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Marconi Perillo

Dimensão universal ao imaginário goiano

| 01.05.16 - 15:34
 
Goiânia - No ano passado, José J. Veiga teve sua vida e obra relembradas por duas razões importantes: o centenário de seu nascimento e a transferência do direito de publicação de suas obras para a prestigiosa editora Companhia das Letras, que desde então já relançou os títulos Os Cavalinhos de Platiplanto, A Hora dos Ruminantes e Sombras de Reis Barbudos.
 
Embora tais acontecimentos mereçam aplausos pelo que representam em si e por terem se tornado também pretexto para que a obra do escritor goiano chegue a novos leitores e mereça uma retomada de atenção crítica, as razões para ler seus contos e romances prescindem de efemérides ou estratégias de mercado. Veiga, como todo grande autor, conseguiu sagrar-se atemporal, imune a barreiras das circunstâncias.
 
As narrativas de José J. Veiga são surpreendentes e escapam a tentativas de restringi-las a contextos históricos, a exemplo da sempre mencionada alegoria política da ditadura brasileira, e a movimentos literários. Ele mesmo não se definia como regionalista ou integrante da chamada literatura fantástica, do realismo mágico, ao lado de expoentes como o mexicano Juan Rulfo e o colombiano Gabriel García Márquez. Talvez porque, embora dialogue com tais influências, não se renda por completo a elas, alcançando uma linguagem original, universal, que emerge do particular, de suas raízes no interior goiano, com sua riqueza telúrica e imaginário peculiar.
 
José Jacinto Veiga (o Jacinto, conforme explicava foi abreviado em J. a conselho do amigo Guimarães Rosa) nasceu em uma propriedade rural entre Corumbá de Goiás e Pirenópolis. Ainda jovem, em 1935, mudou-se para o Rio de Janeiro, de onde se projetou internacionalmente, vindo a ser reconhecido como o escritor nascido em Goiás mais cosmopolita do século 20. 
 
Estudou na Faculdade Nacional de Direito, trabalhou nos jornais O Globo e Tribuna da Imprensa, dirigiu a Editora da Fundação Getúlio Vargas, foi revisor da revista Seleções de Reader´s Digest  e comentarista na BBC de Londres. Pelo conjunto da sua obra, traduzida em 18 países, ganhou em 1997 da Academia Brasileira de Letras o Prêmio Machado de Assis.
 
No livro de estreia, Os Cavalinhos de Platiplanto, de 1959, quando já estava com 44 anos, nota-se como reminiscências da infância em Goiás alimentam a atmosfera mágica e onírica dos 12contos. As palavras remontam ao jeito típico de falar na região em décadas passadas, assim como costumes descritos soam familiares a nós, goianos, pois muitos resistem às aceleradas transformações dos últimos anos.
 
“De maio a agosto, os meses sem R, ninguém podia tomar banho no rio, dava febre”, descreve o menino narrador do conto A Ilha dos Gatos Pingados, que mais adiante reclama do sonho desfeito de sua ilha-refúgio: “Estava tudo espandongado”.
É impressionante o domínio que o autor tem do ponto de vista infantil em histórias que não cabem apenas na classificação infanto-juvenil.  Segundo observou certa vez o amigo pessoal e crítico José Fernandes, em palestra na Academia Goiana de Letras, o recurso a dois narradores amplia a perspectiva: o olhar da criança delineia o conteúdo fantástico da realidade e o de um adulto, a face absurda do mundo.
 
José J. Veiga é esse universo de talentos, aptidões, surpresas e descobertas que, por mais que as reconheçamos e renovamos, jamais faremos jus à sua importância para nossa cultura. De toda forma, sempre teremos motivos de sobra para mergulhar nesse mundo mágico que ele nos legou, para sempre memorável.
 

*Marconi Perillo é governador de Goiás
 

Comentários

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  • 01.05.2016 19:26 Luiz de Aquino Alves Neto

    Devo esclarecer - já escrevi e falei, em palestras, incontáveis vezes sobre isso - que o J. é uma partícula acrescentada ao nome JOSÉ VEIGA (este é o nome real e oficial do escritor) por sugestão de Guimarães Rosa, sim, mas o sobrenome da mãe nunca esteve no nome de José. Destaco mais ainda que José J. Veiga tinha na pessoa do mestre e doutor em Literatura José Fernandes o crítico de sua preferência, atribuindo-lhe o mérito de ter melhor compreendido sua obra. José J. Veiga não gostava que grafassem J. J. Veiga e da mesma forma rejeitava a palavra Jacinto como parte de seu nome, pois nunca o teve em seus registros, em seus documentos. Antes de morrer, José recomendou à esposa, a Sra. Clérida, também falecida, que me confiasse seu acervo literário para ser trazido para Goiás, pois não gostaria de ser esquecido. Por oito anos perambulei por repartições e universidade, além das comunidades de Corumbá e Pirenópolis para instalar condignamente esse acerto. Colecionei "portas na cara" ao longo desse tempo, até oferecer os livros e objetos pessoais, além de parte de seu mobiliário, ao SESC, recebendo excelente acolhida pelos dirigentes da instituição em Goiás - José Evaristo e Giuglio Cysneiros. Nesse empenho, contei com as colaborações de Dênia Diniz (de BH) e da poetisa Sônia Maria Santos, que intermediou meu contato inicial com a cúpula do SESC. Agradeço o espaço oferecido ao nosso escritor mais conhecido fora dos limites goianos e ao governador Marconi Perillo pelo texto acima. Aproveito a ocasião para recomendar a leitura de minha crônica publicada no DM de domingo passado, 24/4 (e também no meu blog), na qual lamento a retirada das placas da Rodovia GO-225 (Corumbá-Pirenópolis), que leva o nome do Escritor José J. Veiga. Há seis anos insisto com a AGETOP para repor as placas removidas, mas o sr. Jayme Rincon mostra-se insensível.

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