ocidentais que apresentam capacidade de trabalhar em favor dos interesses comuns globais, como a segurança internacional, comércio livre e justo e respeito aos direitos humanos, ainda que com muitas falhas". Discordo caso o ocidente citado não seja o ocidente geográfico, mas o político-ideológico, pois o ocidente dos países desenvolvidos não é mais digno de confiança que chineses, russos, indianos, brasileiros... Podem ser melhorzinhos que a Coreia do Norte do Kim Jong-Il, vá lá... rs Abraços!

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